Baderna e confissão


Em sessão tumultuada, respostas vagas de tesoureiro do PT na CPI da Petrobras praticamente equivalem a uma admissão de culpa...
Mesmo antes da sessão, seu depoimento já abria o flanco a suspeitas. O advogado do petista obtivera, no Supremo Tribunal Federal, uma curiosa autorização: seu cliente não seria obrigado a dizer a verdade para os inquiridores.
Desobrigado de dizer qualquer coisa, fosse verdadeira ou mentirosa, Vaccari especializou-se em dar respostas ocas e sem sentido ao que lhe foi questionado.
Insistiu na tecla de que o PT não fez mais do que qualquer outro grande partido no trato de suas finanças de campanha: recebeu apenas contribuições legais das principais empreiteiras do país.

Essa é uma daquelas lições que estudantes de direito aprendem (ou deveriam aprender) na primeira semana de faculdade: no Brasil, ninguém é obrigado a constituir prova contra si mesmo.

Mas uma testemunha, indagada, é obrigada a dizer o que sabe.

Logo, se você é suspeito mas é convocado como testemunha,  você deve pedir à Justiça que embora tenha sido convocado como testemunha, deve ter seu direito constitucional de não se auto-incriminar garantido. Caso contrário, seria muito simples passar por cima de seu direito. Bastaria a polícia, MP , Justiça ou, como aconteceu no caso acima, a CPI, convocar o suspeito como se fosse testemunha e obrigá-lo a constituir prova contra si mesmo.

A forma mais comum de você pedir  à Justiça que proteja seu direito de não ser obrigado a constituir prova contra si mesmo é através do habeas corpus preventivo. Ele é muito simples. Você diz ao magistrado ‘olha, é muito provável que eu vá ser preso já que vou me recursar a responder às perguntas ou me comprometer a dizer a verdade porque, embora eles tenham me convocado como testemunha, vão me tratar como suspeito e o relatório da CPI pode ser usado em um processo contra mim. Preciso que a Justiça impeça tal prisão’.


Logo, não há nada de estranho ou incomum aqui.

O incomum é que, recebido habeas corpus preventivo desobrigando-o de dizer qualquer coisa durante o depoimento, o suspeito acabe respondendo as perguntas.

O habeas corpus preventivo serve para que a pessoa não precise responder. O habeas corpus não serve para tornas inócuas as respostas dadas durante o depoimento. Se o suspeito resolve responder, suas respostas podem ser usadas contra ele. Logo, se ele mente, diz alguma bobagem, entra em contradição, diz que não se lembra, que sabe ou que não sabe de algo, ou qualquer outra coisa que possa depois ser usada contra ele, ele está se expondo. O direito é de ficar calado e não de ter suas respostas tornadas inócuas.

É de uma simplicidade óbvia: se você se deu ao trabalho de conseguir na Justiça o direito de ficar calado, fique calado.

É um dos poucos casos em que filmes americanos podem de fato ajudar a entender nossa relação com a lei: tudo o que você disser poderá e será usado contra você durante o processo.

PS: Se você nunca entendeu por que eles dizem ‘poderá e será usado’, a razão é simples. Se a polícia diz apenas ‘poderá’, o suspeito pode mais tarde alegar que não estava claro o grau de probabilidade. E se diz apenas ‘será’ está afirmando que o que suspeito disser será certamente usado contra ele, ainda que possa não ser usado e, mesmo que se for usado, pode não ser contra, mas a favor.

Editorial da Folha de hoje (11/04/2015)

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