VIAGEM DE TREM (DE RECIFE A NATAL) BIOGRAFIA




Esse era o destino daquela enorme locomotiva.
Às vezes, eu contava, lembro aproximadamente 30 vagões.
Naquele tempo (1968 a 1970, época das minhas viagens) 
não havia outro meio de transporte.
Viajar de minha cidade (antes uma vila) para Natal/RN
Era mais queuma grande aventura, não só pela longa  distância.
Eram 18 paradas até chegar na Estação Padre João Maria, na 
capital potiguar,
Mas sobretudo era uma aventura pela qual eu ficava ansiosa 
quando chegava o dia, porque
eu acabara de fazer 11 anos e, por incrível que pareça, viajava sem acompanhante da família,
Apenas com a população-passageiros do trem, iguais a mim.
Acomodada naqueles bancos espaçosos (com encosto) de madeira, era uma viagem bastante tranquila.
Eu adorava ir olhando pela janela, os campos verdes, os animais, as pessoas trabalhando.
As cidades com sua movimentação barulhenta quando o trem 
parava na estação.
E quantas coisas se vendiam nas portas e janelas daquele enorme 
gigante de ferro.
Havia vendedores que também entravam nos vagões, com suas 
caixas de produtos.
 Vendiam de tudo: água, biscoitos, refrigerantes (coca, guaraná, pepsi)
Cocadas, doce e beiju de coco,tapiocas, bolo pé de moleque, frutas, etc.
Havia uma grande movimentação daqueles pequenos comerciantes de todas as idades
Que aproveitavam a passagem do trem (que ali tinha parada obrigatória)
 Para ganhar alguns trocados. Eram tempos muito mais difíceis, não havia aposentadoria para os idosos.
Não havia trabalho. Era a época em que o famoso “êxodo rural” 
estava no auge.
O trem era um meio de transporte muito seguro.
Raramente lembro de ter  ouvido  falar de acidentes.
Havia muito respeito. Era como se cada vagão, alguns até lotados de pessoas em pé,
Fosse uma casa de família com muitos ocupantes.
Eu me sentia segura. Não tinha medo de nada.
Felizmente não havia as mazelas que há  na atual sociedade.
Havia também, soldados (PM) que faziam a segurança dentro dos vagões.
E o trem partia liberando seu apito estridente, de minha terra, 
às 11:00h da manhã,
E chegava por volta das 18:00h ao destino final.
Minha mãe me aguardava com expectativa, porque, afinal se preocupava
Em saber que eu precisava viajar sozinha.
Essas imagens são recortes importantes do meu passado.
De um passado que, embora eu não desejasse tê-lo de volta,  não foi ruim.
Teve sua importância em meu crescimento, e momentos felizes.
Penso que foi por aí que eu comecei a adquirir maturidade.
E sem perceber, sem me dar conta, de repente, me vi menina adolescente
 ou nem me vi.
Às vezes penso que só fui criança e adolescente até meus 11 anos quando perdi meu pai.
Não lembro de ter-me olhado no espelho e não ter-me visto 
sempre adulta.
As pessoas, essas sim, me viram, menina fazendo papel de adulto.
Mas eu não me arrependo. Fui feliz mesmo assim, e isso me levou a ser isso que
Hoje sou:
Simplesmente EU!
Uma pessoa apaixonada pela vida, que ama ao 
próximo, incondicionalmente.
Uma pessoa FELIZ!

Isis Dumont
Publicado no RL.
(Fato real)

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