Caso Miguel: Ministério Público de Pernambuco denuncia Sari Corte Real à Justiça por abandono de incapaz com resultado de morte
Na denúncia, enviada nesta terça (14), promotor de Justiça incluiu artigos do Código Penal Brasileiro que agravam as penas por o crime 'ter sido contra criança em meio à conjuntura de calamidade pública'.
Sari Mariana Gaspar
Corte Real afirmou que fez tudo o que podia, ao ser questionada se sente
culpa ou arrependimento pela morte do menino Miguel Otávio Santana da
Silva, 5, que caiu do 9º andar de um prédio em Recife. Sari, que é
ex-patroa da mãe do menino, foi indiciada pelo crime de abandono de
incapaz com resultado morte. Em caso de condenação, o crime prevê de
quatro a 12 anos de prisão.... - Veja mais em
https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2020/07/05/caso-miguel-eu-sinto-que-fiz-tudo-que-podia-diz-sari-corte-real.htm?cmpid=copiaecol Na
denúncia, enviada nesta terça (14), promotor de Justiça incluiu artigos
do Código Penal Brasileiro que agravam as penas por o crime 'ter sido
contra criança em meio à conjuntura de calamidade pública'.
O Ministério Público de Pernambuco (MPPE) denunciou, nesta terça-feira (14), a primeira-dama de Tamandaré, Sari Corte Real, por abandono de incapaz com resultado de morte, combinado com artigos do Código Penal Brasileiro que agravam as penas por o crime "ter sido contra criança em meio à conjuntura de calamidade pública", na pandemia da Covid-19. Com isso, o inquérito sobre a morte de Miguel Otávio segue para a Justiça (veja vídeo acima).
Sari Corte Real estava responsável pelo menino de 5 anos quando ele, que é filho da sua ex-empregada doméstica, caiu do 9º andar de um prédio de luxo no Recife (veja vídeo abaixo). A mãe da criança, Mirtes Souza, havia saído do apartamento para passear com a cadela da família dos patrões.
O MPPE recebeu o inquérito policial no dia 3 de julho e tinha o prazo
de 15 dias para analisar os autos da investigação e tomar uma decisão.
Por meio do promotor de Justiça Criminal Eduardo Tavares, a denúncia foi
apresentada à 1ª Vara de Crimes contra a Criança e Adolescente da
Capital.
Procurada pelo G1, a defesa de Sari Corte Real informou, por telefone, que vai se pronunciar somente após ter acesso à denúncia do MPPE.
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Por meio de nota, o advogado de Mirtes Renata Souza afirmou que a mãe
de Miguel recebe "auspiciosamente a notícia do oferecimento da denúncia
pelo delito de abandono qualificado contra Sari Corte Real". A defesa de
Mirtes disse, ainda, que o empenho para dar celeridade aos processos de
natureza criminal do TJPE durante a situação de emergência sanitária da
Covid-19 "se refletirá, também, nos autos do processo criminal" em
questão".
Na segunda (13), parentes e amigos da família de Miguel fizeram uma passeata pelas ruas do Centro do Recife
para pedir que o Ministério Público de Pernambuco desse atenção ao
caso. O grupo saiu da Praça da República em direção ao MPPE, na Avenida
Visconde de Suassuna, em Santo Amaro, no Centro da capital.
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'Sari Corte Real acabou com a minha vida', disse Mirtes Renata, mãe do
menino Miguel, durante manifestação — Foto: Marina Meireles/G1
Justiça
Por meio de nota, o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) informou
que a denúncia contra Sari Corte Real seguiu para a 1ª Vara de Crimes
contra a criança e o Adolescente da Capital.
Ainda segundo o TJPE, o magistrado José Renato Bizerra terá dez dias
para informar se vai acatar a denúncia. Esse é o prazo regulamentar,
segundo a legislação em vigor. Caso ele aceite a denúncia, a ré será
citada para apresentar a defesa.
G1 PE
Recapitulando :
Miguel morreu depois de ficar aos cuidados da patroa de sua mãe, Sarí Côrtes Real | Foto: reprodução/Facebook
Em meio à pandemia mundial do coronavírus, Mirtes Renata Souza não pode fazer isolamento social. A empregada doméstica não foi dispensada por sua patroa, Sarí Gaspar Côrte Real. Nesta terça-feira (2/6), Mirtes precisou levar seu único filho, Miguel Otávio Santana da Silva, 5 anos, para o trabalho. Mas não voltou para casa com ele.A pedido da patroa, Mirtes foi passear com os cachorros da casa e deixou Miguel aos cuidados de Sarí. Imagens de um vídeo do circuito interno do prédio luxuoso em São José, centro do Recife, capital pernambucana, mostram que, minutos depois, Miguel e Sarí conversaram no elevador.
Ela foi presa em flagrante, mas, ao pagar fiança de R$ 20 mil, responderá em liberdade por homicídio culposo (quando não há intenção de matar), disse o delegado Ramon Teixeira, responsável pelo caso, em coletiva virtual de imprensa nesta quinta-feira (4/6).
O prédio de onde Miguel caiu é uma das “torres gêmeas”, encravadas em local de patrimônio histórico, entre diversas construções tombadas, e que foram levantadas debaixo de disputa judicial. Os dois espigões de alto luxo de 41 andares foram alvo de protesto e apagados do filme “Aquarius”, de Kleber Mendonça Filho, que tinha como um de seus temas justamente a especulação imobiliária promovida pela elite.
