sábado, 4 de abril de 2020

"A rua não é lugar para morar, muito menos para morrer'


Francisco reza pelos moradores de rua e lamenta caso acontecido em Las Vegas onde pessoas foram, temporariamente, transferidas um abrigo para um estacionamento descoberto

O fechamento do Catholic Charities of Southern Nevada deixou 500 pessoas sem lugar para dormir 
O fechamento do Catholic Charities of Southern Nevada deixou 500 pessoas sem lugar para dormir (Steve Marcus/Reuters)
Bianca Fraccalvieri

O papa Francisco rezou nesta quinta (02) mais uma vez pelos moradores de rua neste tempo de pandemia, citando uma foto vista num jornal. A imagem à qual o papa se referiu na missa desta quinta-feira é de Las Vegas, nos Estados Unidos. Um abrigo para moradores de rua foi temporariamente transferido para um estacionamento descoberto após ser fechado por conta de um caso positivo do Covid-19.
"Num jornal, hoje, há uma foto que toca o coração: muitos sem-teto de uma cidade deitados num estacionamento, sob observação... Peçamos a Santa Teresa de Calcutá que desperte em nós o sentido da proximidade."

Palavras do Papa Francisco ao introduzir, na manhã de quinta-feira (02/04), a missa na capela da Casa Santa Marta. Francisco dirigiu seu pensamento àqueles que estão pagando as consequências da pandemia do coronavírus, em particular aqueles que não têm uma casa.  
As imagens às quais o Papa se referiu são de Las Vegas, nos Estados Unidos. Um abrigo para moradores de rua foi temporariamente transferido para um estacionamento descoberto após ser fechado por conta de um caso positivo do Covid-19.
O fechamento do Catholic Charities of Southern Nevada deixou 500 pessoas sem lugar para dormir, forçando as autoridades da cidade a liberar o estacionamento de um centro de convenções.
As imagens mostram os desabrigados deitados no asfalto demarcado com tinta branca em áreas que supostamente atendem às regras do distanciamento social para impedir a propagação do novo coronavírus.
Eles permanecerão ali até 3 de abril, quando a Catholic Charities deve reabrir.
"A rua não é um lugar para morar, muito menos para morrer"
As fotos de Las Vegas evidenciam o dilema que inúmeras cidades estão enfrentando para atender os sem-teto. O mesmo acontece na cidade de São Paulo, onde, segundo o último censo, existem mais de 25 mil pessoas vivendo nas ruas, das quais mais de 12 mil estão sem abrigo.
O padre verbita Arlindo Pereira Dias afirma são necessárias políticas públicas emergenciais urgentes para atender essas pessoas, que serão, segundo ele, as mais afetadas pela pandemia. O sacerdote afirma que comunidades, grupos e movimentos já se mobilizaram, com inúmeras ações de solidariedade, entre eles o Vicariato da Pastoral para o Povo da Rua, o Arsenal da Esperança e os franciscanos no Largo São Francisco.  "Trata-se de viver a Campanha da Fraternidade em tempo de coronavírus", afirma o pe. Arlindo, SVD.


Reflexão do Papa
Na homilia, Francisco comentou as leituras do dia, extraídas do Livro do Gênesis (Gn 17,3-9) e Evangelho de João (Jo 8,51-59), que têm em seu centro a figura de Abraão, a aliança com Deus e o novo anúncio de Jesus que vem “refazer” a criação perdoando nossos pecados. Nós somos cristãos – disse – porque fomos eleitos, escolhidos, e recebemos uma promessa de fecundidade, à qual devemos responder com a fidelidade à aliança. Nossos pecados são contra essas três dimensões: não acolher a eleição adorando os ídolos, não esperar na promessa e esquecer a aliança. O caminho do cristão – concluiu – é ser consciente da eleição, da alegria de caminhar rumo a uma promessa e da fidelidade no cumprimento da aliança. A seguir, o texto da homilia:

