Brasil registra 3,6 milhões de casos de covid-19 e 114,7 mil mortes
Número de recuperados já soma mais de 2,7 milhões
O
Ministério da Saúde informou neste domingo (23) que o Brasil está com
um total de 3.605.783 casos confirmados de covid-19 desde o início da
pandemia. Entre ontem (22) e hoje, foram notificadas pelas secretarias
de saúde dos estados e municípios mais 23.421 pessoas diagnosticadas com
o novo coronavírus. O número total de óbitos pela doença é de 114.744,
sendo que 494 foram registrados nas últimas 24 horas.
As estatísticas são menores aos domingos e
segundas-feiras em razão da dificuldade de registro dos dados pelas
secretarias de saúde aos fins de semana. Já às terças-feiras há
tendência de números maiores em função do acúmulo de registros que são
enviados ao sistema do Ministério da Saúde.
A atualização do Ministério da Saúde
registrou ainda 752.004 pessoas em acompanhamento e outras 2.739.035 que
já se recuperaram da doença.
A taxa de letalidade (número de mortes pelo
total de casos) ficou em 3,2%. A mortalidade (quantidade de óbitos por
100 mil habitantes) atingiu 54,6. A incidência dos casos de covid-19 por
100 mil habitantes é de 1715,8.
Covid-19 nos estados
Os estados com mais mortes são São Paulo
(28.467), Rio de Janeiro (15.292), Ceará (8.289), Pernambuco (7.390) e
Pará (6.057). As unidades da federação com menos óbitos são Roraima
(579), Tocantins (585), Acre (600), Amapá (631) e Mato Grosso do Sul
(738).
Já em número de casos confirmados, o
primeiro lugar também é ocupado por São Paulo (754.129), mas seguido de
Bahia (236.050), Rio de Janeiro (210.948), Ceará (205.441), Minas Gerais
(194.614) e Pará (189.289). Entre os estados com menor número de casos
registrados, aparecem: Acre (23.719), Amapá (41.120), Roraima (41.730),
Mato Grosso do Sul (42.498), Tocantins (43.596) e Rondônia (51.421).
Do cultivo ao aterro, desperdício de comida emite mais gases nocivos do que a maioria dos países
Evitar o desperdício de alimentos pode reduzir sua pegada de carbono
Quanto de comida
você deixou no prato na sua última refeição? Algumas migalhas? Aquela
salada meio murcha? Ou, quem sabe, até umas boas garfadas, já que você
estava empanturrado demais para raspar o prato?
Vale a pena
lembrar, então, que toda vez que você joga restos de comida fora, não
está apenas descartando o almoço do dia seguinte — cada garfada foi
responsável por emissões de gases de efeito estufa antes mesmo de chegar
ao seu prato.
O cultivo, o processamento, a embalagem e o
transporte dos alimentos que ingerimos contribuem para a mudança
climática. E depois que jogamos fora, liberam ainda mais gases de efeito
estufa na atmosfera à medida que apodrecem.
Estima-se que, se o
desperdício de alimentos fosse um país, seria o terceiro maior emissor
de gases de efeito estufa depois dos Estados Unidos e da China, segundo a
Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, na
sigla do inglês).
Um terço das emissões de gases do
efeito estufa no mundo é proveniente da agricultura, e 30% dos alimentos
que produzimos são desperdiçados — cerca de 1,8 bilhão de toneladas por
ano. Se, como planeta, parássemos de desperdiçar comida como um todo,
eliminaríamos 8% de nossas emissões totais.
É claro que as famílias individualmente não são responsáveis por todo
esse desperdício. Um estudo de 2018 mostrou, por exemplo, que cerca de
um terço das frutas, legumes e verduras é descartado por ser do tamanho
ou formato errado antes mesmo de chegar às prateleiras dos
supermercados.
Direito de imagemGetty Images / Javier HirschfeldNunca foi tão fácil comprar comida, mas mais de um terço dos alimentos produzidos é desperdiçado
Os lugares em que os alimentos são mais
desperdiçados diferem em todo o mundo. Em países de baixa renda, 40% dos
alimentos são desperdiçados após a colheita, mas antes de chegar às
dispensas das pessoas, geralmente devido à falta de infraestrutura
adequada.
Mas nos países de média e alta renda, os consumidores
assumem uma parcela maior da culpa: estimativas sugerem que as famílias
são responsáveis por 53% do desperdício de comida na Europa; e por 47%,
no Canadá.
As razões para esse desperdício também podem variar —
em algumas partes do mundo, é considerado educado deixar uma pequena
quantidade de comida no prato para mostrar que o anfitrião não
economizou nas porções. A falta de refrigeração é outra grande causa de
desperdício.
Mas em muitos países desenvolvidos, o fácil acesso a
uma oferta abundante de produtos baratos levou os consumidores a serem
menos zelosos em relação ao que guardam na geladeira e colocam no prato.
Direito de imagemGetty Images / Javier HirschfeldImage caption
Jogar fora 3 kg de alimentos resulta na emissão de
gases de efeito estufa equivalentes a 23 kg de dióxido de carbono na
atmosfera
Porém, quantificar exatamente o quanto de comida
estamos desperdiçando a nível doméstico não é fácil. Kate Parizeau,
professora da Universidade de Guelph, no Canadá, realizou um estudo em
parceria com seus colegas que envolveu vasculhar todo o lixo gerado por
94 famílias que moravam em Guelph, na província de Ontário.
Eles
categorizaram os alimentos que encontraram com base na quantidade e em
quão próprio para consumo estavam. E descobriram que cada família jogava
fora cerca de 3 kg de resíduos de alimentos por semana que poderiam ser
evitados, o equivalente a 23,3 kg de emissões de carbono.
No
Reino Unido, as estatísticas são semelhantes — 68 kg de alimentos são
desperdiçados nos domicílios a cada ano por pessoa, de acordo com dados
de 2020 da organização britânica antidesperdício Wrap.
Mas poucos
estudos realmente optam por analisar a fundo nossas latas de lixo. E
quando as pessoas são solicitadas a registrar o que desperdiçam
diariamente, elas tendem a subnotificar o que estão jogando fora.
"Não
acho que as pessoas estejam completamente conscientes [dos impactos
climáticos do desperdício de alimentos]", diz Mattias Eriksson, que
pesquisa o desperdício de alimentos na Universidade de Ciências Agrárias
da Suécia, em Uppsala.
"Mas acho que o problema é ainda maior,
porque a maioria das pessoas, na verdade, não desperdiça comida, de
acordo com elas mesmas."
A falta de dados precisos não deve nos impedir, no entanto, de tentar resolver o problema, acrescenta Parizeau.
"Sabemos
apenas pelas inspeções que fizemos, que é desmedido", diz ela. "Há
muita comida própria para o consumo que acaba no lixo."
Só de
simplesmente repensar a forma como você compra e prepara os alimentos,
pelo menos na maioria dos países de alta renda, pode ser possível
reduzir a quantidade que desperdiçamos — e, assim, diminuir nossa
contribuição para a mudança climática.
"Sabemos que há um monte de coisas que podemos fazer a nível doméstico", afirma Parizeau.
Direito de imagemGetty Images / Javier HirschfeldImage caption
Em vez de ir ao mercado antes de preparar cada
refeição, por que não consumir os alimentos que ainda estão na geladeira
para reduzir o desperdício?
Anne-Marie Bonneau, editora de livros na Califórnia e
autora do blog Zero Waste Chef, começou a pensar seriamente no
desperdício de comida depois de saber que até 40% dos alimentos
produzidos nos EUA não são consumidos.
"Fiquei de queixo caído", diz ela.
Agora,
Bonneau estima que tenha reduzido o desperdício de comida a quase zero,
fazendo compostagem com restos de folhas de chá, cascas de ovos e de
frutas – e usando todo o resto.
“Tento manter nosso estoque
pequeno o suficiente para não jogar comida fora, e grande o bastante
para termos comida suficiente para comer”, explica.
"Se eu não conseguir fazer algo antes de estragar, eu congelo."
Não
é fácil atingir esse nível de redução de resíduos, mas Bonneau
recomenda começar com alguns passos simples. Se você ainda não sabe
cozinhar, diz ela, aprenda a fazer refeições simples, como sopas. Em
seguida, cheque o que você tem em casa antes de comprar os ingredientes.
"Em vez de navegar na internet em busca de receitas apetitosas
ou folhear livros de culinária, primeiro dê uma olhada na comida que
você tem em mãos", diz ela.
Direito de imagemGetty Images / Javier HirschfeldImage caption
A carne representa uma proporção menor de alimentos
jogados fora, mas é responsável por mais emissões de carbono
Essa sugestão também é respaldada por pesquisas.
