Três pessoas foram condenadas por integrarem o grupo Ação Nacional. Adam Thomas, de 22 anos, sua parceira Claudia Patatas, de 38, e Daniel Bogunovic, de 27, eram membros da organização neonazista de extrema direita que foi banida por leis de antiterrorismo após celebrar publicamente o assassinato da parlamentar trabalhista Jo Cox.
Thomas e Patatas foram condenados a seis anos e meio e cinco anos de prisão, respectivamente, e Bogunovic, a seis anos e quatro meses. Três outros homens que se declararam culpados anteriormente no mesmo caso também foram presos.
Conheça a seguir a história do Ação Nacional e a ameaça representada por seus membros.
Parecia ser uma casa normal.
A propriedade, em uma parte tranquila de Oxfordshire, no sudeste da Inglaterra, era ocupada por um casal que havia acabo de ter seu primeiro filho.
Os vizinhos os viam às vezes levando o bebê para passear em um carrinho. O homem, que costumava usar calça militar, trabalhava como segurança. A mulher - uma fotógrafa de casamentos nas horas vagas - trabalhava até recentemente em uma loja de roupas.
Mas, dentro de casa, Adam Thomas e sua parceira portuguesa, Claudia Patatas, criaram um mundo perturbador.
O quarto deles estava cheio de armas - facões, bestas, um machado sob a cama, um punhal de estilo nazista. No corredor, havia pendentes com um sol negro - um símbolo associado à SS, o braço paramilitar do partido nazista alemão - e a insígnia da Ku Klux Klan (KKK). Almofadas adornadas com suásticas decoravam a sala. Na cozinha, havia um cortador de massa em forma de suástica.
A geladeira estava adornada com um pôster do grupo neonazista Ação Nacional, banido pela legislação antiterrorismo britânica em dezembro de 2016, declarando que "a Grã-Bretanha é nossa - o resto deve ir embora".
Um cartão de memória escondido sob o chão da sala de jantar continha várias fotografias surpreendentes do casal.
Em uma delas, Thomas segura a bandeira da Alemanha nazista enquanto Patatas embala seu bebê. Em outro, mãe e filho estão com um homem diferente, Darren Fletcher, que faz uma saudação nazista.
Outras imagens encontradas em um telefone celular mostram Thomas vestido com o distintivo traje branco da KKK, olhando para o filho através dos buracos de um capuz branco e pontudo.
O bebê, com pouco mais de um mês na época, recebeu o nome do meio Adolf de seus pais - em homenagem ao líder da Alemanha nazista.
As imagens foram encontradas por investigadores de contraterrorismo que chegaram à propriedade no início da manhã de 3 de janeiro deste ano para prender Thomas e Patatas por sua adesão ao Ação Nacional.
A origem do Ação Nacional
O Ação Nacional foi fundado em 2013 por Ben Raymond, hoje com 29 anos, e Alex Davies, hoje com 24.
Na época, Raymond, recém-formado em Política na Universidade de Essex e neonazista declarado, estava morando em Bognor Regis, no sul da Inglaterra. Depois da universidade, ele havia começado a trabalhar como vendedor de vidro e também dava expediente em um centro de empregos, auxiliando quem buscava trabalho.
Muito do seu tempo livre era gasto na internet, imerso em conteúdos perturbadores de extrema direita. Ele criou memes, editou vídeos e escreveu longos discursos, inclusive para o obscuro Partido Integralista, que buscava um "exército nacional fascista" em nome de uma "religião racial que inspira e exige o fanatismo".
Foi essa atividade online que atraiu Davies, um estudante da Universidade de Warwick e membro do Partido Nacional Britânico. Até então, o partido estava em declínio acentuado em relação ao seu ótimo desempenho nas eleições europeias, quatro anos antes.
A dupla acreditava que, nos últimos anos, as organizações britânicas de extrema direita haviam diluído sua mensagem em busca de apoio além de suas bases. Os fundadores do Ação Nacional determinaram que, em contraste, o grupo seria abertamente racista e neonazista.
