Enterro e velório de juíza Patrícia Lourival Acioli: mal-estar entre colegas da Justiça e comoção em moradores da cidade

Guilherme Amado

Enterro da juíza Patricia AcioliFoto: Domingos Peixoto

Nesta sexta-feira, quem prestasse atenção apenas ao desfile de desembargadores, juízes, promotores e advogados de diversas áreas, presentes ao velório e ao enterro da juíza Patrícia Lourival Acioli, poderia achar que se tratava de um julgamento. Um observador mais atento, porém, poderia perceber que, entre as 450 pessoas presentes ao Cemitério de Maruí, no Barreto, em São Gonçalo, estavam, além de amigos e familiares, o povo da cidade, envolvido nas milhares de decisões da juíza ao longo dos 11 anos em que estava à frente da 4ª Vara Criminal.
Pessoas como a doméstica Tereza Cristina Escola de Faria, mãe de um jovem assassinado em 2008 por um tenente da PM em São Gonçalo. A última vez que estiveram juntas foi na quarta-feira. Na véspera, Patrícia havia condenado o policial pelo crime da morte do filho de Tereza:
— Ela sempre abriu as portas para mim. Não tem gente em São Gonçalo que não conheça a doutora Patrícia.
Patrícia Acioli, quando era juíza da 2ª Vara de Menores
Patrícia Acioli, quando era juíza da 2ª Vara de MenoresFoto: Frederico Rozario / Arquivo O Globo
A notícia da morte vai demorar a ser digerida entre as togas da Justiça fluminense. Em uma academia de Niterói, onde juízes costumam malhar, a notícia fez bicicletas ergométricas pararem:
— Fiquei duas horas em frente à TV, boquiaberto — comentou um dos juízes.
Hoje vivendo novo relacionamento, Patrícia havia sido casada duas vezes, primeiro com um advogado e depois com o cabo da PM Marcelo Poubell. Deixou três filhos: criava o filho do primeiro marido, com quem teve mais duas meninas.
Descrita como idealista, ficou conhecida pelas penas contra integrantes de grupos de extermínio, milicianos e policiais envolvidos em crimes. Era impulsiva.
Em audiências, costumava exigir silêncio ou pedir que advogados de defesa e defensores deixassem o tribunal. O jeito duro foi bem resumido pela doméstica Tereza:
— Com ela, não tinha conversa. Era firme e direta.
Juíza condenou 60 policiais
Embora tenha mandado para a prisão 60 policiais — só no período em que foi a juíza criminal de São Gonçalo —, Patrícia era respeitada dentro da própria polícia. A presença do coronel da PM Marcus Jardim no Cemitério de Maruí era prova disso:
— Era minha amiga. Fazia um trabalho importante contra marginais aqui.
Patrícia foi uma juíza com alma de defensora pública, nas palavras do advogado Técio Lins e Silva, chefe da juíza quando ela foi defensora. Ele recordou da vez em que Patrícia estava no Maracanã como torcedora e, ao ver policiais batendo em um rapaz, interveio:
— Ela era revolucionária, uma espécie de Dom Quixote. Fazia tudo com grande paixão. Na Defensoria, atuava com amor em casos envolvendo crianças e adolescentes.
Titular do 1º Tribunal do Júri do Rio, o juiz Fábio Uchôa conheceu Patrícia Acioli em 1988, na mesma época que Técio. Um ano depois, Uchôa e Patrícia ajudaram a criar o Núcleo de Defesa da Cidadania:
— Ela tinha horror de defender grupos de extermínio — conta o juiz.
Em 1992, Patrícia passou para a magistratura. Em 1997, foi transferida para a 38 Vara Civil. A decisão veio depois que ela obrigou o governo estadual a adequar o Instituto Padre Severino aos preceitos do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Fábio Uchôa diz que chegou a alertar Patrícia sobre um blog que a difamava — lá, PMs mostravam insatisfação com suas decisões.
Hoje cunhado de Patrícia, o defensor público José Augusto Garcia, seu contemporâneo na Defensoria, resume em uma frase a amiga:
— Ela abominava covardia.
Globo.com


" Não podemos e não devemos acreditar que o mal está vencendo o bem,         
nem que os bons são minoria. Apesar da crueldade, das atrocidades cometidas contra quem combate a criminalidade e as injustiças, com mais garra e determinação, no mundo sempre haverá quem continue erguendo a bandeira, usando sua voz e dando seu "grito" mais alto em favor do direito, da justiça e da tão sonhada e tão desejada paz social...  Que a Doutora Patrícia descanse em paz, após ter cumprido com tanta bravura a missão que lhe foi confiada e possível cumprir."
        Aparecida Ramos




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