"Verificar o que você tem na dispensa é uma grande coisa", reforça Parizeau.
“Muitas
vezes as pessoas têm hábitos regulares de compra. Você vai ao mercado e
compra um pacote de pão toda semana — mas talvez ainda tenha um pouco
no freezer."
Segundo ela, outra maneira eficaz de reduzir o
desperdício de alimentos é se planejar com antecedência. Quando as
pessoas fazem listas de compras e programam as refeições, "parece haver
uma relação com a quantidade de desperdício de alimentos" que elas
geram.
Uma vez que você se habitue a consumir o que já tem em
casa, pode economizar não apenas nas emissões de carbono, mas
potencialmente também em tempo e dinheiro, evitando a necessidade de ir
ao mercado sempre que for preparar o jantar.
"É tão gratificante quando faço uma refeição a partir de quase nada", diz Bonneau.
Evidentemente, para alguns de nós, cozinhar do zero e até mesmo administrar a comida que já está na geladeira não é tão fácil.
"Sabemos que há muitas razões pelas quais as pessoas não conseguem reduzir o desperdício de alimentos", afirma Parizeau.
Algumas
pessoas querem proporcionar fartura para suas famílias com uma
geladeira cheia, outras podem ser excessivamente cautelosas quando se
trata de segurança alimentar e descartar os alimentos que julgam estar
passados. E há aquelas que simplesmente têm dificuldade de encontrar
tempo para planejar as refeições.
Para driblar alguns destes
obstáculos, Parizeau participou recentemente da elaboração de um livro
de receitas para reduzir o desperdício de alimentos.
As receitas
usam, por exemplo, uma couve-flor inteira, em vez de metade, para
evitar que as pessoas fiquem com restos de alimentos na geladeira, que
vão acabar ficando feios e sendo jogados no lixo. Outras receitas podem
ser adaptadas aos legumes e verduras que você tem à mão.
Mas nem todo desperdício de alimentos é igual quando se trata de emissões de carbono.
As
emissões de carbono das carnes e dos laticínios, por exemplo, são muito
mais altas do que as das frutas e dos legumes. Portanto, reduzir a
quantidade de carne que você joga fora terá um impacto maior do que
diminuir o desperdício de cenoura.
Um estudo de 2018 mostrou, por
exemplo, que legumes e verduras frescos correspondem a 25% do
desperdício doméstico de alimentos no Reino Unido, mas representam
apenas 12% das emissões de gases de efeito estufa provenientes de
alimentos desperdiçados.
Por outro lado, peixes e carnes são responsáveis por apenas 8% do desperdício de alimentos, mas por 19% das emissões.
Da
mesma forma, um estudo de 2015 realizado em supermercados suecos
constatou que, embora o departamento de frutas e legumes tenha sido
responsável por 85% dos alimentos desperdiçados durante um período de
três anos, esses alimentos representam apenas 46% da pegada de carbono
total de alimentos desperdiçados.
Já a carne corresponde a 3,5% do total de alimentos descartados, mas é responsável por 29% da pegada de carbono.
"Se você deseja reduzir a pegada de carbono, a carne bovina é o verdadeiro alvo", diz Eriksson.
"São emissões superconcentradas, ou seja, você tem uma emissão muito alta em poucos quilos de alimento desperdiçado."
Com isso em mente, vale lembrar que o consumo e desperdício andam de mãos dadas, acrescenta o especialista.
"Se você consome muito, provavelmente também desperdiça mais desse produto", afirma.
"Um vegetariano não desperdiçará carne, por exemplo, por razões óbvias."
A
forma como você descarta os alimentos também é importante. Quando a
matéria orgânica entra em decomposição em um aterro sanitário, ela
libera metano, gás do efeito estufa cerca de 20 vezes mais potente que o
dióxido de carbono.
Mas se você fizer a compostagem do lixo
orgânico em uma lixeira bem conservada que permita a entrada de
oxigênio, reduzirá significativamente a quantidade de metano liberado na
atmosfera – e o carbono do composto orgânico será mantido no adubo
natural resultante.
Um estudo estimou que as emissões de gases de
efeito estufa a partir da compostagem correspondem a apenas 14% dos
mesmos alimentos despejados em aterros sanitários.
E a pesquisa
conduzida por Mattias mostrou que as emissões variam dependendo dos
alimentos — mas que a compostagem do pão, por exemplo, liberaria apenas
2,2% das emissões de descartá-lo em aterros sanitários.
O Project
Drawdown, organização de pesquisa que identifica possíveis soluções
para as mudanças climáticas, estima que se os níveis de compostagem
aumentarem em todo o mundo, seríamos capazes de reduzir as emissões em
2,1 bilhões de toneladas até 2050.
"A alternativa mais acessível no sistema alimentar é deixar de usar os aterros sanitários", diz Eriksson.
“Compostagem doméstica, digestão anaeróbia, incineração, o que quer que você faça, tudo é melhor do que aterro sanitário.”
Embora
haja diferenças ambientais entre esses outros métodos de eliminação de
resíduos, a magnitude é muito menor. Portanto, se suas sobras de comida
vão parar atualmente na lixeira, vale a pena refletir se você pode mudar
esse hábito.
Direito de imagemGetty Images / Javier HirschfeldImage caption
A compostagem do lixo orgânico pode reduzir a quantidade de metano liberado na atmosfera
O Reino Unido, por exemplo, estabeleceu uma meta
para oferecer coleta semanal de resíduos alimentares até 2023 — e muitas
autoridades locais já fazem isso para reduzir a quantidade de alimentos
que acabam em aterros sanitários.
Em alguns países, como na Dinamarca, o envio de lixo orgânico para aterros sanitários já está proibido.
Ainda
assim, a principal mudança que a maioria das pessoas nos países de alta
renda poderia adotar, antes de qualquer coisa, é parar de comprar tanta
comida, sugere Eriksson.
Por fim, a redução na demanda pode nos
levar a um sistema em que não serão produzidos mais alimentos além do
que de fato precisamos.
"Para a maioria das pessoas, pelo menos
no mundo ocidental, reduzir o consumo será uma forma de contribuir de
verdade", acrescenta Eriksson.
"É o nosso consumo que leva a todo esse problema."
Se a sua contribuição parece insignificante diante do problema, não pense em suas ações isoladamente.
"À
medida que as pessoas começam a se importar mais com o desperdício de
alimentos em casa, elas se tornam cidadãos mais conscientes", diz
Parizeau. "Começam a fazer perguntas sobre como o sistema alimentar
funciona e a solicitar regulamentação para reduzir o desperdício em todo
o sistema."
Pode demandar algum esforço, mas reduzir a quantidade de comida que você joga fora pode ter um impacto real no planeta.
Os bastidores da ‘Operação Gideon’, a fracassada missão suicida para capturar Nicolás Maduro na Venezuela
Militares venezuelanos disseram que capturaram mercenários após o golpe fracassado
No
domingo, dia 3 de maio de 2020, o governo de Nicolás Maduro anunciou que
as forças armadas da Venezuela haviam desbaratado uma incursão armada. A
Operação Gideon foi uma tentativa de golpe completamente fracassada.
Mas o que levaria exilados venezuelanos e ex-soldados das Forças
Especiais dos Estados Unidos a aderirem a um plano que, desde o início,
parecia uma missão suicida?
É uma história que salta diretamente de um manual do século 20 de conspirações latino-americanas.
"Fez
a Baía dos Porcos parecer o Dia D", brincou um comentarista,
referindo-se à invasão fracassada da Cuba de Fidel Castro, financiada
pelos Estados Unidos, em 1961. A Operação Gideon é um conto
impressionante de arrogância, incompetência e traição.
Oito
homens foram mortos pelas forças armadas da Venezuela na cidade costeira
de Macuto. Dezenas de outras pessoas foram capturadas e permanecem
presas em Caracas. Menos de um punhado escapou. E coincidindo com o auge
da pandemia de coronavírus, isso diminuiu a atenção recebida pelo
episodio.
No centro da missão fracassada estava um ex-soldado das Forças Especiais dos EUA, Jordan Goudreau.
Print de um vídeo promocional da Silvercorp mostrando Jordan Goudreau
Médico, atirador, veterano do Afeganistão e do
Iraque e ganhador de três medalhas da Estrela de Bronze, Goudreau acabou
entrando em uma situação fora de controle.
"Um ousado ataque
anfíbio foi lançado da fronteira com a Colômbia", anunciou ele em um
vídeo amplamente distribuído, publicado horas depois de seu início.
"Nossos homens continuam lutando agora... Nossas unidades foram ativadas
no sul, oeste e leste da Venezuela."
