'Foi assustador': carta de 83 anos detalha estragos da grande enchente de 1941 no Rio Grande do Sul
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Author,Simone Machado
Role,De São José do Rio Preto (SP) para a BBC News Brasil
"A cidade esteve vários dias às escuras, sem água, sem leite, sem jornal, foi mesmo de assustar! A coitada da Belmira perdeu tudo, tudo... Os móveis abriram-se todos, estragaram-se completamente".
Apesar de o cenário descrito parecer recente, esse é o trecho de uma carta escrita em 1941 por uma pessoa que estava em Porto Alegre (veja o que ocasionou a cheia daquela época e por que ela não é argumento para negar mudanças climáticas).
Na ocasião, Helena Silva Stein, com 16 anos, escreveu o relato em um retalho de pano para enviar à irmã mais velha, Flávia, que morava no Rio de Janeiro.
Helena morreu em janeiro deste ano, aos 98 anos, pouco antes de a tragédia se repetir.
A carta escrita há 83 anos faz parte do acervo de memórias da família que a filha de Helena, a arquiteta Elenara Stein Leitão, 67, guarda há anos.
Helena vivenciou por acaso a enchente que atingiu o Rio Grande do Sul. Após perder os pais aos 10 anos, ela foi morar no Rio de Janeiro com uma tia e foi à capital gaúcha para visitar familiares. O plano era ficar apenas algumas semanas.
A casa da família, na avenida Independência, não foi invadida pela água e serviu de abrigo para diversas pessoas que perderam tudo com as cheias. Situações que foram descritas por ela.
"Tia Maria saiu de casa. Nós quase que saímos, pois faltou uns quatro metros para chegar aqui em casa! Zilá e Carlos passaram várias semanas aqui, flagelados. A água lá foi um bom pedaço acima do assoalho. Este estragou-se completamente, ficando todo embaulado", descreveu a jovem.
Na enchente de maio de 1941, o rio Guaíba registrou 4,76 metros de elevação no nível da água — e era, até recentemente, a maior referência de tragédia ligada a um desastre natural em Porto Alegre. Segundo os relatos da época, foram 22 dias de chuvas naquele mês.
“Os trens pararam e o telégrafo interrompeu. Estávamos simplesmente isolados do interior. Cinemas, colégios, faculdade de medicina e direito ficaram cheios de flagelados e o governo sustentando todo o pessoal. Flagelados 17 mil! O professorado todo dando comida e cuidando deles. No Pão dos Pobres foi até ao segundo andar, quase cobriu a Igreja de Santo Antônio. Os meninos saíram e o prejuízo foi calculado em 5 mil contos!”, diz outro trecho da carta.
No texto, Helena também relata que diversos bairros ficaram alagados e a plantação de arroz foi perdida.
A situação a marcou tanto que os dias de medo vividos há 83 anos eram frequentemente recordados por ela.
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