Tinha todas as características do neonazismo do pós-guerra - ódio aos povos não brancos e judeu, uma visão de mundo inteiramente baseada no racismo e a veneração dos "arianos brancos", da era nazista e de seus piores criminosos de guerra.
Davies acabou sendo expulso da Universidade de Warwick por suas atividades políticas de extrema-direita e, no País de Gales, encontrou trabalho como vendedor de seguros.
A dupla acreditava que os jovens de todo o Reino Unido abraçariam a mistura tóxica do grupo de adoração a Hitler, negação do Holocausto e teorias de conspiração.
Na realidade, nunca chegou a ter mais de cem membros, e aqueles que atraíam formavam um conjunto de fanáticos unidos por ódios irracionais.
Nenhuma tentativa foi feita em se engajar na política democrática, com a organização se considerando um movimento de rua baseado na juventude. Seu logotipo era semelhante ao da SS.
O recrutamento era focado em adolescentes e jovens de 20 e poucos anos, embora alguns dos alvos também fossem crianças.
A estratégia do grupo envolveu inicialmente a panfletagem em campi universitários. Mas logo passou a fazer campanhas publicitárias agressivas e manifestações no centro da cidade, com atividades propagandeadas no site do grupo e nas redes sociais.
À medida que crescia, o Ação Nacional transformou-se em uma rede clandestina de pequenos grupos regionais, com membros cooperando nacionalmente.
'Nós somos a jihad branca'
Os membros, que se vestiam de preto durante as manifestações, promoviam a ideia de que o Reino Unido estava à beira de uma "guerra racial" e que uma elite predatória estava deliberadamente incentivando a imigração na tentativa de destruir a população branca nativa.
O grupo alegava ser patriota, mas era hostil a todas as instituições domésticas, ao Estado de direito, ao processo democrático e a todos que não compartilhavam de sua visão de mundo. Políticos e funcionários públicos eram um alvo especial de seu ódio.
Durante um discurso, Matthew Hankinson, membro sênior da Ação Nacional, disse que eles garantiriam que os "traidores" acabariam "pendurados nos postes de luz". "Devemos ser implacáveis - e, se pessoas inocentes forem eliminadas neste processo, então, que assim seja", afirmou ele.
A organização era abertamente genocida e disse que todos os judeus e não brancos teriam de ser eliminados. Em um documento, declarou: "É com alegria que vamos aprovar a solução final em toda a Europa".
Mas o Ação Nacional não se restringiu à admiração pelos nazistas. Seus membros também se inspiraram no Khmer Vermelho, o regime brutal que governou o Camboja no final dos anos 1970 sob o líder marxista Pol Pot; no terrorista norueguês de extrema direita e assassino em massa Anders Breivik; e até mesmo no grupo extremista autodeclarado Estado Islâmico.
Pela internet, o grupo anunciou: "Nós somos a jihad branca" e "Nosso lema é 'Longa Vida à Morte!', porque somente aqueles que estão dispostos a morrer por suas crenças estão verdadeiramente vivos".
A lógica de tais ideias levou à violência. Em 2015, Zack Davies, um membro de 25 anos de idade, usou um martelo e um facão para atacar um dentista sikh, uma religião indiana, em um supermercado por causa da cor de sua pele.
Davies gritou: "Poder branco!" durante o ataque, pelo qual ele foi posteriormente condenado por tentativa de homicídio. Ele havia posado para uma selfie em frente a uma bandeira do Ação Nacional enquanto segurava uma faca.
No ano seguinte, Jack Coulson, um membro de 17 anos de idade, foi preso pela polícia de contraterrorismo depois de postar imagens de um canhão caseiro na rede Snapchat, junto com ameaças a muçulmanos.
Coulson, que seria condenado por fabricar explosivos, havia se juntado ao Ação Nacional meses antes e estava se comunicando com membros mais velhos tanto pessoalmente como pela internet.
No dia em que a deputada trabalhista Jo Cox foi assassinada pelo supremacista branco Thomas Mair, em junho de 2016, o adolescente publicou em uma rede social: "Há menos uma traidora da raça na Grã-Bretanha graças a este homem".
"Ele é um herói, precisamos de mais pessoas como ele para matar os traidores da raça", continuou Coulson.