Não era verdade. Alguns apoiadores na Venezuela podem ter sido
avisados, mas a Operação Gideon — batizada em homenagem a um personagem
bíblico que triunfou sobre um exército muito maior — consistia em menos
de 60 homens mal armados e uma mulher. E, na realidade, a operação já
havia se transformado em um caos sangrento.
Em 2018, Jordan Goudreau fundou a Silvercorp USA,
uma empresa de segurança privada. Sua conta no Instagram é uma mistura
de imagens de proezas militares e de Goudreau correndo em uma esteira.
Em
fevereiro de 2019, ele foi contratado para fazer a segurança para um
show patrocinado por Richard Branson, no lado colombiano da fronteira
com a Venezuela. O objetivo do show foi pressionar Nicolás Maduro a
permitir a ajuda humanitária na Venezuela, onde uma economia em queda
livre, violência, fome e o colapso dos serviços básicos forçaram milhões
ao exílio na Colômbia.
"Controlando o caos na fronteira com a
Venezuela, onde um ditador observa com apreensão" foi a legenda que
Goudreau escreveu no vídeo que publicou na conta do Instagram da
Silvercorp. Por "ditador" ele quis dizer Nicolás Maduro.
Direito de imagemSilvercorpImage caption
Um vídeo promocional da Silvercorp mostra Goudreau em várias funções de segurança
Foram dias quase felizes para a oposição política fragmentada e conflituosa da Venezuela.
Um
mês antes do show em Caracas, Juan Guaidó se declarou presidente
interino da Venezuela. Em um desafio direto a Nicolás Maduro, mais de 50
nações o reconheceram, incluindo os Estados Unidos.
Guaidó
esperava que o comboio de ajuda patrocinado pelo show de Branson
ajudasse a levá-lo ao poder, mas foi bloqueado na fronteira em meio a
cenas violentas. Uma tentativa de rebelião no final de abril também
resultou em nada. Assim, os apoiadores de Guaidó começaram a considerar a
remoção de Maduro em uma operação militar cirúrgica.
Juan Guaidó durante discurso
O primeiro campo de treinamento foi montado na cidade colombiana de Maicao, em j
"Tínhamos
homens entrando em forma, ganhando conhecimento. Mas tínhamos muitas
dificuldades econômicas — às vezes só podíamos fornecer duas refeições
por dia, não três", disse um membro exilado do Parlamento venezuelano,
Hernan Aleman, à BBC antes de morrer por covid-19 no início deste mês.
"Coletamos dinheiro onde podíamos — vendi meu carro e meu apartamento."
Era
uma conspiração que precisava desesperadamente de dinheiro. Entra em
cena Jordan Goudreau. De volta aos EUA, já havia feito contato com a
oposição da Venezuela.
Em uma viagem à Colômbia em julho, Goudreau
foi apresentado ao general Cliver Alcala, o fundador do campo de
treinamento, que havia sido próximo ao antecessor de Maduro, Hugo
Chávez, mas depois se desentendeu com Maduro e foi para o exílio. Os
dois machos alfa uniram forças.
General Cliver Alcala, fundador do campo de treinamento, havia sido próximo ao antecessor de Maduro, Hugo Chávez
"Conversamos sobre o plano — uma operação tática
para capturar os grandes players da Venezuela que seriam entregues aos
Estados Unidos. Juan Guaidó assumiria o mandato como presidente
interino, levando a eleições livres na Venezuela", lembrou Hernan
Aleman.
Jordan Goudreau disse que poderia cuidar das finanças, e
novas reuniões foram realizadas em Miami. Desta vez, com a comissão
presidencial de Juan Guaidó, um órgão encarregado de explorar
secretamente maneiras de depor Maduro.
"Pesquisamos 22 cenários...
talvez um terço deles envolvesse o uso da força", disse J J Rendon, um
estrategista político venezuelano de extrema direita radicado na Flórida
e membro da comissão presidencial.
Direito de imagemGetty ImagesImage caption
"Pesquisamos 22 cenários... talvez um terço deles envolvesse o uso da força", disse J J Rendon
"Não falamos com nenhum outro grupo militar (exceto a
Silvercorp), mas os observamos muito, com certeza. Chegamos até a
observar a Legião Estrangeira."
Goudreau disse que tinha
patrocinadores de negócios — pessoas que investiriam na operação militar
no entendimento de que colheriam os frutos econômicos sob um governo
liderado por Guaidó na Venezuela. Um contrato foi assinado no dia 16 de
outubro de 2019 para uma operação "para capturar/ deter/ remover Nicolás
Maduro, derrubar o regime atual e instalar o reconhecido presidente
venezuelano Juan Guaidó".
Direito de imagemReutersImage caption
O presidente da Venezuela, Nicolas Maduro, durante entrevista coletiva virtual em Caracas
Goudreau receberia adiantamento de US$ 1,5 milhão
(R$ 8 milhões) e mais tarde receberia mais de US$ 200 milhões (R$ 1,07
bilhão).
Entre aqueles que conheciam o plano secreto, houve euforia.
"Durante
anos estivemos sozinhos, com nossos próprios recursos e sem apoio de
qualquer sistema político", diz Javier Nieto, ex-capitão da guarda
nacional da Venezuela, que já foi acusado de conspirar para assassinar
Hugo Chávez e foi preso.
"Mas, desta vez, fiquei muito animado
porque o plano foi feito com o apoio de homens como J J Rendon, Juan
Guaidó e sua equipe estratégica."
No entanto, em poucos dias,
disentendimentos vieram à tona. Jordan Goudreau exigiu o US$ 1,5 milhão
(R$ 8 milhões). A comissão queria ver evidências de seus apoiadores
primeiro. O ex-soldado das Forças Especiais não conseguiu produzir
nenhuma, e uma reunião na casa de J J Rendon à beira-mar em Miami
terminou mal.
Direito de imagemSilvercorpImage caption
Vídeo promocional no site da Silvercorp
aparentemente mostrando Goudreau fornecendo segurança em um comício de
Trump
"Ele ficou mal-humorado e desrespeitoso", diz Rendon, referindo-se a Goudreau.
"Nossa
última reunião, em 8 de novembro do ano, passado foi muito, muito
desconfortável. Então eu disse: 'Isso não vai a lugar nenhum. Quero que
você saia das minhas instalações.'"
Mesmo assim, ele pagou a Goudreau US$ 50 mil (R$ 268 mil) — para cobrir despesas, diz ele.
Para
a comissão presidencial de Juan Guaidó, o acordo se tornara nulo. Mas
para Goudreau e os que estavam nos campos de treinamento colombianos —
agora eram três — ele ainda estava bem vivo.
Em janeiro de 2020,
dois ex-soldados das forças especiais dos EUA recrutados por Goudreau
chegaram à Colômbia — um deles era Luke Denman, um veterano do Iraque,
que havia treinado novamente para ser mergulhador, mas que teve
dificuldade em deixar a vida militar para trás.
Image caption
Luke Denman, veterano do Iraque, havia treinado
novamente para ser mergulhador, mas tinha dificuldade em deixar a vida
militar para trás.
"Eu acho que ele realmente sentia falta daquele
vínculo estreito com as pessoas com quem trabalhava porque eles vivem,
dormem, respiram juntos e confiam um no outro com suas vidas. Jordan era
o médico da equipe, e Luke via aqueles homens como seus irmãos — ele
confiava totalmente neles", diz Sarah Blake, irmã de Denman.
"Nós
apenas sabemos que Jordan ligou para Luke e deve tê-lo convencido de que
isso era algo importante e que realmente faria diferença na vida dos
venezuelanos. Luke ligou para meu pai e disse que estava aceitando um
emprego, e que era a coisa mais significativa que ele faria."
Sarah Blake acredita que seu irmão — agora numa prisão em Caracas — foi enganado por Jordan Goudreau.
"Luke disse ao meu irmão que esta era uma missão apoiada pelo governo dos EUA", conta ela.
Image caption
Airan Berry, outro ex-soldado norte-americano,
também compartilharia da crença de que a operação era coordenada pelo
governo dos EUA, o que era mentira.
Segundo diversas fontes, essa era uma crença
compartilhada pelos venezuelanos nos campos e por outro ex-soldado
norte-americano, Airan Berry. Mas era mentira.
Em março de 2020, a
operação ainda não tinha um respaldo financeiro sólido. E embora os
dois americanos tenham se juntado à missão, até 20 venezuelanos já a
haviam abandonado.
Alguns acharam a vida no campo muito onerosa,
outros temiam que todo o empreendimento tivesse sido infiltrado por
partidários de Maduro. Foi então que as coisas começaram a dar muito
errado.