A historiadora Larissa Ibúmi, mestranda em história social da diáspora centro-africana, usou seu Instagram para chamar a atenção do componente racista da trágica morte de Miguel. “A história desse país de herança escravista (e esta história) mostra que, para essa patroa branca, uma criança negra não vale mais que seus cachorros. Hoje eu novamente tenho dificuldade de respirar pensando na mãe de Miguel e em todas as mães de crianças pretas nesse país”, escreveu.
Em entrevista ao G1 de Pernambuco, Mirtes lamentou a morte do filho: “Ela [Sarí] confiava os filhos dela a mim e a minha mãe. No momento em que confiei meu filho a ela, infelizmente ela não teve paciência para cuidar, para tirar [do elevador]. Eu sei, eu não nego para ninguém: meu filho era uma criança um pouco teimosa, queria ser dono de si e tudo mais. Mas assim, é criança. Era criança”.
Mirtes também contou que Miguel era uma criança cheia de sonhos. Queria ser jogador de futebol e policial. Seu aniversário de 5 anos trouxe a primeira paixão do menino: a bola.

“O caso é muito triste. Uma criança morta é uma tragédia irreparável. Não dá para expressar em palavras o sentimento de tristeza. Como técnica, não dá para gente ir para um lado punitivista. É um caso de homicídio culposo e ele é ainda mais complexo porque não se trata de uma ação. A pessoa não empurrou a criança, mas é uma conduta omissiva no sentido de não ter impedido essa criança”, explica.
Priscila explica como, judicialmente, a omissão pode ser configurada. “A mãe, ao deixar a criança com a patroa, passa a ela os cuidados. De forma negligente, ela [a patroa] deixa que essa ausência de cuidado gere o resultado morte”, continua a advogada.
Para Priscila, é perigoso pedir uma punição mais severa nesse caso, pois isso poderia prejudicar mães e trabalhadoras em outras ocasiões. “Quantas mães precisam trabalhar e deixam seus filhos sozinhos? A criança tem que pegar um elevador para ir para a escola [e se coloca] em risco. Temos que tomar muito cuidado porque, quando for a babá negra cuidando da criança, vão legitimar os discursos para homicídio doloso”, argumenta.
A negligência de Sarí e do prefeito Sérgio Hacker é anterior à morte de Miguel. Em 22 de abril, Hacker gravou um vídeo afirmando que ele e a esposa testaram positivo para a Covid-19. Mesmo assim, os trabalhos de Mirtes não foram dispensados. Ao G1, a doméstica confirmou que também foi infectada pelo coronavírus, assim como Miguel.
‘Coisificação da vida negra’
Após a morte de Miguel vir à tona, uma petição online, pedindo justiça, foi criada. Até o início da noite desta quinta-feira (4/6), o abaixo-assinado já reunia mais de 360 mil assinaturas.Diversas organizações e movimentos sociais se pronunciaram repudiando a morte do menino e destacando o componente racista dela. Um nota assinada por mais de 10 entidades, entre elas a Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, pediu justiça para o caso e destacou a negligência de Sarí. “Trata-se de evidente desprezo e coisificação da vida negra. Miguel morreu no dia em que a PEC das Domésticas completou cinco anos e esse aniversário da legislação de proteção das domésticas diz muito sobre nosso país que não superou sua herança escravagista e racista”.
O coletivo Pão e Tinta convocou ato para esta sexta-feira (5/6). “Mais uma vida negra perdida. Mais uma mãe negra chorando seu filho”, escreveu a organização.
A rapper Preta Rara usou seu Instagram para comentar o caso. Ela é historiadora e escreveu o livro “Eu, Empregada Doméstica”, lançado em 2019, com relatos de centenas de mulheres que, assim como ela, viveram situações de racismo e humilhação atuando como trabalhadoras domésticas no país.
“Quem liga pra vidas das pessoas pretas? As crianças pretas têm que se virar sozinhas desde muito cedo. Eu falo muito sobre as relações coloniais do trabalho doméstico. Hoje eu acordei lendo essa notícia e meu coração está despedaçado”, disse Preta na postagem.

Análise muito semelhante fez a historiadora Larissa Ibúmi ao se pronunciar sobre o caso em sua conta do Instagram. “Provavelmente, a maioria das pessoas brancas ditas antirracistas que participaram da ‘campanha’ blackout na terça, seja postando telas pretas em seus perfis, seja indicando e se propondo a dar visibilidade ao trabalho de pessoas negras, tenham pensado que isso geraria algum conforto, que a parte que lhes cabe nesse genocídio sistêmico estava compensada. Mas não existe trégua, o racismo não dá trégua”, lamentou Ibúmi.
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“Enquanto as redes estavam subindo as tags ‘blacklivesmatter’, perdemos mais uma criança negra para o racismo enraizado neste país, para a desumanização de pessoas negras. Dessa vez não foi a PM, o braço do estado. Mas ainda foram as mesmas estruturas coloniais, aquelas que mantém mulheres negras à serviço da elite branca, as sinhás. Uma mulher branca manda sua empregada doméstica passear com o cachorro enquanto faz as unhas”, continuou.
Outro lado
A reportagem procurou Sarí Gaspar Côrte Real e Sérgio Hacker por meio da Prefeitura de Tamandaré (PE), mas não obteve retorno até o momento de publicação.https://ponte.org/miguel-menino-negro-e-filho-de-empregada-domestica-morreu-por-negligencia-da
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