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Ellen e Willams em maio de 2014, no nascimento das
gêmeas: na época, casal não desconfiava que filhas tinham síndrome de
Down
Uma sequência de
notícias inesperadas mudou completamente a vida do casal Ellen de Souza e
Willams Ferreira a partir dos últimos meses de 2013.
Eles, que na
época namoravam havia dois anos, souberam que seriam pais. "Eu tomava
anticoncepcional corretamente e não planejávamos ter um filho naquele
momento", diz a mulher.
Dois meses depois, outra notícia
surpreendeu o casal: eram gêmeos idênticos (univitelinos). "Há vários
casos de gêmeos na minha família, mas não acreditava que também fosse
acontecer comigo", comenta Ellen.
A terceira surpresa, que o
casal define como a mais difícil, veio no primeiro mês de vida das
filhas: um exame apontou que as duas têm síndrome de Down.
"Confesso
que fiquei arrasada quando soube, porque tinha muito medo do que isso
poderia significar em nossas vidas", revela Ellen. "Quando recebemos a
notícia, foi um impacto muito forte. Tivemos um pouco de medo, pois
pensamos em como seria o futuro delas", completa Willams.
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Ellen e Willams em maio de 2014, no nascimento das
gêmeas: na época, casal não desconfiava que filhas tinham síndrome de
Down
Passados
mais de cinco anos desde que Helena e Heloísa nasceram, em 9 de maio de
2014, Ellen e Willams consideram as garotas seus maiores presentes. "O
medo que tivemos foi apenas no começo. Logo passou esse temor, porque
sabíamos que as nossas filhas precisariam muito da gente", diz Ellen.
O
nascimento de Helena e Heloísa é considerado um fato raro. Isso porque
estudos apontam que, aproximadamente, um a cada 700 ou 800 partos no
Brasil é de uma criança com síndrome de Down. Não há dados oficiais, mas
especialistas acreditam que menos de 0,5% dos nascimentos de crianças
com a síndrome seja de gêmeos — desses, apenas um terço deles são
univitelinos, como no caso das meninas, quando os dois bebês possuem a
característica genética.
A síndrome de Down é uma alteração genética caracterizada pela
presença de três cromossomos 21 nas células do indivíduo. Aqueles que
possuem a característica têm, ao todo, 47 cromossomos nas células,
enquanto a maior parte da população tem 46.
Estimativas apontam
que no Brasil há, aproximadamente, 300 mil pessoas com trissomia do
cromossomo 21, como também é conhecida a síndrome.
Gestação e nascimento
Ellen,
hoje com 27 anos, descobriu a gravidez enquanto estava na metade do
curso de fisioterapia. Ela planejava concluir a graduação para que
depois pudesse ser mãe. "Quando descobri a gestação, tive de mudar todos
os meus planos, principalmente quando soube que eram gêmeas", revela.
Os
exames de pré-natal apontaram que ela estava grávida de duas meninas,
mas não indicaram a síndrome. "Nunca imaginei que elas poderiam ter
Down", diz Ellen.
As garotas nasceram duas semanas antes de a mãe
completar os nove meses de gestação. Dias depois de as recém-nascidas
irem para casa, uma das médicas ligou para Ellen. "Ela me disse que as
minhas filhas deveriam fazer um exame, porque as duas pediatras que
estiveram no parto suspeitaram que elas poderiam ter síndrome de Down",
explica a mãe.
A família mora em João Pessoa, na Paraíba. Os
materiais colhidos das recém-nascidas foram encaminhados a São Paulo,
onde passaram por análise. Um mês depois, os resultados dos exames
confirmaram a síndrome.
"Quando soube, chorei muito. Cheguei em
casa, olhei para elas e pensei que não queria mais ser mãe. Foi como um
momento de luto. Mas toda essa sensação ruim durou uma hora, mais ou
menos. Logo que elas choraram, eu corri para cuidar delas", diz Ellen.
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Gestação das gêmeas foi inesperada, mas hoje é considerado pelos pais como um presente
A partir de então, a dedicação do casal para cuidar
da filha passou a ser intensa. "A gente sabia que elas precisariam de
muita ajuda para que pudessem se desenvolver", diz a mãe.
Pediatra
e geneticista, Patrícia Salmona, presidente do departamento científico
de genética da Sociedade de Pediatria de São Paulo, explica que para que
uma criança com síndrome de Down possa se desenvolver é fundamental que
os pais façam estimulação precoce. "A gente indica acompanhamento com
fonoaudiólogos e fisioterapeutas, além de terapia ocupacional", diz.
"Essas
crianças precisam passar por exames, como avaliações cardiológicas,
porque metade das pessoas com síndrome de Down tem cardiopatia. Também é
importante avaliar a visão e a audição dessas crianças", diz a
especialista.