Em 23 de março, as autoridades colombianas apreenderam um
caminhão com equipamentos militares, incluindo fuzis de assalto. Três
dias depois, o Departamento de Justiça dos EUA indiciou o general Cliver
Alcala, acusando-o de narcoterrorismo, e colocou uma recompensa de US$
10 milhões (R$ 53 milhões) pela cabeça dele. Ele se entregou depois de
recorrer às redes sociais para declarar as armas capturadas como
propriedade do povo venezuelano "no âmbito do acordo feito pelo
presidente Juan Guaidó, JJ Rendon e assessores dos Estados Unidos" — uma
referência ao contrato que a comissão de Guaidó dissera por meses ter
sido abandonada.
Hernan Aleman disse à BBC que sentiu cheiro de
problemas. Alcalá foi indiciado, pensou, "para a nossa ação — a operação
— fracassar".
Várias fontes sugeriram que as autoridades
colombianas e americanas ficaram nervosas com a existência dos campos.
Eles pensaram que com Alcalá fora de cena, os homens em treinamento se
dispersariam. Mas eles ficaram. E com a saída de Alcalá, Antonio Sequea —
um ex-capitão da Guarda Nacional, que havia trabalhado na
contra-inteligência nos mais altos escalões dentro da Venezuela —
assumiu a liderança da operação.
Então, onde estava Jordan Goudreau? Não na Colômbia…
"Em 28 de março de 2020, nosso centro de resgate e
coordenação localizado em Curaçao recebeu um pedido de socorro de
algumas pessoas em uma embarcação de recreio que precisavam de ajuda.
Enviamos nosso avião para o local imediatamente", disse Shalick Clement,
porta-voz da Guarda Costeira Holandesa do Caribe.
O barco se
chamava Silverpoint, e reportagens da imprensa sugerem que era
propriedade da empresa de Jordan Goudreau, a Silvercorp USA. Mas o avião
holandês não era necessário — a Guarda Costeira de Miami já havia
instruído um navio-tanque de passagem para pegar os dois cidadãos
americanos e levá-los para os Estados Unidos. Jordan Goudreau era um
deles? O Silverpoint estava carregando armas para a Colômbia quando
quebrou? A Guarda Costeira de Miami encaminhou todas as questões sobre o
incidente ao FBI (polícia federal americana). O FBI não quis comentar o
caso. Não se sabe onde o barco foi parar.
Pelo que sabemos,
Jordan Goudreau não voltou a viajar para a Colômbia — a pandemia o
reteve em Miami. Mas se Goudreau fosse um dos homens forçados a pegar
uma carona naquele navio-tanque, a sentença de morte da Operação Gideon
provavelmente soou no mesmo dia. Não porque esse veterano atirador de
primeira — um homem que se autodenominava um lutador pela liberdade —
não estivesse lá para liderar suas tropas. Mas por causa de uma bomba
que caiu na Venezuela.
No dia 28 de março, em seu programa de TV
semanal, Diosdado Cabello — o número 2 da Venezuela depois de Nicolas
Maduro — fez revelações chocantes. Ele apresentou uma visão abrangente
dos campos de exilados na Colômbia, com os nomes de muitos dos
venezuelanos e dos três americanos envolvidos.
A operação havia sido estourada.
Mas
agora os homens e uma mulher que suportaram as condições austeras do
acampamento mudaram de local. Eles estavam em uma parte remota da costa
de Guajira, na fronteira com a Venezuela — uma terra de cactos, areia e
arbustos desérticos.
Eles sabiam que o governo de Nicolás Maduro
tinha informações sobre a conspiração? Os venezuelanos são algumas das
pessoas mais conectadas do planeta, mas aparentemente apenas os
responsáveis tinham acesso a celulares. Uma fonte disse que o
comandante, Antonio Sequea, estava ciente da denúncia de Cabello na TV e
de outros comentários feitos pelos ministros de Nicolás Maduro sobre a
conspiração, mas garantiu aos apoiadores nos Estados Unidos que tinha
tudo sob controle.
Jordan Goudreau sabia que a operação estava
comprometida? Isso não está claro. Nenhum dos americanos falava
espanhol. Uma fonte disse que Luke Denman e Airan Berry tinham um
telefone via satélite na Colômbia. E eles mantiveram contato com
Goudreau, que continuou a dizer-lhes que mais veteranos dos Estados
Unidos chegariam para reforçar a missão.
Se Goudreau sabia que o
governo de Nicolás Maduro era bem informado, talvez não tenha contado a
seus amigos. Fontes dizem que ele estava distraído por problemas
financeiros: ele ainda devia cerca de US$ 30.000 (R$ 160 mil) pelas
armas que haviam sido capturadas pelos colombianos. E, no final de
abril, os advogados dele enviaram uma carta à comissão americana de Juan
Guaidó, mais uma vez exigindo o pagamento daquele pagamento de US$ 1,5
milhão (cerca de R$ 8 milhões).
De qualquer forma, quer os
combatentes soubessem ou não que os detalhes da Operação Gideon haviam
chegado às mãos do governo de Maduro, o plano, conforme foi finalizado,
parecia totalmente imprudente. Segundo fontes próximas à missão, mas não
parte dela, depois de desembarques anfíbios na costa da Venezuela, os
homens passariam alguns dias antes de se mudarem secretamente para
Caracas. Na capital, eles voltariam a se esconder antes de se preparar
para ataques aos alvos: o Palácio presidencial de Miraflores, cadeias
militares para libertar detentos e o SEBIN — o quartel-general do
Serviço de Inteligência da Venezuela.
O objetivo era capturar Nicolás Maduro e seus homens mais próximos. O que poderia dar errado? No final das contas, quase tudo.
Na
sexta-feira, 1º de maio, às 18h, um barco com 11 homens deixou a costa
da Colômbia com destino à Venezuela — eles carregavam oito fuzis. Dez
minutos depois, um segundo navio, com 47 a bordo e apenas dois fuzis,
partiu para o Mar do Caribe. Em uma hora, um de seus motores falhou. E
ainda havia muito mais horas para suportar — o mar estava agitado, os
homens, enjoados.
Image caption
Luke e Airan depois de serem capturados; segundo
fontes próximas à missão, mas não parte dela, depois de desembarques
anfíbios na costa da Venezuela, os homens passariam alguns dias antes de
se mudarem secretamente para Caracas. Na capital, eles voltariam a se
esconder antes de se preparar para ataques aos alvos: o Palácio
presidencial de Miraflores, cadeias militares para libertar detentos e o
SEBIN — o quartel-general do Serviço de Inteligência da Venezuela.
Na cidade costeira de Macuto, as forças armadas de
Nicolás Maduro aguardavam o primeiro barco na madrugada de domingo, dia 3
de maio — com consequências mortais para oito dos homens a bordo.
O
segundo navio estava quilômetros atrás. E agora o combustível estava
perigosamente baixo. Decidiu-se deixar a maioria dos homens em terra
para tentar a sorte na fuga. O resto — incluindo o comandante, Antonio
Sequea, e os dois americanos — permaneceram a bordo e logo foram
detidos.
A Operação Gideon foi batizada de "Baía dos Porquinhos"
por alguns comentaristas; outros a descreveram como "bizarra" e
"loucura". O militar Javier Nieto poderia explicar por que esses
exilados venezuelanos corriam o risco de quase morte ou captura?
"Talvez
eles quisessem morrer tentando alguma coisa. Se eles ficassem na
Colômbia, não havia trabalho — eles não tinham dinheiro para sobreviver.
Então, talvez tivessem que entrar para a guerrilha ou para um grupo de
narcotráfico", diz ele.
"Parece loucura, mas no meio desse
desespero, presumo que 60% ou 70% pensaram: 'Ok, prefiro ficar na prisão
na Venezuela do que na Colômbia com um desses grupos.'"
Isso não
explicaria por que dois ex-soldados das forças especiais dos EUA,
altamente treinados, subiram naquele barco em uma missão para "libertar"
um país que não era deles.
Direito de imagemGetty ImagesImage caption
Carteira de identidade de pessoas ligadas à operação, apresentada por Maduro em entrevista coletiva
O que aconteceu com o homem que os arrastou para esse desastre, Jordan Goudreau?
No
dia 3 de maio, horas depois de gravar seu vídeo referindo-se às
unidades que supostamente haviam sido ativadas em todo o país, e quando
já estava claro que o ataque tinha sido um desastre, ele foi à estação
de TV digital dos Estados Unidos, Factores de Poder, e revelou detalhes
do acordo que ele fez com a comissão presidencial de Juan Guaidó,
alegando que ainda era válido, e que Guaidó tinha assinado.