Uma conta oficial do Ação Nacional no Twitter também celebrou o assassinato, afirmando: "Não deixe que o sacrifício deste homem seja em vão" e "Faltam só 649 deputados #JihadBranca".
Estrutura, disciplina e rigor
Em 2016, Christopher Lythgoe liderava todo o grupo. Raymond e Davies continuaram sendo figuras influentes, mas foi Lythgoe, hoje com 32 anos, que procurou impor estrutura e rigor à organização.
Ele morava com os pais em Warrington, no noroeste da Inglaterra, e trabalhava intermitentemente em armazéns. Gastava muito do seu tempo tentando transformar o Ação Nacional em uma organização paramilitar. Elaborou manuais detalhados, explicando coisas como a forma correta de carregar bandeiras e enviando mensagens intimidando outros membros.
Em uma delas, ele escreveu: "Apenas um lembrete de que todos devem treinar para o caso de precisarmos. Não levamos ninguém nas costas. Sem exceções".
Ele acrescentou: "Imagine como será quando tivermos 20, 30, 50 ou mais caras que possam deixar alguém inconsciente com um soco. Vamos lutar como um grupo disciplinado. Isso é o que eu chamaria de uma unidade formidável. Então, como eu disse, todos nós treinamos".
O treinamento incluía boxe, artes marciais e uma série de exercícios ao ar livre em acampamentos. Em um destes campos, os participantes deveriam "beber hidromel e viver como vikings". Um neonazista chegou a dormir em uma cabine telefônica para escapar da chuva e da neve.
Mas não é necessário levar a sério as fantasias paramilitares do grupo para considerá-las preocupantes e perigosas.
A ameaça representada pelo Ação Nacional veio do ódio que encorajou, o que gerou uma ameaça bastante real para o público em geral e para qualquer pessoa escolhida como alvo por aqueles que radicalizou.
Uma avaliação do governo no final de 2016 concluiu que o grupo estava "envolvido com terrorismo" e o descreveu como "amplamente racista, antissemita e homofóbico". Tornou-se o primeiro grupo de extrema direita a ser banido no país desde a Segunda Guerra Mundial.
A medida que tornou um crime a adesão ao Ação Nacional estava especificamente relacionada à sua glorificação do terrorismo e da violência extrema.
Antes da proibição, a liderança do grupo se reuniu em uma conferência telefônica segura, incluindo Lythgoe, os fundadores Raymond e Davies e organizadores regionais.
Lythgoe insistiu que o grupo continuasse a atuar como de costume - apenas sem o nome ou ações públicas mais óbvias. Nos dias anteriores à proibição, ele enviou aos seus seguidores uma série de emails. "Seguimos em frente como temos feito", afirmou.
Em outro, enviado aos líderes regionais, disse: "Certifiquem-se de manter contato com todos os membros. Assegurem a eles que ficarão bem, desde que não promovam o Ação Nacional a partir de sexta-feira. Certifiquem-se de que eles entendam que a essência do Ação Nacional é o povo, nossas habilidades, nossos laços, nossas ideias e nossa força de vontade. Tudo isso continuará. Estamos apenas mudando de pele. Todos os movimentos genuinamente revolucionários do passado precisaram existir cladestinamente em alguma medida. Estes são tempos excitantes".
Em busca de uma guerra racial
Um dos participantes da lista de discussão de Lythgoe era Alex Deakin, líder da região central da Inglaterra, conhecida como Midlands.
Menos de duas horas depois de receber o email, Deakin criou no aplicativo de mensagens Telegram um grupo que se tornou a principal ferramenta de organização regional para a Ação Nacional depois da proibição. Ele batizou o grupo de Triple KKK Mafia, uma referência à Ku Klux Klan. Com o tempo, o grupo chegaria a 21 membros.
Deakin criou ainda outro grupo, chamado Inner, que reunia um número seleto de participantes do grupo maior.
Deakin, hoje com 24 anos, era um estudante universitário de Birmingham que se radicalizou por meio da internet.
