O vilarejo alemão que quase mudou o curso da 2ª Guerra e influenciou futuro das armas de destruição em massa
Com praias, um famoso sanduíche à base de peixe e um histórico de visitas da realeza prussiana, a ilha alemã de Usedom tem apelo turístico. Mas o remoto balneário teve outra função durante 1936 e 1945, quando foi ocupado pelos nazistas.
Em 1935, o engenheiro Wernher von Braun, em visita à ilha, a escolheu como o local perfeito para abrigar um programa de desenvolvimento e testagem de mísseis.
Isolada e oferecendo o Báltico como campo de provas, Usedom tornou-se então uma imensa fábrica de armas.
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No auge de seu funcionamento, 12 mil pessoas trabalharam na construção de foguetes em uma fábrica que ocupou 25 quilômetros quadrados de área. Mas as pesquisas levadas a cabo nas cercanias do vilarejo de Peenemunde não apenas foram cruciais durante a Segunda Guerra Mundial - seu impacto também se deu na criação de armas de destruição em massa e mesmo na conquista espacial.
'Arma da Vingança'
Tudo o que resta do complexo é o prédio de tijolos vermelhos que servia de usina de força e hoje abriga o Museu Histórico Tecnológico de Peenemunde. Seus jardins são decorados com modelos de foguetes e a coleção do museu inclui documentos e fragmentos de protótipos.
Em um manuscrito datado de 1942, o líder militar do programa balístico, Walter Dornberger, resumiu bem a importância de Peenemunde para o esforço de guerra.
Naquele ano, os nazistas testaram com sucesso o Agreggat 4 (A-4), o primeiro míssil de longo alcance e que ficaria conhecido como V2 ou "Arma da Vingança".
"Desenvolvemos algo que é uma das mais revolucionárias invenções da história recente e que nos dará superioridade militar, econômica e política", escreveu ele em um manuscrito encontrado no complexo.
Mas se os líderes do programa bélico acreditavam que os mísseis seriam vitais para ganhar a guerra, uma pessoa se matinha cética: Adolf Hitler.
O complexo não estava totalmente construído quando o líder nazista iniciou sua campanha militar, em 1939, o que forçou uma corrida contra o tempo e uma busca por materiais, estafe e verbas.
Foi apenas depois de ver um filme com o teste bem-sucedido do A4, que Hitler enfim deu sinal verde.
Trabalho escravo
Ainda assim, a situação era crítica e, em junho de 1943, os nazistas trouxeram 2,5 mil prisioneiros de campos de concentração para trabalhar em regime forçado na produção de mísseis. Registros mostram que a maioria vinha de França, Bélgica e Holanda.
Os prisioneiros trabalhavam sob condições terríveis na construção de armas que iriam causar terror e devastação em seus próprios países.
No verão europeu de 1943, os serviços de inteligência britânicos perceberam a importância de Peenemunde. Voos de reconhecimento revelaram a linha de produção de mísseis, que teria de ser interrompida - até porque nada menos que 1,5 mil mísseis V2 caíram no Reino Unido, a maioria deles em Londres, causando a morte de pelo menos 7 mil pessoas.
Na noite de 17 de agosto, a Força Aérea Britânica bombardeou Peenemunde, na maior operação aérea do país contra um único alvo durante a Segunda Guerra.
A operação não foi um sucesso no que diz respeito à destruição, mas atrasou a produção de mísseis e obrigou o programa a se transferir para a região central da Alemanha.
Mea culpa
Em 1944, Hitler admitiu para Dornberger que cometeu um erro ao não ter aprovado o projeto mais cedo.
"Em toda minha vida, só pedi desculpas para dois homens. O primeiro foi o marechal Von Brauchitsch. Não lhe dei ouvidos quando ele me falou diversas vezes sobre a importância das pesquisas (sobre mísseis). O segundo homem é você."
Mas o fim da guerra não representou o final do trabalho em Peenemunde. Os aliados estavam interessados na tecnologia balística do projeto V2, o primeiro foguete a lançar uma ogiva em uma trajetória pré-determinada. Cientistas e engenheiros que trabalharam no projeto receberam ofertas de asilo, cidadania e empregos em países como EUA, URSS, e Reino Unido.
Wernher Von Braun, por exemplo, mudou-se para os EUA e esteve à frente do desenvolvimento dos foguetes que levaram o homem à Lua. O trabalho lá feito influenciou os desenvolvimentos posteriores no que diz respeito aos mísseis.
O mais importante legado de Peenemunde, porém, é a reflexão sobre o impacto tecnológico e o papel de cientistas e engenheiros.
Como diz o curador do Museu Histórico Tecnológico, Phillip Aumann: "Progresso e inovação são um aspecto-chave das sociedades modernas. Nós temos influência sobre o que é pesquisado e desenvolvido".
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