Sem solução nos Procons, consumidores recorrem à Justiça para garantir direitos |
Brasília - Sem conseguir resolver problemas com fabricantes,
lojas e prestadores de serviços por meio de órgãos de defesa do consumidor,
muitos brasileiros acabam recorrendo à Justiça para garantir seus direitos. No
ano passado, 567.487 processos foram recebidos pelos juizados especiais cíveis,
conhecidos como tribunais de pequenas causas, dos estados do Rio de Janeiro,
Ceará e Amapá. O dado faz parte de um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) feito sobre os três
estados, que mostra que a maior parte das ações foi relacionada a direitos do
consumidor.
O grande número de processos é um indicativo de que muitos
consumidores não têm conseguido garantir seus direitos por meio dos órgãos que
deveriam protegê-los. Apesar de alto, o número não reflete a real demanda dos
consumidores lesados, já que a maioria opta por não levar a questão à Justiça,
segundo o advogado Marconi Miranda. 'Acredito que apenas 20% dos consumidores
lesados procuram os juizados especiais. Os 80% restantes ficam receosos e,
muitas vezes por falta de tempo, indisponibilidade de horários ou
impossibilidade de se ausentarem do trabalham, acabam arcando com o prejuízo em
vez de fazerem valer seus direitos', explica.
Ele conta que, em muitos casos, mesmo com a decisão favorável
ao consumidor, a indenização não cobre os danos envolvidos em todas as etapas
percorridas. 'Como ocorreu uma banalização do dano moral no nosso ordenamento
jurídico, os valores das condenações são ínfimos perante a capacidade financeira
das grandes empresas', destaca.
Em geral, quando decide entrar na Justiça, o consumidor já
passou por alguma instância do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, formado
pelos Procons, Ministério Público, Defensoria Pública e entidades civis de
defesa. Já os serviços públicos são tratados pelas agências reguladoras, como a
Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e a Agência Nacional de Energia
Elétrica (Aneel).
É o caso do relações públicas Guilherme Watrin que recorreu ao
Procon do Distrito Federal para tentar resolver um problema com uma máquina de
lavar que ainda estava na garantia. Depois de tentar negociar com a fábrica, ele
recorreu ao órgão, mas também não obteve sucesso. 'Depois de muito nervosismo,
muita irritação, me senti lesado pela falta de controle do Procon de poder
autuar a empresa de forma mais severa', declara.
Guilherme questionou se poderia reclamar do próprio órgão.
Segundo ele, o gerente do Procon disse que era preciso recorrer à ouvidoria do
Governo do Distrito Federal. Na ouvidoria, foi informado de que era no Procon
que ele tinha de registrar a queixa. O problema com a máquina acabou virando
questão judicial. 'Tive que ir para a Justiça, contra a minha vontade, para
resolver o problema', resume.
Fúlvio Giannella Junior, coordenador executivo do Instituto
Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), questiona a eficiência do sistema que
reúne os Procons. 'Essa rede é bastante frágil diante da magnitude dos problemas
de consumo que se apresentam', avalia.
Para assegurar o cumprimento dos direitos do consumidor, o
chefe de gabinete do Procon de São Paulo, Carlos Coscarelli, defende maior
integração entre os órgãos de proteção. 'É uma área em que o consumidor ainda
está muito vulnerável. Quando não consegue uma solução nas agências ou no
Procon, enfrenta uma longa batalha no Judiciário. Ás vezes, mesmo favoráveis, as
decisões são tardias para aquilo que era necessário reparar', diz. 'Há
necessidade de um equilíbrio, de um fortalecimento dos defensores do consumidor
com os reguladores do mercado.'
Além das instâncias oficiais, hoje o consumidor ainda tem à
disposição uma ferramenta poderosa na luta por direitos, o Serviço de
Atendimento ao Consumidor feito nas redes sociais, o chamado SAC 2.0. 'Isso
amplifica o poder do consumidor, que agora tem um ‘megafone’
para poder contar a todo mundo a insatisfação dele. Passa a ser um quinto
poder', avalia o presidente da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico,
Mauricio Salvador. De acordo com ele, a exposição do problema nas redes sociais
é uma decisão que o consumidor toma, normalmente, depois de ter ficado
insatisfeito com outras instância
O fato de fazer a reclamação em um canal público faz com que a
empresa responda mais rapidamente. Segundo Maurício Salvador, uma resposta que
demoraria três dias pelo telefone ou e-mail da empresa, chega em uma média de 4
horas pelas redes sociais.
Edição: Lílian Beraldo
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