Em setembro de 2016, depois de passar dois anos estudando na Universidade de Aberystwyth, no País de Gales, ele desistiu e foi transferido para um curso de história na Universidade de Coventry, na Inglaterra.
Ele disse a um contato que foi levado até o Ação Nacional após "participar intensamente de fóruns, passar anos discutindo na internet e, finalmente, decidir entrar em ação quando o grupo me impressionou".
Deakin se reportava regularmente a Lythgoe e a Raymond, contando-lhes sobre seus esforços para recrutar novos membros, organizar os existentes e disseminar a propaganda do Ação Nacional.
Mensagens no ano anterior à proibição do grupo mostram a extensão de suas ambições. Em uma troca sobre a segmentação das cidades da classe trabalhadora, ele escreveu: "Devemos mudar para radicalizar essas áreas, transformá-las em guetos sectários no estilo da Irlanda do Norte seria o primeiro passo para fomentar uma guerra racial".
Para Lythgoe, Deakin declarou: "Como o IRA e o Viet Cong, precisaríamos ter um apoio entre as comunidades em meio às quais lutaríamos; ruas e becos sem saída funcionariam como abrigos oferecidos por apoiadores locais, e seria necessário sermos capazes de ocultar nossa presença em instantes". Estas conversas só se intensificaram quando o grupo foi banido.
Em Midlands, a organização interrompeu suas campanhas, mas os membros continuaram a se comunicar, a encontrar-se, a procurar novos recrutas e a encorajar as piores tendências uns dos outros.
Havia referências explícitas ao fato de que o Ação Nacional ainda existia. Em uma mensagem, Deakin disse: "De qualquer forma, o grupo de Midlands continua sob o nome Triple KKK Mafia".
Em outro, Adam Thomas escreveu: "Assim, desde que o Ação Nacional foi destruído, a liderança em geral concordou que ele seria desfeito. Nenhuma tentativa de revivê-lo. Mas o grupo de Midlands, que são apenas 17-20 de nós, decidiu ignorar isso... Midlands continuará a luta sozinho".
Mensagens no grupo do Telegram mostram membros usando linguagem racista e violenta, discutindo seu desejo de uma "guerra racial" e fantasiando sobre o assassinato daqueles que odiavam.
Deakin escreveu que todo o povo judeu deveria ser "queimado" e que os chineses e negros deveriam ser transformados em "biocombustível".
Um membro, Darren Fletcher, de 28 anos, referiu-se a Thomas Mair, o assassino de Jo Cox, quando perguntou: "Por que não há mais Mairs? Precisamos de algumas centenas deles para eliminar estes deputados antibrancos".
Fletcher, um motorista de caminhão e velho amigo de Adam Thomas, já havia sido preso depois de postar vídeos no YouTube de si mesmo no palco de um evento de música extremista vestido com uma roupa da KKK segurando uma boneca negra.
Quando Fletcher escreveu que as pessoas no governo deveriam ser mortas, ele recebeu apoio de Thomas, que disse: "Concordo, mas há 600 deputados, a menos que você acabe com eles de uma só vez, outros os substituirão".
'Não há paz para os ímpios'
Claudia Patatas, que havia estudado até o nível de pós-graduação em Portugal antes de se mudar para o Reino Unido há mais de uma década, passou anos como profissional de marketing. Em público, fornecia declarações sem graça para revistas corporativas, enquanto em sua vida privada escrevia mensagens exclamando: "Todos os judeus devem ser mortos" e "Tragam de volta os campos de concentração".
Ela disse aos membros do grupo que "Adolf é vida" e estava entusiasmada com a realização de uma festa para o aniversário de Hitler, lembrando uma que havia frequentado em Lisboa anos antes.
"Nós tínhamos um bolo com o rosto do führer", ela disse, antes de acrescentar: "Foi difícil para mim cortar o rosto dele".
Talvez o membro mais perigoso do grupo fosse um cabo do Exército britânico. Mikko Vehvilainen, hoje com 34 anos, ingressou no Exército em 2012, tendo anteriormente passado pela Marinha da Finlândia, terra natal de seu pai. Em um email para um amigo, escreveu: "Estou apenas aprendendo habilidades de combate úteis".