"Eu tenho áudio, sabe... Eu tenho uma gravação da transação real entre o presidente Guaidó e mim", disse ele.
Juan Guaidó negou que fosse sua voz na fita e disse que nunca havia falado com Goudreau, ou assinado qualquer contrato.
Poucas horas após a desastrosa Operação Gideon, a
oposição da Venezuela afirmou que era uma operação de "bandeira falsa" —
um exercício de propaganda patrocinado e controlado pelo governo de
Nicolás Maduro.
"Isso é realmente uma piada", disse Jorge Arreaza, ministro das Relações Exteriores de Nicolás Maduro.
"Essa
é uma forma de a oposição se esquivar de suas responsabilidades.
Fizeram tantas coisas nos últimos 20 anos — agressões de todos os tipos,
e nunca se responsabilizam pelo que fazem. Sempre dizem que foi o
regime, foi a ditadura, o tirano."
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"Isso é realmente uma piada", disse Jorge Arreaza,
ministro das Relações Exteriores de Nicolás Maduro. "Essa é uma forma de
a oposição se esquivar de suas responsabilidades. Fizeram tantas coisas
nos últimos 20 anos — agressões de todos os tipos, e nunca se
responsabilizam pelo que fazem", afirmou.
Então, quem traiu o bando de invasores? Algumas
especulações giravam em torno de Antonio Sequea, o comandante que
substituiu o general Cliver Alcala depois que ele se entregou e foi
levado de avião para os Estados Unidos. Mas um exilado com conexões nos
campos da Colômbia, que não quis ser identificado, tem dúvidas.
"Sabíamos
que Sequea costumava ser bem relacionado com o regime, o que o torna
suspeito. Mas o primo dele morreu naquele primeiro barco em Macuto. Ele
teria sacrificado um membro da família? Isso seria tão mau..."
Jorge Arreaza também nega que Sequea trabalhe para o governo de Maduro.
"É tudo mentira", diz ele.
"Não
foram os agentes venezuelanos que nos deram informações sobre os
campos. Foram vários militares colombianos porque não queriam uma guerra
entre a Colômbia e a Venezuela".
Direito de imagemReutersImage caption
Membros das forças especiais da Venezuela após o fracasso da missão em Macuto
A política venezuelana está febril e completamente
polarizada. Em alas da oposição, algumas pessoas acreditam ser possível
que Jordan Goudreau tenha se vendido a Nicolás Maduro.
"Como pode
um mercenário americano que foi pago para matar Maduro estar trabalhando
para o presidente Maduro?", pergunta um incrédulo e irritado Jorge
Arreaza.
Mas ainda não acrescenta nada sobre a Operação Gideon.
Talvez — como a Baía dos Porcos, 60 anos atrás — continue sendo objeto
de intermináveis especulações. E o que aconteceu com Jordan Goudreau?
Seu paradeiro é desconhecido. O FBI não confirma ou nega se ele está sob
investigação.
O que é o Dia X, o colapso político e econômico pelo qual esperam neonazistas alemães?
Extremistas de direita da Alemanha incorporaram teoria da conspiração que prevê colapso do país
O colapso da sociedade alemã se aproxima e é preciso se preparar para o "Dia X", quando a ordem e o governo da Alemanha
sucumbirão. Àqueles prontos para esse momento caberá, então, salvar a
nação do desastre. Ao menos, é isso o que prevê uma teoria da
conspiração abraçada por extremistas de direita e neonazistas no país.
Diversos
grupos, grande parte deles organizados em fóruns na internet ou via o
aplicativo de mensagens Telegram, se previnem para esse dia com estoques
de alimentos, bebidas alcóolicas, remédios, armas e muitas, muitas
munições.
Alguns até aguardam uma guerra entre alemães e
"imigrantes e muçulmanos", porque temem uma "substituição" da população
alemã por estrangeiros que supostamente não seguem os valores do país.
Ainda que o "Dia X" aparente ser apenas mais uma teoria da conspiração, nos últimos anos os preppers (pessoas que se preparam para cenários apocalípticos) da extrema direita alemã têm preocupado as autoridades do país.
Grandes
quantidades de armas e munições foram apreendidas com esses indivíduos.
Os grupos atraem, além de civis, policiais e membros da Bundeswehr, as
Forças Armadas da Alemanha.
Nem todos os preppers são extremistas de direita, contudo. Há
quem se prepare para um apocalipse nuclear, colapso ambiental ou um
grave caos econômico, por exemplo.
Mas, na Alemanha, o "Dia X"
entrou na agenda de parte da extrema direita, após a crise de refugiados
de 2015, quando mais de 1 milhão de solicitantes de asilo chegaram ao
país fugindo de locais como Síria e Iraque.
"Conforme a crise se
desenvolveu, houve um aumento do populismo de direita, do AfD [partido
de extrema direita que se tornou a terceira força no parlamento
federal], de todos os tipos de grupos de direita e, então, dentro do
movimento prepper, as pessoas se inclinaram mais para a direita",
afirma à BBC News Brasil Hans-Jakob Schindler, diretor do Projeto
Contra-Extremismo (CEP), organização sem fins lucrativos dedicada a
combater ideologias extremistas.
Uma das principais redes de preppers é
a Nordkreuz (Cruz do Norte, em alemão), com mais de 30 integrantes.
Parte destes indivíduos eram membros da Spezialeinsatzkommandos (SEK),
unidade de operações especiais da polícia do Estado da
Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental — um deles, inclusive, ainda estava na
ativa quando o grupo passou a ser investigado em 2017.
A
Nordkreuz, segundo as investigações, compilou uma lista com 25 mil nomes
de opositores que poderiam ser alvos de ataques no cenário do "Dia X",
incluindo políticos locais pró-refugiados e até mesmo o ministro das
Relações Exteriores, Heiko Maas, e o ex-presidente alemão Joachim Gauck.
Além disso, a preparação incluiu a encomenda de 200 sacos usados para
descartar cadáveres humanos.
Direito de imagemGetty Images Perspectiva de um 'Dia X' move 'preppers' na Alemanha
No fim de 2019, Marko Groß, uma das figuras centrais
da Nordkreuz e integrante da SEK, foi julgado por violação de leis
sobre armas de guerra e de controle de armamentos, além de fraude por
ter armazenado e, supostamente, recebido armas do Exército alemão.
Em
duas buscas em propriedades ligadas ao suspeito, as autoridades
encontraram mais de 50 mil cartuchos de munições, diversas armas e ao
menos 18 munições classificadas como armas de guerra. Groß recebeu uma sentença de 21 meses. Os procuradores recorreram da decisão. Outros membros do grupo estão sob investigação.
"Acompanhei
o julgamento e fiquei chocado com a facilidade com que o juiz principal
e seus colegas conseguiram menosprezar uma conspiração aberta de
cidadãos 'honestos', como policiais, caçadores, médicos e membros de
clubes de tiro, para pegar em armas quando o 'Dia X' ocorrer", diz
Friedrich Burschel, conselheiro sênior sobre neo-nazismo e
estruturas/ideologias de discriminação na Fundação Rosa-Luxemburgo, em
Berlim.
A Nordkreuz, destaca Burschel, montou refúgios, estocou
alimentos, água, gasolina, produtos sanitários, "armas e munições,
explosivos e outros dispositivos assassinos", além de manter um fórum
online com conteúdos "bastante explícitos" e referências diretas ao
regime nazista.
"Eles encaminharam fotos de Hitler em frente à
torre Eiffel, em Paris, com a legenda 'Chegada da delegação antiterror
alemã', ou fotos mostrando um soldado da SS atirando em vítimas caídas
no chão com o título 'pedido de asilo rejeitado'", diz.
As Cortes
alemãs, acredita Schindler, enfrentam dificuldades para lidar com esses
grupos, porque a "questão crucial" é se eles apenas aguardam um colapso
social involuntário ou se estão organizando um levante para criar esse
cenário.
Logo, ainda que circulem na internet planejamentos
detalhados sobre o que aconteceria no "Dia X", é complexo provar uma
intenção destes grupos em cometer atos terroristas ou de realizar um
golpe de Estado.
"Pelo menos até agora, os tribunais não
conseguiram provar além de qualquer dúvida razoável que a lista [da
Nordkreuz] era, na verdade, sobre pessoas que eles querem matar. Eles
não fizeram nada de concreto ainda", explica Schindler, que também atuou
na Organização das Nações Unidas (ONU) e no governo alemão em projetos
de inteligência contra a Al-Qaeda, o Estado Islâmico e o Talebã.
