Está perdido? O que as novas operações anticorrupção investigam - e qual é a ligação delas com a Lava Jato


Ex-ministro Paulo Bernardo é preso em Brasília e levado para aviãoImage copyrightAG. BRASIL
Image captionEx-ministro Paulo Bernardo foi o alvo mais "ilustre" da Operação Custo Brasil; STF ordenou sua libertação
Saqueador, Boca Livre, Tabela Periódica, Custo Brasil e, é claro, Lava Jato. E apenas para citar apenas algumas.
Neste momento, o país acompanha uma onda sem precedentes de operações que têm levado políticos, operadores financeiros e grandes empresários à prisão.
"O momento é de muitas operações simultâneas porque há muitos casos simultâneos e há muitos dados e provas de muita coisa errada feita nos últimos anos", afirma o coordenador da Câmara de Combate à Corrupção do Ministério Público Federal, Marcelo Muscogliati.
Segundo ele, nessa conta entram também uma maior autonomia da instituição, uma maior colaboração com a Polícia Federal e o Judiciário, e a relativamente nova interação com países como a Suíça - que enviou informações sobre contas mantidas por investigados no escândalo do petrolão no exterior, por exemplo.
"A grande novidade é que as provas hoje em dia estão mais acessíveis. Ficou mais difícil para as pessoas esconderem dinheiro ilícito no planeta, não só no Brasil. Ficou mais difícil cometerem crimes e não serem descobertas."
Está perdido no meio de tantas investigações? Entenda, a seguir, as principais operações deflagradas nos últimos dias - e qual a relação delas com a Lava Jato, a primeira da lista. Vale ressaltar que os acusados citados abaixo - exceto, é claro, os delatores - negam participação nos esquemas.
Policiais federais com material recolhido no Rio na Operação Vício, etapa da Lava JatoImage copyrightAG. BRASIL
Image captionDescobertas fizeram da Lava Jato a maior operação anticorrupção da história do país

1) Operação Lava Jato

Essa dispensa apresentações: segundo dados atualizados na última segunda, já são 166 prisões (entre preventivas, temporárias e em flagrante), 56 acordos de colaboração premiada e R$ 2,9 bilhões recuperados.
Iniciada como uma investigação sobre a atuação de doleiros, a operação acabou revelando o maior escândalo de corrupção da história do país.
Em suas primeiras fases, o caso implicou empreiteiras, funcionários da Petrobras, operadores financeiros e políticos de vários partidos em um esquema de desvios que, segundo as contas atuais do Ministério Público Federal, movimentaram R$ 6,4 bilhões em propinas em obras da estatal. No decorrer das apurações, porém, passou a incluir outras estatais, como a Caixa e a Eletronuclear, e outros setores do governo.
Já foram mais de 30 etapas que levaram à prisão políticos como o ex-ministro petista José Dirceu, o marqueteiro João Santana, responsável por campanhas eleitorais de Lula e Dilma, e empresários como Marcelo Odebrecht, ex-presidente e herdeiro do conglomerado de construção que leva seu sobrenome.
Além disso, o caso motivou protestos em todo o país e, embora não conste das acusações pelas quais a presidente afastada Dilma Rousseff será julgada no Senado, levou parte da opinião pública a apoiar o impeachment e colocou o deputado Eduardo Cunha, então estrela em ascensão do PMDB, na situação atual: é réu no STF sob a acusação de recebimento de propinas e corre o risco de ter o mandato cassado.
Nesta sexta, foi deflagrada uma nova fase, que investiga desvios na Caixa delatado por Fábio Cleto, ex-vice presidente do banco, e teria entre os envolvidos Cunha - que nega participação no esquema -, empresários e o corretor Lúcio Bolonha Funaro, que foi preso.
Não bastasse ser extensa em si, a Lava Jato deu origem as algumas das operações a seguir, que vêm movimentando o noticiário.
Policiais e seguranças na frente do prédio onde mora a senadora Gleisi HoffmannImage copyrightAG. BRASIL
Image captionPF fez buscas no apartamento funcional da mulher dele, a senadora Gleisi Hoffmann

2) Operação Custo Brasil

Deflagrada na semana passada como um desdobramento da Lava Jato, levou à prisão o ex-ministro Paulo Bernardo - cuja soltura foi determinada dias depois pelo ministro do STF Dias Toffoli.
Parceria entre o Ministério Público Federal em São Paulo, a Receita e a Polícia Federal, investiga supostos pagamentos de mais de R$ 100 milhões para servidores e políticos ligados ao Ministério do Planejamento entre os anos de 2010 e 2015 - ou seja, no fim do governo Lula e nos cinco anos de Dilma.
Segundo as apurações, o grupo agiu para que uma empresa fosse contratada para gerir crédito consignado para servidores - 70% de seu faturamento foi repassado para outras firmas por meio de manobras como contratos simulados.
Paulo Bernardo é acusado de ter se beneficiado do esquema, o que ele nega.
A operação ocorreu em São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná, Pernambuco e Distrtito Federal - foram 65 mandados entre busca e apreensão, condução coercitiva e prisão preventiva.
O empresário Carlinhos Cachoeira (ao centro), preso na Operação Saqueador, embarca na viatura da Polícia Federal após depoimento em 30/6/2016Image copyrightAG. BRASIL
Image captionCarlinhos Cachoeira (centro) voltou ao noticiário político-policial