Casado e pai de crianças pequenas, ele era adepto de uma interpretação supremacista racial do cristianismo chamada Identidade Cristã e um membro sênior do Ação Nacional obcecado com ideias sobre o colapso da civilização e uma guerra racial.
Em um texto de seu diário do ano passado, sob o título "pontos-chave para a reunião da liderança", ele se referiu a "fases posteriores do terrorismo, desordem civil, destruição de infraestrutura e da rede elétrica".
Em outro documento, ele disse que havia a necessidade de se estar "preparado para lutar e morrer por sua raça em uma possível última resistência por nossa sobrevivência".
"Cada parte de mim deseja uma guerra. Não há outro caminho", escreveu em uma mensagem no Telegram.
Sua coleção pessoal de armas, armazenada para o que via como conflitos iminentes, incluía armas de fogo legalmente mantidas por ele, assim como facas, facões, soco-inglês, besta, arco e flecha, spray de pimenta, algemas e um martelo com a inscrição bíblica: "Não há paz, diz o Senhor, para os ímpios".
O soldado, que era baseado na sede do Exército galês em Powys, buscava ativamente por novos recrutas para servir sob ele no Regimento Real Anglicano, a infantaria militar britânica.
Três soldados foram convidados para o grupo principal do Telegram depois que Vehvilainen disse a Deakin que eles estavam "comprometidos" com os nazistas.
Um deles, Mark Barrett, escreveu mensagens racistas no grupo, e recebeu Vehvilainen, outro soldado e um membro do Ação Nacional chamado Nathan Pryke em sua casa cedida pelo Exército, onde passaram uma noite atirando flechas em uma cruz em chamas no jardim dos fundos.
Vehvilainen, que serviu no Afeganistão, também queria que os neonazistas civis se juntassem a ele nas Forças Armadas, dizendo: "Se conseguirmos um bom número para o Exército, estaremos no lugar certo quando as coisas começarem a desmoronar".
Ele escreveu no grupo Inner que os membros do Ação Nacional deveriam se concentrar em obter "posições civis e militares importantes".
Quatro membros de seu círculo no Ação Nacional tentaram se juntar ao Exército: Alex Deakin, Adam Thomas, Nathan Pryke, um motorista de van de 27 anos de Cambridgeshire, e Joel Wilmore, de 24 anos, originalmente de Lincolnshire, que serviu na Reserva Militar, unidade militar britânica formada por reservistas voluntários, antes de começar em um emprego como especialista em segurança da informação. Isso envolvia agir como um "hacker ético" para testar a força de sistemas de TI.
Vehvilainen aconselhava Thomas e havia se oferecido para ser alguém capaz de atestar o bom caráter de integrantes do grupo.
Thomas, por sua vez, perguntou se ele poderia comprar uma arma de Vehvilainen e se alguém notaria se fuzis fossem roubados de sua base. Mas, antes que algo mais pudesse acontecer, o grupo foi banido.
Manuais de fabricação de bombas e de operações de limpeza étnica
Durante vários meses, investigadores apuraram um incidente em julho de 2016, durante o qual vários homens haviam colado adesivos do Ação Nacional pelo campus da Universidade Aston, em Birmingham.
Na primavera de 2017, alguns suspeitos foram presos, incluindo Alex Deakin. Grupos de mensagens incriminadoras foram encontrados em seu telefone e de outro homem que não pode ser identificado por questões legais.
Depois de ser liberado enquanto ainda era investigado, Deakin enviou um email em pânico para vários contatos do Ação Nacional. "Meu telefone apreendido está cheio de textos que me identificarão como um organizador do grupo", escreveu ele. "Eu entendo se vocês me desprezam por esse desleixo (realmente não poderia ter feito algo pior nem se eu quisesse)."
O "desleixo" de Deakin o levou a três julgamentos em Birmingham neste ano, dos quais muitos detalhes só podem ser revelados agora que o último foi concluído.
No primeiro, que terminou em abril, Deakin, Vehvilainen e o soldado Mark Barrett foram julgados como membros do Ação Nacional. Barrett foi absolvido, mas os outros dois foram condenados a oito anos de prisão.