Recrutamento nas forças policiais
Direito de imagemGetty Images Munições e diversas armas já foram encontradas com adeptos de movimento que busca preparação para caos na Alemanha
Um relatório confidencial da Europol, a agência
policial da União Europeia, divulgado pela emissora pública alemã
Norddeutscher Rundfunk (NDR), revela a preocupação da entidade com a
estratégia de grupos de extrema direita em tentar recrutar integrantes
de forças policiais e do Exército.
O objetivo seria conseguir
armas e munições, além de ter membros com treinamento militar,
capacidade física e conhecimento de defesa pessoal. Na Alemanha, destaca
Schindler, indivíduos com esse perfil são ainda mais úteis por terem
acesso a armas em um país no qual esse processo não é simples para
civis.
"Uma combinação de pessoas que pensam que a ordem social
vai acabar — e que já estão fazendo uma lista de inimigos a serem
executados se isso acontecer — e a coleta de armas e munições por
indivíduos altamente treinados é uma tendência bastante preocupante",
diz.
Problema grave nas Forças Armadas
A
Bundeswehr, que tem cerca de 263 mil funcionários entre civis e
militares, sofre há anos com escândalos de ligações de seus membros com a
extrema direita.
Em janeiro de 2020, o portal RedaktionsNetzwerk
Deutschland (RND) revelou que o serviço de contra inteligência militar
(MAD) havia investigado 208 oficiais das Forças Armadas nos últimos
quatro anos por suspeitas de ligação com extremismo de direita. O dado
veio de uma resposta do Ministério da Defesa a um pedido de
parlamentares federais.
O documento afirma que 34 desses oficiais
tiveram que responder a uma Corte disciplinar militar. Entre os
soldados, 147 foram julgados: 57 receberam medida disciplinar por
"ofensas criminais com envolvimento com da extremismo de direita". Ao
todo, 1173 soldados e 83 servidores públicos da Bundeswehr foram
identificados como suspeitos de ligações com a extrema direita.
"Certamente,
houve um problema de anos e anos de não se levar isso a sério o
suficiente. Comparado com a quantidade de pessoas nas forças de
segurança, esse número é insignificante. Ainda assim, centenas
integraram essas redes com acesso a armas", afirma Schindler.
Em
um dos casos mais recentes, as autoridades descobriram 2 kg de
explosivos plásticos, um detonador, um fusível, um AK-47, um
silenciador, facas e milhares de cartuchos de munição (muitos dos quais
podem ter sido extraviados do exército) na propriedade rural de Philipp
S., um sargento da Kommando Spezialkräfte (KSK), a tropa de elite
especial das Forças Armadas.
No local também foram encontradas
memorabilia nazista, como um livro de canções da Schutzstaffel (SS), uma
organização paramilitar do regime de Adolf Hitler. O episódio
pressionou o Ministério da Defesa a explicar como neonazistas passaram
despercebidos dentro da corporação por tanto tempo.
O problema com
a infiltração de extremistas de direita na KSK é tão grave que a
ministra da Defesa, Annegret Kramp-Karrenbauer, desmontou uma das quatro
companhias da corporação em julho. O resto da unidade especial, que
atua em operações antiterrorismo e de resgate de reféns em áreas hostis,
pode ter o mesmo destino se não conseguir implementar reformas
profundas até 31 de outubro de 2020.
Direito de imagemREUTERS/Wolfgang RattayImage caption
Infiltração de extremistas de direita na KSK é tão
grave que a ministra da defesa alemã, Annegret Kramp-Karrenbauer,
desmontou recentemente uma das quatro companhias da corporação
Segundo o MAD, ao menos 20 soldados da KSK estão sob investigação por suspeitas de ligações com a extrema direita.
"O
MAD não faz ideia do que está acontecendo nas Forças Armadas. As coisas
aparecem acidentalmente, perguntas ficam sem resposta e as redes de
extremistas de direita fortemente armados no Exército podem se
desenvolver quase sem serem perturbadas", diz Burschel.
A
intervenção do Ministério da Defesa na KSK indica quão profundamente
esta crise atinge as tropas. O órgão admite, por exemplo, não saber
determinar onde 37 mil cartuchos de munição excedente foram disparados,
usados ou armazenados, e que 48 mil cartuchos de munição e 62 kg de
explosivos desapareceram.
"É muito grave que em quase todos os
grupos presos por suspeita de envolvimento com atividades terroristas de
direita, se encontre policiais ou ex-policiais e soldados ativos.
Tropas desse tipo e estruturas de ordem e obediência com raízes no
militarismo e mitos de heroísmo de soldados são fertilizantes para
ideologias fascistas e nacionalistas", afirma Burschel.
Governo admite o problema
Em
nota à BBC News Brasil, um porta-voz do Ministério da Defesa alemão
reconheceu que os sucessivos casos recentes de suspeitos de extremismo
na KSK "causaram danos duradouros" à "confiança essencial" do Parlamento
e da sociedade nas Forças Armadas.
O Ministério disse estar
adotando "uma linha-dura ao buscar sistematicamente a investigação e a
exposição de todas as circunstâncias dos casos individuais, bem como
possíveis redes e estruturas facilitadoras". Mas destacou que "a maioria
absoluta" da Bundeswehr está comprometida em respeitar a Constituição
do país.
"A KSK alcançou resultados notáveis em todas as suas
operações desde 1998. No entanto, a análise dos últimos eventos e casos
de extremismo de direita deixa claro que a KSK ganhou vida própria […].
Isso resultou em partes da KSK desenvolvendo liderança tóxica,
tendências extremistas e manuseio negligente de material e munições que
não cumpriam totalmente com os regulamentos aplicáveis da Bundeswehr. A
supervisão do comando em todos os níveis acima da companhia subestimou
ou não reconheceu desenvolvimentos alarmantes nesses segmentos por muito
tempo", disse o porta-voz.
O governo admitiu que o MAD "não
cumpriu as suas responsabilidades" em relação ao problema, mas avalia
que mudanças feitas no fim do ano passado melhoraram o serviço de contra
inteligência militar, possibilitando a descoberta de casos como o de
Philipp S.
Dados da investigação, contudo, vazaram do MAD para
membros da KSK. Algo que o Ministério define como "uma falta de
profissionalismo inaceitável". Segundo a nota, os métodos do MAD para
combater o extremismo "ainda precisam de mais melhorias e
profissionalização".
Por que número de recuperados não indica sucesso na luta contra pandemia do coronavírus
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Apesar de Brasil ultrapassar marca de 100 mil
mortos,
Ministério da Saúde vem dando destaque a número de recuperados
Pouco menos de
cinco meses após registrar a primeira morte, em março, o Brasil
ultrapassou a marca de 100 mil mortos por covid-19 no sábado (08/08).
Nesse período, segundo dados do Ministério da Saúde, foram cerca de 3
milhões de infectados e quase 2,2 milhões de recuperados.
Em meio
à crescente politização sobre a doença causada pelo novo coronavírus,
integrantes do governo Bolsonaro e apoiadores do presidente reforçam o
último número como sinônimo de que o Brasil está conseguindo controlar a
pandemia e de que a imprensa vem fazendo uma "cobertura maciça de fatos
negativos", como chegou a dizer o ministro Luiz Eduardo Ramos, da
Secretaria de Governo, em maio.
Desde aquele mês, o Ministério da
Saúde tem dado destaque ao número de recuperados. Naquela ocasião,
chegou inclusive a postar diariamente o que chamou de Placar da Vida,
com dados atualizados de "brasileiros salvos".
No
entanto, especialistas descrevem essa estratégia como "negacionismo". Na
avaliação deles, destacar somente aspectos positivos em meio ao
crescimento de casos e mortes no Brasil é uma forma de transmitir a
falsa ideia de que as coisas estão melhorando.
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Gráfico mostra que curva de infectados por
coronavírus no Brasil atingiu platô alto, diferente da de outros países
Dados sobre a evolução da pandemia no Brasil mostram
que a curva de infectados e mortos atingiu um platô alto e vem se
comportando de forma bastante distinta da de outros países,
principalmente europeus.
Eles explicam que como o coronavírus é um vírus que normalmente mata
menos de 5% das pessoas que foram infectadas e tiveram sintomas, é
esperado que "mais de 95% vão se recuperar".
"Enfatizar os
números de recuperados não muda nada neste momento. É preciso ser
realista. Não é correto tentar minimizar a gravidade da doença", disse
Marcos Boulos, professor da faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo, à BBC News Brasil em entrevista recente.
"O ranking dos
países pelo número de casos é praticamente o mesmo do que o ranking pelo
número de recuperados. Por quê? Porque é natural que o país que tenha o
maior número de casos tenha o maior número de recuperados. Faz parte da
dinâmica da doença", acrescenta Domingos Alves, responsável pelo
Laboratório de Inteligência em Saúde (LIS) da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto.
