Dingfelder: Steve Wozniak é um exemplo interessante, porque a cegueira facial dele é adquirida. Ele sofreu um acidente de avião e teve um traumatismo no cérebro. E essa experiência fez com que ele se interessasse por cérebros. Ele voltou para a faculdade e concluiu seu curso. Então ele é uma pessoa que conseguia reconhecer rostos, e que de repente perdeu essa habilidade.

Isso não o afetou tanto porque ele já era famoso quando tudo isso aconteceu, e ele já conhecia tanta gente, que as pessoas não esperavam que ele fosse lembrar de todos os rostos.

Steve Wozniak

Crédito,Getty Images

Legenda da foto,Steve Wozniak passou a ter cegueira facial depois de um acidente

Uma mulher que conheci me contou uma história engraçada sobre cegueira facial que aconteceu há muitos anos. Ela disse que estava em Los Angeles e que começou a conversar com um jovem atraente. Ela perguntou qual era a sua profissão e ele disse que era ator. Depois disso, uma amiga dela disse: “eu não acredito que você estava falando com o Brad Pitt!”

Isso deve ter sido uma experiência e tanto para Brad Pitt. Conversar com alguém que não o reconhece.

BBC: Você foi descobrindo todas as condições praticamente ao mesmo tempo?

Dingfelder: Sim. E sinceramente acho que há mais coisas no meu cérebro. Uma vez que o seu cérebro sai do caminho neurotípico, você começa a ter diversos problemas interessantes e também pontos fortes.

O que diferencia uma pessoa neurodivergente de uma neurotípica é que nós temos um perfil que oscila muito — somos extremamente bons com algumas coisas e extremamente ruins em outras.

As pessoas não entendem isso. Como você pode ser tão boa em escreve e ao mesmo tempo não saber se localizar dentro de uma loja, por exemplo?

Definitivamente é algo que pesa muito. Houve dias em que chorei muito, mas em geral eu abordei tudo com uma curiosidade intensa, porque eu realmente queria entender o que estava acontecendo no meu cérebro, e o que acontece nos cérebros de pessoas neurotípicas.

BBC: E agora que você descobriu tudo isso, o que você pretende fazer?

Dingfelder: Aprendi que os cientistas estão finalmente começando a estudar as experiências subjetivas interiores pela primeira vez em 100 anos.

Passei minha vida toda presumindo que a minha experiência é basicamente a mesma das demais pessoas, e quase aos 40 anos eu descobri que não. A maioria das pessoas vive uma vida muito diferente da minha. Suas vidas interiores e suas percepções são muito diferentes.

Mesmo entre pessoas neurotípicas, há várias diferenças. Algumas pessoas não têm um monólogo interno, outras são cheias de camadas de monólogos internos. E acho que a experiência humana é muito escondida. Existe uma diversidade escondida da experiência humana.

Descobrir isso me ajudou a apreciar e ser menos impaciente com as outras pessoas.

Para mim, algumas coisas são tão fáceis que eu não entendo como outras pessoas não conseguem fazer. E eu sou horrível em tantas outras. Como pegar uma bola, por exemplo. Eu às vezes acabo menosprezando essas coisas que eu não consigo fazer. Digo a mim mesma: "pegar bolas é uma bobagem".