Os três foram presos em setembro de 2017, junto com os outros dois soldados do grupo de mensagens, ambos liberados sem serem acusados formalmente.
Apenas Barrett optou por depor, dizendo ao tribunal que não havia ingressado no Ação Nacional apesar de estar no grupo do Telegram e que se arrependia de suas postagens racistas.
Deakin também foi condenado por duas acusações de posse de documentos que seriam úteis para alguém que estivesse preparando um ato de terrorismo - incluindo manuais de fabricação de bombas e um livro de instruções para extremistas brancos - que foram encontrados em seu computador.
Ele também foi condenado por distribuir uma publicação terrorista, por enviar um documento chamado Operações de Limpeza Étnica para o cofundador do Ação Nacional Ben Raymond e dois outros contatos.
Vehvilainen foi absolvido de incitar ódio racial por escrever posts racistas em um fórum da Identidade Cristã. Entre outras coisas, ele escreveu: "Prometi lutar contra os judeus para sempre, de qualquer forma possível", e usou a palavra "bestas" para se referir a negros.
Em relação à sua vida no Exército, ele escreveu: "Há maneiras de evitar qualquer coisa, e eu simplesmente aprendi a evitar bestas". Ele acrescentou: "Quanto mais cedo eles forem eliminados, melhor."
Até onde se sabe, tanto Vehvilainen quanto Barrett foram dispensados do Exército. Os outros dois soldados presos foram disciplinados, mas não foram dispensados, embora um deles tenha saído voluntariamente.
A tenente-coronel Jackie Fletcher, do departamento pessoal do Exército, descreveu-os como "casos excepcionais".
"Isso é muito raro no Exército", disse ela. "O valor e os padrões do Exército são muito claros para os soldados, e qualquer indivíduo que viole estes valores e padrões será alvo de sanções."
No segundo julgamento, que terminou em maio, Deakin e outros três homens foram condenados por incitar o ódio racial em relação à campanha de adesivos da Universidade Aston - Daniel Bogunovic, de 27 anos, funcionário de um armazém e apicultor de Leicester, Chad Wiliams-Allen, de 27, membro do Ação Nacional antes do grupo ser banido e soldador de West Bromwich, e um homem de 20 e poucos anos que não pode ser identificado por questões legais.
No terceiro julgamento, de Thomas, Patatas e Bogunovic, três outros réus se declararam culpados de participar do Ação Nacional em audiências prévias: Darren Fletcher, Nathan Pryke e Joel Wilmore. Wilmore também admitiu possuir documentos terroristas, especialmente um intitulado "Coquetéis Molotov Caseiros".
Thomas, que também foi condenado por possuir um manual de fabricação de bombas, foi o único a fornecer provas.
Racismo em família
Thomas admitiu ser racista e disse aos jurados que havia sido exposto a tais crenças desde jovem, acrescentando que seu padrasto era de uma "banda supremacista" e começou a raspar sua cabeça aos 5 anos de idade.
Ele também contou ter dito a uma sobrevivente do Holocausto, que ele visitou junto com um mentor de desradicalização do governo, que ele "não conseguia entender" como ela poderia ter suportado os campos de concentração nazistas da Segunda Guerra Mundial.
Thomas disse aos jurados que, aos 18 anos, ele foi para Israel e considerou converter-se ao judaísmo, porque isso permitiria que ele se juntasse aos militares israelenses.
A BBC falou com pessoas que conheciam Thomas em Israel. David Simpkins, que dividiu um quarto com ele em um centro de estudos religiosos em Jerusalém, disse que seu colega de quarto usava o nome de Avi Ben Abraham.
Simpkins disse que Thomas contou sobre sua "infância horrível, que ele caracterizou como uma situação em que sofria ameaças constantes, crescendo em meio a britânicos de extrema direita que também eram neonazistas".
Thomas revelou que havia começado "a aprender sobre o judaísmo para descobrir por que ele deveria odiá-los", lembrou Simpkins.
Ele descreveu Thomas como "extremamente inteligente", mas disse que ele tinha "uma abordagem extrema do judaísmo" e queria se juntar a um pequeno grupo marginal que considera a maioria dos judeus como hereges.