Proporção mortos x recuperados
Além disso, os próprios números sobre os recuperados contam uma outra história.
O
Brasil, por exemplo, contabiliza até agora, 100 mil mortes para 2,2
milhões de recuperados. Isso significa uma pessoa morta para 22 que se
recuperaram da doença.
Essa proporção é muito inferior à de outros
países que conseguiram controlar a pandemia como a Coreia do Sul,
referência quando se trata de testagem em massa.
Ali, foram 305 mortos para 13,7 mil recuperados. Ou seja, uma pessoa morreu para 45 que se recuperaram da doença.
De
fato, o Brasil testa pouco e enfrenta uma crise de subnotificação. Mas
se, de um lado, as estatísticas oficiais distorcem a realidade,
subestimando o número verdadeiro de recuperados, por outro, também pode
jogar para baixo a cifra real de mortos.
Segundo Alves, há uma subnotificação aproximada de 40% no total de óbitos.
Isso significa que, em vez dos 100 mil mortos contabilizados oficialmente, o Brasil já estaria com 166 mil mortos.
Essa
subnotificação de óbitos, segundo Alves, deve-se a uma combinação de
fatores, incluindo excesso de pedidos de exames, que fazem com que o
resultado dos testes atrasem.
Como resultado, os médicos acabam fazendo declarações de óbitos sem diagnóstico específico.
Mas, mesmo comparado com países que não fazem testagem em massa, o Brasil também fica para trás.
Esse
é o caso da Argentina, por exemplo. Até agora, foram 4,6 mil mortos
para 170 mil recuperados. Isso equivale a um morto para 37 recuperados.
No
Chile, um dos países com uma das maiores taxas de mortalidade por 100
mil habitantes, a proporção é de um morto para 34 recuperados, a mesma
do Peru.
"O fato de o Brasil ser o segundo no mundo em número de
recuperados não significa que estamos tendo êxito em controlar a
pandemia. Só significa que tivemos muitos mais casos", explica Alves.
"Frente
ao número de recuperados, o número de mortos do Brasil é muito grande, e
isso mostra que o governo não tem sido bem-sucedido", conclui.
Como a explosão em Beirute derrubou o governo do Líbano
Depois de uma semana de tristeza e
revolta pela enorme explosão no porto de Beirute, que matou ao menos 220
pessoas na terça-feira (04/08), a cúpula do governo do Líbano caiu.
O primeiro-ministro Hassan Diab anunciou sua renúncia na segunda-feira (10/08), em um discurso televisionado.
Diab declarou também que está 'dando um passo atrás' para estar ao lado do povo 'lutando a batalha por mudanças'
Nele, afirmou que o "crime" da explosão era resultado da corrupção endêmica e pediu a responsabilização dos culpados.
"Descobri
que o sistema de corrupção é maior que o Estado, e que este último é
oprimido por esse sistema e não consegue confrontá-lo ou se livrar
dele."
Diab declarou também que está "dando um passo atrás" para estar ao lado do povo "lutando a batalha por mudanças".
Declaro hoje a renúncia deste governo. Que Deus proteja o Líbano", afirmou.
Antes, ministros de Justiça, Informação e Meio Ambiente já haviam deixado seus cargos.
Declaro hoje a renúncia deste governo. Que Deus proteja o Líbano", afirmou.
Antes, ministros de Justiça, Informação e Meio Ambiente já haviam deixado seus cargos.
Reuters Image caption No fim de semana, manifestantes invadiram prédios do
governo no centro de Beirute e entraram em confronto com a polícia
Nitrato de amônio
O presidente e
o premiê libaneses já haviam dito que a explosão foi resultado da
detonação de 2,7 mil toneladas de nitrato de amônio que fora armazenado
no porto seis anos antes, sem as devidas medidas de segurança.
Parte
da população acusa a liderança do Líbano de ter responsabilidade no
episódio, atribuindo o problema à negligência e à corrupção no país. Uma
combinação de crise político-econômica constante, em meio à pandemia e
ao episódio da explosão aumentou a insatisfação popular com o governo do
país.
Durante o fim de semana, manifestantes invadiram prédios do governo no centro de Beirute e entraram em confronto com a polícia.
Segundo
o prefeito de Beirute, Marwan Abboud, ainda há 110 pessoas
desaparecidas após a explosão da terça-feira. Por toda a cidade,
centenas de milhares de pessoas ficaram desabrigadas ou estão morando em
lares bastante danificados pelo acidente.
Segundo o Comitê
Internacional da Cruz Vermelha, existe uma grande escassez de itens
básicos entre os desabrigados. "Eles precisam de abrigo, comida,
produtos de limpeza. E precisam de ajuda para recolher o que sobrou de
suas casas", afirmou à BBC a porta-voz da instituição, Rona Halabi.
Do descontentamento à renúncia
O
descontentamento da população vem crescendo há anos. No final de 2019,
um plano oficial de cobrar impostos sobre o uso do WhatsApp derivou em
protestos em massa contra a crise econômica e a corrupção.
A
pandemia de coronavírus vinha contendo as manifestações populares, que
voltaram a eclodir após a explosão no porto. Muitos consideraram
insuficientes as promessas de investigação do governo.
Estimativas
oficiais são de que a explosão tenha causado mais de US$ 3 bilhões em
danos de infraestrutura, mas que as perdas econômicas do Líbano cheguem a
US$ 15 bilhões.
O país já vivia uma profunda crise econômica
antes do desastre, com um número crescente de famílias sendo empurradas à
fome e à pobreza.
Agências da ONU advertem que haverá uma crise
humanitária se não for possível levar, com rapidez, carregamentos de
alimentos e medicamentos. Isso se agrava pelo fato de que o porto
destruído na explosão era a principal via de abastecimento de Beirute.
Tudo isso ajuda a explicar a pressão sobre o governo libanês, forçando a renúncia.
Doadores
internacionais prometeram quase US$ 300 milhões em ajuda ao Líbano, em
uma conferência virtual realizada no domingo liderada pelo presidente
francês, Emmanuel Macron.
Um comunicado conjunto dos doadores,
porém, fez menção a preocupações com a corrupção, afirmando que a
assistência financeira deve ser "entregue diretamente à população
libanesa, com o máximo de eficiência e transparência".
Coronavírus: 9 erros que levaram às 100 mil mortes no Brasil (e 1 lição que a pandemia deixa até agora)
Camilla Veras Mota, Ligia Guimarães, Mariana Alvim, Rafael Barifouse e Vinícius Lemos
Da BBC News Brasil em São Paulo
Reuters Imagem caption
Brasil passa das 100 mil mortes com um número de óbitos diários ainda muito elevado
Quanto tempo leva para contar até 100 mil? Nessa pandemia, foram 164 dias no Brasil, do primeiro caso até passarmos das 100 mil mortes por causa do novo coronavírus.
O
total cresceu mais gradualmente no começo, do primeiro óbito, em 12 de
março, até pouco antes do país passar de 10 mil, em 9 de maio. Aí a
curva de contágio empinou de vez. As mortes dobraram em menos de duas
semanas. Um mês depois, eram mais de 50 mil. Agora, neste sábado (8/8),
chegaram a 100.477.
É como se a maior tragédia da aviação
brasileira (o acidente de avião da TAM no aeroporto de Congonhas, em São
Paulo, que matou 199 pessoas) tivesse se repetido 505 vezes desde 26 de
fevereiro, quando o primeiro caso foi oficialmente confirmado.
Seriam três desastres de avião daquele porte por dia, todos os dias, ao longo de mais de cinco meses.
Ou
equivalente à população inteira de cidades como Jataí, em Goiás, Barra
do Piraí, no Rio de Janeiro, Mairiporã, em São Paulo, e Abreu e Lima, em
Pernambuco.
O Brasil é agora o único lugar do mundo além dos Estados Unidos que
superou esse patamar. Mais de 161 mil americanos já morreram por causa
da pandemia.
A taxa brasileira é a 10ª pior entre 209 países
monitorados pelo Our World in Data. Mas estão à nossa frente países como
San Marino e Andorra, que têm populações muito pequenas e só algumas
dezenas de mortes. Ou França, Itália, Reino Unido, Bélgica e Suécia,
onde as mortes diárias vêm caindo há meses e, atualmente, estão em um
dígito.
Mas a nossa taxa de mortes por milhão de habitantes é a
segunda maior entre os dez países mais populosos do mundo, segundo o
site Our World in Data, da Universidade Oxford, no Reino Unido. São 473
mortes/milhão, enquanto os Estados Unidos têm 487 mortes/milhão.
'Nossa incompetência'
Mas,
enquanto os números de mortes diárias vêm caindo em diversas partes do
mundo, estes números continuam muito altos por aqui.