Salmona ressalta que pode haver casos, como o de
Ellen, em que as mães descobrem que o filho possui a síndrome somente
após o nascimento da criança. "Há até 80% de chances de a mãe descobrir
durante a gestação, se fizer o pré-natal adequado, com exames que possam
identificar a característica. Mas ainda assim, há uma pequena
porcentagem de casos, em torno de 20% ou 30%, em que a síndrome acaba
passando batido, porque a criança não tem alterações, como a
cardiopatia, que possam estar relacionadas à síndrome de Down. Por isso,
há situações em que o diagnóstico vem somente depois do nascimento",
pontua a médica.
O desenvolvimento das gêmeas
Ellen
comenta que as filhas costumam ter dificuldades para se desenvolver.
"Elas demoram mais que outras crianças para aprender coisas do
cotidiano. Por exemplo, a Helena andou com onze meses. Já a Heloísa deu
os primeiros passos somente aos dois anos", diz.
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Helena e Heloísa passam os dias na escola e com as avós, enquanto os pais trabalham
"Penso que se elas não tivessem a síndrome, estariam
falando mais e talvez não tivessem tanta dificuldade para formar
frases. Mas, apesar disso, não vejo muitas diferenças entre ter filhas
com Down ou não", acrescenta a mãe.
"Esse comprometimento
(cognitivo) varia conforme o estímulo recebido pela criança ao longo da
vida. Quanto mais estímulos, mais ela evolui", diz Patrícia Salmona.
As
garotas estão em uma escola regular de João Pessoa, em fase de
alfabetização. A mãe revela que há algumas dificuldades em comparação
com os colegas de turma. "Mas a Helena está indo muito bem. Sabe até
contar e cantar em inglês", conta.
Autismo
Há
um ano, Heloísa também foi diagnosticada com Transtorno do Espectro
Autista (TEA), em grau leve. "Essa é mais uma dificuldade, mas nada que a
impeça de evoluir", afirma Ellen.
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Heloísa (de vestido azul) foi diagnosticada com autismo há um ano
Pesquisas apontam que as chances de uma pessoa com
síndrome de Down ter autismo são maiores do que a população em geral.
"Os estudos consideram que o risco de autismo na população geral é de,
mais ou menos, 1%. Já entre as pessoas com Down, o risco é um pouco
maior, corresponde de 5% a 10% de chances", diz Salmona.
"É
importante dizer que o autismo e a síndrome de Down são completamente
diferentes. Uma das diferenças é que as pessoas com síndrome de Down são
sociáveis, enquanto aquelas com Transtorno do Espectro Autista não
são", explica a médica.
Heloísa e a irmã fazem acompanhamento com
fonoaudióloga, psicóloga e fisioterapeuta de duas a três vezes por
semana. Em casa, a mãe também auxilia as filhas em atividades para que
elas possam se desenvolver.
"Cada aprendizado delas é uma grande
vitória para a gente. Mesmo com algumas dificuldades, elas estão
aprendendo cada dia mais", comemora o pai das garotas.
O cotidiano e o futuro
Helena
e Heloísa são descritas pelos pais como alegres e muito carinhosas. "Em
todos os lugares que elas vão, as pessoas ficam encantadas, porque são
muito amorosas", diz Ellen. Entre as atividades preferidas delas estão
brincar de bonecas e com brinquedos educativos. A convivência entre as
duas é típica entre irmãos e, às vezes, acaba em briga.
"Uma puxa o cabelo da outra e elas acabam brigando. Mas elas ficam, na maior parte do dia, abraçadas ou brincando", conta a mãe.
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Helena e Heloísa (de vestido azul) são alegres e amorosas e gostam de jogos educativos, dizem os pais delas
A fisioterapeuta afirma que teme que as filhas
enfrentem preconceito. "Elas são muito novas e sequer entendem que têm
síndrome de Down. Nós tememos que elas sejam discriminadas por essa
condição. Hoje em dia as pessoas entendem mais sobre o assunto, mas
ainda existe preconceito", declara.
Ellen retomou os estudos pouco
após o nascimento das crianças e se formou em fisioterapia. Hoje se
divide entre os cuidados com as garotas e o trabalho — ela atende
pacientes em domicílio. O pai das gêmeas é técnico em climatização. As
meninas passam os dias entre a escola e a casa de uma das avós, até os
pais voltarem de seus trabalhos.
Os pais revelam que o principal
objetivo deles é que as garotas possam se desenvolver o suficiente para
que possam ter um futuro melhor e sem grandes dificuldades.
"Quero
que elas estudem, se formem e tenham suas famílias. Hoje em dia a gente
vê, apesar das dificuldades, muitas pessoas com síndrome de Down
conseguindo se formar, trabalhar e ser independentes. O meu maior desejo
é que elas sejam assim também", afirma Ellen.
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