A morte de Masha Amini, nas mãos da Polícia Moral, provocou uma onda de protestos sem precedentes no Irã.
"Eu tinha regras para evitar qualquer conflito e qualquer coisa política no Irã. Eu disse a mim mesmo: não chegue perto de locais militares ou prédios do governo, não tire fotos ou vídeos deles. E então acrescentei que não deveria chegar perto de qualquer manifestação", disse ele à BBC.
Mas ele não evitou o olhar das forças de segurança iranianas. No início de outubro, agentes de inteligência detiveram Kjems no albergue em que ele estava, em Teerã.
Eles o levaram para a famosa prisão de Evin, conhecida por abrigar muitos manifestantes e prisioneiros políticos.
"Eles não me disseram por que me prenderam. Eles me perguntaram: 'Por que estamos levando você (para a prisão)?' Fiquei confuso e disse: 'Fiz alguns vídeos, não sei por quê'", disse.
Um promotor então o forçou a assinar dois papéis escritos em persa.
"Eu não sabia o que estava assinando. (Mas) estava basicamente aceitando que as acusações (contra mim) eram verdadeiras", disse ele.
Kjems foi acusado de participar dos protestos e filmá-los, o que foi considerado um ato contra a segurança nacional do Irã.
Legenda da foto, Kjems disse à BBC que evitou interferir nos protestos, mas isso não impediu que as autoridades persas o detivessem
Surpresa inesperada Dentro da Evin, ele dividia uma cela com vários iranianos também detidos durante as manifestações. Ele se preparou para uma fase difícil, mas vivenciou um ato inesperado de bondade.
Um de seus companheiros de cela era o aiatolá Abdolhamid Masoumi-Tehrani, um clérigo crítico do líder supremo do Irã, detido em Teerã em outubro.
"Esperamos que Thomas não julgue o Irã com base nas ações daqueles que o mantiveram na prisão", disse ele à BBC em uma videochamada.
Kjems disse que o aiatolá lhe dava uma porção de sua própria comida todos os dias. "Foi um pequeno gesto, mas na prisão é um gesto muito grande", acrescentou.
Outro de seus companheiros de cela foi Mohammad Boroughani, um manifestante de 20 anos que em novembro foi considerado culpado por um tribunal revolucionário de Teerã por "inimizade contra Deus" e condenado à morte.
Boroughani foi acusado de agredir um segurança e incendiar um prédio do governo. A Anistia Internacional afirmou que seu julgamento foi uma "farsa".
Kjems disse que estava na cela no dia em que Boroughani foi informado de sua sentença de morte.
“Quando perguntei por que ele estava com raiva, seus companheiros de cela me disseram que sua detenção seria estendida por mais um mês. Tentei dar ânimo a ele”, disse.
Alguns dias depois, ele descobriu a verdade.
"Fiquei chocado", disse ele, acrescentando: "Me lembro que ele me disse que havia tentado bater em um daqueles policiais de choque, mas não conseguiu. Havia outras pessoas na prisão condenadas à morte por publicar um story no Instagram".
Kjems disse que os agentes de inteligência não o machucaram fisicamente, mas ouviu relatos angustiantes de promotores submetendo outros presos à tortura brutal.
Legenda da foto, Os protestos do ano passado foram um grande desafio para o regime dos aiatolás que governa o Irã desde 1979
A troca Em junho, após sete meses de detenção, os funcionários da prisão disseram a ele para fazer as malas e sair da cela.
Ele foi levado ao aeroporto de Mehrabad, em Teerã, e embarcou em um avião particular com destino a Omã.
Ele havia sido libertado pelo Irã após a mediação do governo de Omã.
Dois cidadãos iraniano-austríacos, Massud Mossaheb e Kamran Ghaderi, e o trabalhador humanitário belga Olivier Vandecasteele também foram libertados como parte da troca de prisioneiros. Os três homens estavam cumprindo penas após serem condenados por espionagem, acusações que eles negaram.
Legenda da foto, Kjems dividia a cela com Mohammad Boroughani, um rapaz de 20 anos que foi executado por participar das manifestações
Ao mesmo tempo, o diplomata iraniano Asadollah Assadi foi libertado pela Bélgica, onde cumpria uma sentença de 20 anos de prisão por planejar bombardear um comício de um grupo de oposição iraniano exilado na França em 2018.
Kjems disse que sentiu "muita culpa" após saber que Assadi havia sido libertado, acrescentando: "Toda essa troca é um dilema ético".
O advogado dele, Sam Jalaei, da Dinamarca, disse que ele era inocente, mas esses casos não poderiam ser resolvidos apenas por meio do processo legal no Irã.
"Desde o início sabíamos que era uma questão política. Por isso mantivemos contato permanente com o Ministério das Relações Exteriores dinamarquês e o serviço de inteligência", explicou.
Kjems disse que, depois de sete meses na prisão, ele só queria ir para casa e tomar o café de sua mãe.
"Agora que sei como funciona o sistema no Irã, como eles usam estrangeiros como moeda ou como dinheiro, nunca mais voltarei", disse ele enquanto tomava um café expresso em uma cafeteria em Copenhague, a capital da Dinamarca.
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