"O Senhor sempre se recordou da sua aliança. Nós o repetimos no Salmo Responsorial. O Senhor não se esquece, jamais esquece. Sim, esquece somente num caso, quando perdoa os pecados. Após ter perdoado perde a memória, não recorda os pecados. Nos outros casos, Deus não esquece. A sua fidelidade é memória. A sua fidelidade com o seu povo. A sua fidelidade com Abraão é memória das promessas que tinha feito. Deus elegeu Abraão para fazer um caminho. Abraão é um eleito, era um eleito. Deus o elegeu. Depois, naquela eleição prometeu-lhe uma herança e hoje, na passagem do livro do Gênesis, há uma passagem a mais. Quanto a ti, a minha aliança é contigo. A aliança. Uma aliança que lhe faz enxergar longe a sua fecundidade: tu serás pai de uma multidão de nações. A eleição, a promessa e a aliança são as três dimensões da vida de fé, e as três dimensões da vida cristã. Cada um de nós é um eleito, ninguém escolhe ser cristão em meio a todas a todas as possibilidades que o “mercado” religioso lhe oferece, é um eleito. Nós somos cristãos porque fomos eleitos. Nesta eleição há uma promessa, há uma promessa de esperança, o sinal é a fecundidade: “Abraão, serás pai de uma multidão de nações e... serás fecundo na fé. A tua fé florescerá em obras, em boas obras, inclusive em obras de fecundidade, uma fé fecunda. Mas deves – o terceiro passo – observar a aliança comigo. E a aliança é fidelidade, ser fiel. Fomos eleitos, o Senhor nos fez uma promessa, agora nos pede uma aliança. Uma aliança de fidelidade. Jesus diz que Abraão exultou de alegria pensando, vendo o Seu dia, o dia da grande fecundidade, aquele seu filho – Jesus era filho de Abraão – que veio refazer a criação, que é mais difícil que fazê-la, diz a liturgia – veio fazer a redenção dos nossos pecados, veio libertar-nos. O cristão é cristão não porque pode mostrar a fé do batismo: a fé de batismo é um papel. Você é cristão se diz sim à eleição que Deus lhe fez, se vai atrás das promessas que o Senhor lhe fez e se você vive uma aliança com o Senhor: essa é a vida cristã. Os pecados são sempre contra estas três dimensões: não aceitar a eleição e nós “elegere” (eleger) tantos ídolos, tantas coisas que não são de Deus. Não aceitar a esperança na promessa, ir, olhar as promessas de longe, inclusive muitas vezes, como diz a Leitura aos Hebreus, saudando-as de longe e fazer que as promessas sejam hoje com os pequenos ídolos que fazemos, e esquecer a aliança, viver sem aliança, como se fôssemos sem aliança. A fecundidade é a alegria, aquela alegria de Abraão que vê o dia de Jesus e se enche de alegria. Essa é a  revelação que hoje a Palavra de Deus nos dá sobre nossa existência cristã. Que seja como aquela do nosso pai: consciente de ser eleito, alegre por caminhar rumo a uma promessa e fiel no cumprimento da aliança".
O Santo Padre terminou a celebração com a adoração e a bênção eucarística, convidando a fazer a Comunhão espiritual. A seguir, a oração recitada pelo Papa:
Meu Jesus, eu creio que estais presente no Santíssimo Sacramento do Altar. Amo-vos sobre todas as coisas, e minha alma suspira por Vós. Mas, como não posso receber-Vos agora no Santíssimo Sacramento, vinde, ao menos espiritualmente, a meu coração. Abraço-me convosco como se já estivésseis comigo: uno-me Convosco inteiramente. Ah! não permitais que torne a separar-me de Vós!

Antes de deixar a Capela dedicada ao Espírito Santo foi entoada uma antiga antífona mariana Ave Regina Caelorum (“Ave Rainha dos Céus”):

Ave, Rainha do céu; ave, dos anjos Senhora; ave, raiz, ave, porta; da luz do mundo és aurora. Exulta, ó Virgem gloriosa, as outras seguem-te após; nós te saudamos: adeus! E pede a Cristo por nós!

https://domtotal.com/noticia/1434296/2020/04/a-rua-nao-e-lugar-para-morar-muito-menos-para-morrer/?


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