3) Operação Saqueador

Na quinta-feira, um personagem já conhecido de outros escândalos voltou ao noticiário: o empresário Carlinhos Cachoeira, pivô do caso que levou à cassação em 2012 do então senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO), acusado de agir no Legislativo para favorecer os negócios dele em jogos de azar.
Agora, Cachoeira foi preso acusado de atuar na lavagem de dinheiro obtido pela construtora Delta por meio de contratos públicos - que corresponderam a 96,3% de seu faturamento entre 2007 e 2012, segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro.
O dono da Delta, Fernando Cavendish, foi denunciado pela Procuradoria e também teve a prisão pedida - amigo do ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB), ele estaria fora do país.
Segundo as investigações, R$ 360 milhões dos R$ 11 bilhões faturados pela empreiteira no período foram lavados com pagamento ilícito de serviços fictícios a empresas de fachada - é aí que entrariam Cachoeira e outros personagens, como Adir Assad e Marcelo Abbud - esses dois também implicados na Lava Jato.
O Ministério Público afirma que o mesmo esquema atuou na Petrobras - a apuração apontou um aumento significativo dos valores das transferências supostamente ilícitas nos anos eleitorais, inclusive ligadas ao pagamento de obras que nunca foram realizadas.
A então presidente Dilma Rousseff visita trecho da ferrovia Norte-Sul em Goiás, em 2014Image copyrightPR
Image captionFerrovia Norte-Sul também foi alvo de desvios, segundo investigadores

4) Operação Tabela Periódica

Outro desdobramento da Lava Jato, também veio à tona na quinta. É uma nova fase de outra operação, O Recebedor, que investiga fraudes nas obras da ferrovia Norte-Sul e ligação Leste-Oeste.
As apurações tiveram início no acordo de leniência fechado com a empreiteira Camargo Corrêa - além de revelar detalhes do escândalo da Petrobras, a empresa delatou irregularidades em outras estatais.
A companhia e alguns de seus executivos, que se tornaram delatores da Lava Jato, denunciaram a existência de cartel, fraudes em licitações, lavagem de dinheiro e corrupção em contratos com a Valec (estatal responsável pelas ferrovias).
O objetivo da ação desta semana, deflagrada em oito Estados, era recolher provas do envolvimento de empreiteiras e executivos em fraudes que envolviam propina a ex-diretores da estatal, segundo o Ministério Público Federal em Goiás, Estado de onde veio a autorização judicial para a operação.
Foram 44 mandados de busca e apreensão e 14 de condução coercitiva.
Perícias preliminares da Polícia Federal, ainda segundo a Procuradoria, apontavam R$ 631 milhões desviados só considerando o trecho da Norte-Sul em Goiás - ou seja, sem contar as obras realizadas em outros Estados.
Acusados da Operação Boca Livre, que investiga fraudes na Lei Rouanet, chegam a fórum em SP, para depor, em 29/6/2016Image copyrightAG. BRASIL
Image captionEmpresas aprovavam projetos culturais - mas gastavam dinheiro em festas privadas, aponta investigação

5) Operação Boca Livre

Disparada na semana passada pelo Ministério Público Federal em São Paulo, pela Polícia Federal e pelo Ministério da Transparência, a operação apura desvios de recursos que tiveram captação autorizada pela Lei Rouanet, dispositivo pelo qual a União incentiva projetos culturais.
Os investigadores afirmam que, além de casos de superfaturamento ou não execução das propostas, empresas pediam para captar dinheiro para iniciativas públicas, mas usavam os valores para eventos particulares - entre eles eventos corporativos e até um casamento.
Com a Lei Rouanet, quem colabora com projetos aprovados pode deduzir valores doados do Imposto de Renda - mesmo assim, a operação aponta que algumas dessas companhias acabavam recebendo de volta parte do que tinham investido.
Ao todo, 14 pessoas foram presas, todas produtores culturais.
De acordo com a Procuradoria paulista, as investigações começaram em 2014, após a Controladoria-Geral da União (englobada pelo governo Temer no Ministério da Transparência) enviar uma documentação apontando desvios relacionados a projetos autorizados a captar pela lei.
Embora as duas operações não tenham uma relação direta, a Lei Rouanet também está no radar da Lava Jato: um dos delegados da força-tarefa em Curitiba pediu ao governo dados sobre os 100 maiores beneficiados pelo dispositivo nos últimos dez anos.
bbc brasil

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