"Os rabinos decidiram que Adam precisava de ajuda profissional para lidar com sua infância e voltar para se converter com a cabeça limpa", disse ele. "Ele estava cometendo o erro comum de muitos que desejam se converter, que é substituir um extremo psicológico por outro."
Avishai Grosser, que trabalha com convertidos, disse à BBC que Thomas, que "conhecia grandes partes da Torá de cor", desistiu de vários programas de conversão e acabou nas ruas antes de retornar ao Reino Unido.
Acredita-se que, depois que retornou, ele disse às pessoas nos círculos de extrema-direita que seu tempo em Israel estava relacionado a um envolvimento com a Identidade Cristã.
Foi nessa época que ele conheceu Patatas por meio de grupos de discussão do Ação Nacional. Eles se conheceram pela primeira vez em um bar em dezembro de 2016 e logo foram morar juntos.
'Uma organização realmente perigosa e bem estruturada'
Antes da proibição, o Ação Nacional pode ter sido visto "como apenas um daqueles grupos que incitam o ódio racial", disse Matt Ward, da Unidade de Contraterrorismo de West Midlands.
Ele explica como a compreensão de sua equipe sobre a ameaça representada pelo Ação Nacional "mudou consideravelmente" durante as investigações.
Fatos ocorridos depois de o grupo ser banido, diz ele, mostram "uma organização realmente perigosa e bem estruturada baseada em uma ideologia neonazista que busca dividir as comunidades, está se preparando para instigar e travar uma guerra racial dentro do Reino Unido e passou anos adquirindo habilidades, táticas e armas, e recrutando e treinando pessoas para poder fazer isso".
Como em Midlands, o Ação Nacional continuava operando secretamente no noroeste da Inglaterra, mas atuava mais abertamente em várias outras regiões inglesas e na Escócia, usando os pseudônimos NS131 e Amanhecer Escocês.
Há inquéritos em andamento contra pessoas associadas ao grupo, e vários julgamentos já ocorreram em outras partes do Reino Unido.
No Tribunal Criminal Central, em Londres, Christopher Lythgoe e Matthew Hankinson, ambos do noroeste inglês, foram condenados em julho por ofensas em um julgamento em que outro homem se declarou culpado de ameaçar matar uma policial e preparou um ato de terrorismo e matar a deputada trabalhista Rosie Cooper.
O juiz condenou Lythgoe e Hankinson a oito e seis anos de prisão, respectivamente, e disse que sua "visão verdadeiramente perversa e distópica" nunca poderia ter sido "alcançada por meio das atividades do Ação Nacional, um grupo muito pequeno operando na periferia do extremismo de direita".
Mas disse: "O risco real para a sociedade é a realização de atos isolados de terror", inspirados pelo que ele descreveu como a "ideologia pervertida" do grupo.
E quais os fundadores da Ação Nacional que inspiraram tal ódio? Encontramos Ben Raymond e Alex Davies morando em endereços separados em Swansea, no sul do País de Gales.
Ambos foram presos em setembro de 2017 por suspeita de integrar o Ação Nacional, mas foram informados de que não serão acusados. Raymond também foi preso por suspeita de possuir material terrorista e permanece sob investigação por isso.
Os inquéritos policiais dizem respeito ao seu envolvimento com o grupo de extrema direita NS131, criado após a proibição do Ação Nacional e que, no ano passado, também foi banido.
Os homens continuaram a fazer pronunciamentos públicos. No início deste ano, Davies usou uma estação de rádio neonazista na internet para pedir que ativistas de extrema direita se engajassem em uma campanha de "ação direta" contra o deputado trabalhista que sucedeu Jo Cox como parlamentar.
Raymond usou a mesma estação de rádio para discutir o julgamento de Lythgoe e Hankinson enquanto ele estava em andamento e declarar os réus "homens inocentes".
A BBC pediu a Raymond e Davies uma entrevista, mas eles se recusaram. Queríamos perguntar se eles assumem qualquer responsabilidade por tudo o que aconteceu e por sua relação com os membros do Ação Nacional desde a proibição.
