Um trabalho de merda

No discurso da sustentabilidade ecoam extremos: privação e prazer. Extinção, destruição e um monte de nãos de um lado, bem estar, paraísos naturais e soluções milagrosas de outro. Esquecem, porém, que uma coisa não está separada da outra. Onde há vida, há morte. Você consome e gera lixo, você come e produz merda.
Consumir e comer são coisas boas, dão prazer, mas lidar com o lixo e com a merda é um estorvo. Ninguém está a fim de lidar com restos, eles apodrecem, cheiram mal, lembram a morte. Então embala tudo num saco plástico e joga fora, aperta o botão mágico da descarga e manda pra baixo, embebido em água potável. Esconde nos rios, nos mares, em aterros, na periferia das cidades e na periferia do mundo, na Somália, no Haiti, no cafundó.
Esse medo exacerbado do resto virou patologia na sociedade do novo, da homogenização e do controle e pode ser explicado por algum psicanalista, mas o fato é que, para criar uma cultura de qualidade de vida sustentável, a gente vai ter que encarar os temores que vem das entranhas e percorrer um novo caminho entre a privação e o prazer.
Em São Paulo, há dois aterros sanitários monstruosos, o Bandeirantes e o São João, que, segundo esta reportagem,ocupam juntos a área de 270 estádios do Maracanã, pesam o equivalente a 80 milhões de fuscas e chegam à altura de um prédio de 50 andares. Eles atingiram sua capacidade máxima e não funcionam mais. Mas a cidade não para, a cidade só cresce e produz, todos os dias, 17 milhões de toneladas de resíduos, dos quais 10 milhões são de lixo doméstico embalados em sacos plásticos, verdadeiras bombas de metano. De tudo isso, apenas 1% é reciclado e 94% vão direto para o aterro, sem nenhum tipo de triagem.
Onde há problema, há oportunidade. A cidade de São Francisco, na Califórnia, criou a primeira coleta urbana de larga escala do país de restos de comida para compostagem. Atualmente, centenas de milhares de moradores e cerca de cinco mil restaurantes e outros negócios encaminham, diariamente, 600 toneladas de restos de comida, poda de jardim, filtro de papel, caixa de pizza, pauzinho de comida japonesa e outros materiais para uma usina de compostagem. A gororoba vira um adubo rico em nutrientes, devolvido à população e usado para cultivar os alimentos orgânicos e os vinhos de alta qualidade que a cidade é famosa em oferecer.
O esforço para chegar nesse estágio maduro e atingir a meta de reduzir as emissões de gases do efeito estufa é de todos. A população se compromete a separar o lixo em conteineres distintos e fica sujeita à multa se sair da linha, a prefeitura se encarrega da coleta e entrega e uma cooperativa assume a compostagem, que pode ser feita em empresas, escolas, condomínios, restaurantes, eventos, hoteis e nos municípios de qualquer canto do planeta. Invariavelmente, essa alquimia reduz em cerca de 50% o lixo doméstico, alivia a demanda por aterros sanitários já sobrecarregados, evita a formação de chorume tóxico e gás metano, produz fertilizantes naturais e gratuitos usados no jardim e na horta.
Sustentabilidade pode trazer felicidade, sim, quando a gente faz os trabalhos que gosta e encara as tarefas que não gosta (e que chamamos de trabalhos de merda). No cerrado central, uma comunidade fundamentada na permaculturareverteu a fragilidade do solo com muita bosta. Num bairro carente de Florianópolis, a comunidade deu cabo no lixo, nos ratos e nas doenças com a revolução dos baldinhos. Em um ano, 60 famílias reciclaram 30 toneladas de restos de comida, que usam para adubar suas pequenas e poderosas hortas urbanas. Visitei o novo aterro do projeto na semana passada e qual foi minha surpresa: um monte de bosta doada pela polícia montada agora também faz parte da arte de transformar resto em ouro.
(De Tatiana Achcar-Colunista do Yahoo)
MEU COMENTÁRIO:


Gente, achei interessante este artigo, além de inteligente e oportuno; trata-se da realidade com a qual toda sociedade brasileira está, há séculos, convivendo. Por isto, há muito tempo, faz-se necessário CONSCIENTIZAÇÃO e ATITUDE!!!  É exatamente o que está faltando na grande maioria da população... TODOS produzem lixo e merda em larga escala, mas ninguém quer cuidar de maneira adequada!!!...  Cada um "se livra" como pode de seus dejetos sem a menor preocupação com a VIDA no PLANETA, nem ao menos pensam na qualidade de MUNDO que querem deixar para seus filhos, netos e bisnetos... E o pior é que existe tanta gente metida a besta, até parece que esses tipinhos não iguais a todo mundo, e produzem desde o suor fétido a todo tipo de imundície de que trata a matéria supracitada... É importantíssimo saber de uma coisa: Toda mudança começa por mim, na minha casa, com minha família, a partir da separação do lixo seco e do lixo molhado. Essa simples atitude vai facilitar o trabalho das pessoas que trabalham na coleta seletiva. Não devemos esperar que as coisas mudem para melhor, de cima para baixo, nem tampouco, a partir dos governantes, principalmente quando a maioria (é o que parece) deixa transparecer sua grande falta de compromisso com as causas mais relevantes da população, ou no mínimo são pouco comprometidos...                                 CUIDAR BEM DO MEIO AMBIENTE É RESPONSABILIDADE DE TODAS AS PESSOAS, DE TODOS OS BRASILEIROS E BRASILEIRAS!!!"


                                                          Aparecida Ramos

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