Cícero Péricles Carvalho, professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e doutor em Economia Regional, elenca os três maiores problemas de toda a situação envolvendo a mina da Braskem.

"O primeiro impacto forte, real e geral são as 15 mil famílias em 60 mil pessoas, até agora, deslocadas”, diz Carvalho.

Ele destaca que o preço do metro quadrado em Maceió é o mais alto do Norte e Nordeste do país.

“A inflação dos imóveis foi boa para a construção civil, foi. Agora, para a cidade, para a população, foi uma tragédia", afirma Carvalho.

O segundo impacto, diz o professor, é sentido pela indústria do turismo.

“Isso está acontecendo no começo da estação de verão, da alta temporada de verão. Era o tempo de recuperação para hotéis, pousadas, restaurantes”, diz.

Carvalho compara o atual momento com o período de isolamento por causa da pandemia de covid-19.

“Quando esses negócios fecharam em março (de 2020), foi diferente, porque eles já tinham lucrado (com a alta temporada). Dessa vez, podem não ter essa chance”, diz Carvalho.

“As pessoas não entendem que bairros estão afundando, mas que Maceió está afundando, e isso gera um medo colossal."

O terceiro cenário preocupante, diz o especialista, é com a atividade de pesca, que garante a subsistência de várias famílias da região afetada e gera impactos para as lagoas Mundaú Manguaba.

“Essas pessoas não podem pescar e, no caso de colapso, terão efeitos maiores."

Carvalho acrescenta ainda que a crise atual pode levar a uma desvalorização imobiliária e afastar investimentos na cidade como um todo.

"Os donos de fundos imobiliários vão se preocupar em como ficará a cidade com esses problemas."

Rachadura na parede

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Rachaduras e outros danos se tornaram muito comuns nos imóveis da região

A engenheira geóloga Regla Toujaguez La Rosa Massahud, professora da Ufal, afirma que o risco de colapso de minas da Braskem já era apontado previamente por estudos do Serviço Geológico Brasileiro.

“É considerado algo provável que uma, duas ou outras minas venham a colapsar, porque a sua estrutura está sendo afetada”, explica Massahud.

“É isso que está acontecendo na mina 18. Pode acontecer em outras? Pode."

Mas ela esclarece que o processo de preenchimento das minas feito pela Braskem pode ajudar a mitigar esse problema.

"O esperado é que esses eventos se reduzam, diminuam, porque à medida que as minas vão sendo preenchidas, está se colocando estabilidade no sistema, no maciço rochoso”, diz Massahud.

Sobre estas medidas, a Braskem diz que, em cinco das nove minas em que foi recomendado o preenchimento com areia, o trabalho já foi concluído.

Em três, o processo ainda está em andamento. “Uma está pressurizada, sinalizando que não é mais necessário o preenchimento com areia”, disse a empresa em nota enviada à BBC News Brasil.

Em outras cinco minas cavidades, ocorreu um autopreenchimento quando as estruturas cederam.

“As 21 restantes estão sendo fechadas ou monitoradas, com 7 delas já concluídas”, disse a companhia.

Em relação à mina 18, que disparou o alerta de risco de colapso, a Braskem informou que “as atividades para preencher a cavidade estavam em andamento e foram suspensas preventivamente devido à movimentação atípica no solo”.

Jean Melo, geólogo do Instituto do Meio Ambiente do Estado de Alagoas (IMA), afirma, no entanto, que a atividade de preenchimento da mina 18 ainda não havia iniciado, embora ela estivesse apta para que isso acontecesse.

"Esse processo seria iniciado agora no mês de novembro. Não chegou a dar tempo.”

Adriana

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Adriana conta que situação da mina tornou área onde vive um 'bairro fantasma'


'Se colapsar de noite, não terei forças para correr'

Moradora da Vila Saem, Maria Luci Trindade da Silva, de 74 anos, A incerteza sobre o que está acontecendo a angustia.

"A gente não recebe nenhuma informação oficial. É tudo pela televisão, por um morador que anda mais com os movimentos de realocação, ou seja, no boca a boca”, diz Maria Luci.

“Meu medo é que ela colapse durante a noite, porque aí nem vou ter forças para correr, já que estou dormindo.”

Maria Luci vive há 46 anos na mesma casa. Ela diz que nunca sentiu tremores causados pelos problemas com a mina, mas que os vizinhos dizem ter sentido.

Ela conta que a Defesa Civil já entrou na sua casa algumas vezes e fotografou as rachaduras, mas em uma oportunidade sequer teve seu nome perguntado.

Adriana José, de 39 anos, também mora neste local e diz que vive uma rotina de medo que exigiu da família se readaptar à nova realidade.

“Tenho três filhos. Ninguém está bem. Durmo com medo. Não tenho para onde ir”, diz.

Ela fala que sofre com um isolamento social e diz que isso pode até aumentar devido aos problemas advindos do eventual colapso da mina.

"Meu filho estudava em Bebedouro (bairro próximo), não estuda mais. Não deixamos as crianças brincando ou nas ruas à noite. A gente está vendo que vai ficar isolado dentro de casa, com mais medo”, diz Adriana.

Ela diz que a região onde mora virou um “bairro fantasma”.

“Mal tem comércio. Não tem segurança. Se vai tirar uma rua daqui, que tire as outras. Se vai acontecer, o que a gente vai ficar fazendo aqui? Quero que me tirem e me deem o dinheiro para comprar outro lugar ou pelo menos o aluguel. Queremos sair.”