Por exemplo, uma academia de ginástica em Warrington, montada para sessões de treinamento violento, só foi possível por causa das 1,5 mil libras dadas a ele por Davies, que visitou o local junto com membros do grupo após a proibição.
Raymond continuou a se comunicar com integrantes do Ação Nacional após seu banimento, via emails e aplicativos de mensagens criptografadas.
Ele era um membro ativo de ambos os grupos do Telegram, nos quais refletia sobre a teoria racial, engajava-se no antissemitismo, discutia suas correspondências com neonazistas no exterior e dava palestras para os outros sobre a ameaça dos infiltrados.
No dia em que o Ação Nacional foi proibido, Raymond escreveu para vários contatos por email, incluindo Deakin e Lythgoe, para dizer que estava "muito empolgado em trabalhar em todos nos novos projetos". Mais tarde, mensagens mostram Deakin dizendo que Raymond foi o responsável por criar material de propaganda após a proibição.
Um site secreto contendo desenhos de Raymond ao longo de vários anos, incluindo propaganda com violência sexual, sugere que ele criou logotipos para vários grupos surgidos no período após a proibição do Ação Nacional.
Deakin também continuou reportando-se a Raymond - da mesma forma que fazia antes do banimento - enviando mensagens sobre a confecção de dossiês sobre indivíduos "problemáticos" e uma ideia sinistra sobre a criação de "propaganda antibranca e propaganda pró-judaica para levar as pessoas ao seu limite".
Quando a BBC voltou a Swansea com uma câmera de televisão e se aproximou de Raymond na rua em frente ao seu quarto, ele nos xingou e fugiu para dentro, recusando-se a responder perguntas.
O que acontecerá com a rede de Ação Nacional a longo prazo não é claro. Já banido sob dois pseudônimos - NS131 e Scottish Dawn -, ele pode ainda ser proibido sob outros nomes também.
O grupo islâmico al-Muhajiroun, baseado em torno do notório pregador radical britânico Anjem Choudary, foi proibido sob outros nove nomes, mas a rede de indivíduos persistiu e se envolveu em muitos atos de terrorismo.
Uma ameaça persistente e crescente
O Ação Nacional não é o primeiro grupo neonazista violento criado no país desde a Segunda Guerra Mundial.
Na década de 1960, membros de várias organizações atacaram sinagogas e realizaram treinamentos no estilo paramilitar. O grupo de extrema direita Combat 18 foi mais tarde implicado em múltiplos atos de violência e intimidação. No final da década de 1990, o homem-bomba de Londres, David Copeland, era um membro do agora extinto Movimento Nacional Socialista.
A ameaça neonazista no Reino Unido não é grande, embora seja persistente. Mas aqueles radicalizados por suas ideias se entregam a um credo tão violento e odioso que algumas atividades terroristas seguirão acontecendo inevitavelmente.
As mentiras defendidas pela extrema-direita - da supremacia ariana e das conspirações judaicas globais - estão por aí, velhas ideias difundidas por meios modernos, com seus promotores sendo encorajados pelo clima político instável.
O perigo também parece estar crescendo, com a polícia registrando um aumento no número de conspirações terroristas de extrema-direita - cinco desde março de 2017 - e o assassinato de Jo Cox e o ataque em Finsbury Park são evidências claras do que indivíduos radicalizados podem fazer.
No mês passado, o vice-comandante da Polícia de Londres e oficial de contraterrorismo mais sênior, Neil Basu, disse a deputados que cerca de 80% das 700 investigações de terrorismo estavam concentradas em jihadistas islâmicos, mas que cerca de 20% eram voltadas para outros grupos, incluindo "um número significativo de ameaças de extrema direita".
Após os ataques terroristas no Reino Unido no ano passado, autoridades recomendaram um reforço do papel do MI5, a agência de segurança britânica, na luta contra o terrorismo de extrema direita, com o objetivo de garantir a equivalência na forma como o terrorismo é tratado, independentemente da ideologia que o inspira.
A implementação da recomendação foi iniciada, com o serviço de segurança começando a assumir a liderança de uma área que anteriormente reservada à polícia.
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