As mortes
diárias variaram entre 541 (em 2/8) e 1.437 (em 5/8) na última semana, e
estabelecemos há muito pouco tempo um novo recorde nacional em toda a
pandemia: em 29 de julho, 1.595 novos óbitos foram confirmados.
É
em meio a uma epidemia ainda bem intensa que passamos do marco simbólico
das 100 mil mortes, que escancara o fracasso do Brasil em evitar uma
tragédia sem precedentes.
"Chegar a 100 mil é um sinal da nossa
incompetência. Certamente, poderíamos ter feito melhor", diz Natália
Pasternak, doutora em microbiologia pela Universidade de São Paulo (USP)
e presidente do Instituto Questão de Ciência, dedicado à divulgação
científica.
A visão é compartilhada por líderes, pesquisadores e
profissionais de saúde com quem a BBC News Brasil conversou para
entender os erros do país no combate à covid-19.
"Esse número
mostra que, como país, não estamos conseguindo conter o vírus", diz
Ester Sabino, que fez parte do grupo que fez o mapeamento genético do
coronavírus no Brasil.
A médica, que é professora da Faculdade de
Medicina da USP, alerta que o surto brasileiro ainda está longe do fim.
"Se nada mudar e continuarmos com mais de mil mortes por dia, o total de
mortes vai chegar a 200 mil em no máximo cem dias."
Por isso, é
fundamental compreender quais foram os equívocos que levaram o Brasil a
este ponto — e qual é a lição que a pandemia deixou para o país até
agora.
Erro nº1: Não nos preparamos para essa pandemia
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Mortes poderiam ter sido evitadas se possibilidade de uma pandemia não tivesse sido subestimada
Um ponto no qual o Brasil e outros países do mundo falharam foi não terem se preparado para uma pandemia como essa.
"Já
era falado há algum tempo que poderia acontecer, que não era ficção
como muita gente pensava, mas os esforços internacionais para sermos
capazes de responder a isso ainda eram incipientes", diz Sabino.
A
cientista avalia que o fato da pandemia anterior, de H1N1, e de
epidemias causadas por outros coronavírus, como as de Sars e Mers, não
terem sido tão graves como se imaginou inicialmente contribuiu para
isso.
Nos 16 meses da pandemia de H1N1, por exemplo, houve 493
mil casos confirmados e 18,6 mil mortes, segundo a Organização Mundial
da Saúde (OMS).
As epidemias de Sars e Mers tiveram 8 mil e 2,5
mil casos respectivamente, enquanto agora já passamos dos 19,5 milhões
de casos e das 723 mil mortes por covid-19 no mundo.
"Como não
houve antes um impacto como o de agora, as autoridades pensavam que
tinham ferramentas suficientes para lidar com um evento desse tipo", diz
Sabino.
Erro nº 2: Não houve um plano nacional contra o coronavírus
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Após duas trocas no comando do Ministério da Saúde, pasta segue com um líder interino
O primeiro caso foi confirmado no Brasil quase dois
meses depois da China alertar a OMS sobre o novo coronavírus. Havia
então mais de 81 mil casos e 2,75 mil mortes em 38 países.
Mesmo
assim, quando a pandemia finalmente atingiu o país e mesmo depois disso
acontecer, não houve um plano nacional — ou mesmo planos em escala
regional — para o combate ao coronavírus, diz Sabino.
Sem um
consenso entre os governos federal, estaduais e municipais, houve
decisões desencontradas e descompassadas, o que faz com que hoje a
epidemia esteja arrefecendo em algumas partes do país e se agravando em
outras.
"Controlar uma epidemia é difícil, mas não é impossível.
Só que a gente precisa formular um bom plano para isso. E até hoje não
temos um, a não ser aguardar por uma vacina ou esperar a pandemia
passar", diz a cientista.
Sabino diz que a resposta do país foi
prejudicada pela troca de comando no Ministério da Saúde. Luiz Henrique
Mandetta e Nelson Teich pediram demissão do cargo em plena pandemia, por
divergências com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), e ainda
hoje a pasta é liderada por um ministro interino, o general Eduardo
Pazuello.
"O Mandetta criou um plano, mesmo que no meio do
caminho, mas depois saiu, e isso acabou fragilizando a nossa reação,
porque você não consegue refazer uma política de saúde de uma hora para a
outra", diz Sabino.
Erro nº3: Bolsonaro minimizou a pandemia
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Presidente negou a gravidade da pandemia em diversas ocasiões
Em dos seus primeiros comentários sobre a pandemia, o
presidente disse que estava sendo "superdimensionado o poder
destruidor" do coronavírus. Ele também criticou as medidas de isolamento
social ao dizer que a covid-19 era uma "gripezinha" ou um
"resfriadinho".
Bolsonaro afirmou ainda que a crise gerada pelo
coronavírus era uma "fantasia" e que havia uma "histeria" em torno do
assunto. Também disse que "todos iremos morrer um dia".
Questionado
sobre os recordes de mortes, respondeu: "E daí? Lamento. Quer que eu
faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre". Agora, ao comentar
sobre as mais 100 mil mortes, disse que "vamos tocar a vida e se safar
desse problema".
Natália Pasternak diz que a postura do presidente
foi muito prejudicial para o combate à pandemia: "A pandemia nos
encontrou com a pior liderança política possível, no pior momento".
Erro nº4: Não foram feitos testes em massa
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Sem ampla testagem, não é possível quebrar a cadeia de transmissão do vírus
Outro equívoco que o Brasil cometeu (e ainda comete)
foi não testar em massa a população, diz a pneumologista Margareth
Dalcolmo, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Os
dados mais recentes do Ministério da Saúde apontam que, entre 1º de
fevereiro e 31 de julho, foram realizados 2.135.487 exames laboratoriais
para diagnóstico da covid-19. Os números não incluem testes em
hospitais e clínicas particulares, apenas na rede pública.
Isso
representa apenas 1% da população brasileira e ainda está bem longe da
meta de testar 12% dos brasileiros com exames laboratoriais, apresentada
por Pazuello ao Senado em 23 de junho.
Sem uma ampla testagem,
não é possível rastrear as pessoas que entraram em contato com quem
estava infectado, para isolar aquelas que também tivessem se
contaminado. A OMS ressaltou diversas vezes que isso é fundamental para
quebrar a cadeia de transmissão de um vírus.
Nos países
bem-sucedidos no combate à pandemia, essa proatividade foi fundamental,
diz Dalcomo. "Esse foi o modelo da Coreia do Sul, que, para mim, foi o
melhor modelo de combate à pandemia."
Erro nº5: O isolamento social não foi suficiente
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Adesão da população às quarentenas não foi suficiente para conter a propagação do vírus
Dalcomo diz que outro fator que levou a tantas mortes foi a falta de um lockdown propriamente dito. Esse é o nome dado ao bloqueio total de uma cidade ou região.
De
um lado, lugares onde a curva de infecção se acelerava de forma
preocupante resistiram em adotar a medida — como São Paulo, o Estado com
maior número de casos e mortes, e o Amazonas, que viu seu sistema de
saúde entrar em colapso.
De outro, locais onde o lockdown chegou
a ser decretado por governos ou pela Justiça, as autoridades muitas
vezes não conseguiram restringir a circulação ao nível recomendado pela
OMS, de 70% de isolamento.
Em Fortaleza, no Ceará, o índice não passou de 55% enquanto o lockdown vigorou,
de 8 a 30 de maio, segundo a empresa In Loco, que criou um índice
baseado nos dados de geolocalização de celulares. O nível foi semelhante
em São Luís, no Maranhão, que viveu um lockdown de 5 a 18 de maio.
No
Estado do Rio, onde alguns municípios (mas não a capital) decretaram a
medida também em maio, o isolamento atingiu no máximo 57%. Na época, a
Fiocruz enviou um posicionamento ao Ministério Público do Rio de Janeiro
em que recomendava a adoção urgente de medidas mais rígidas de
distanciamento social.
"Nós perdemos o timing", diz Dalcolmo. Para ela, uma ação mais enérgica naquele momento poderia ter evitado mortes.
Pasternak
concorda que quarentenas mais eficientes desde o início da pandemia, a
exemplo de outros países atingidos antes pelo coronavírus, como China,
Itália e Espanha, poderiam ter salvado vidas.
A pesquisadora cita
como referência a previsão inicial feita pelo Imperial College, em
Londres, de que o Brasil teria 44 mil mortes, caso estas medidas
tivessem uma grande adesão da população e incentivo dos governantes.
"O
isolamento exige engajamento social. Faltou uma comunicação efetiva e
transparente com a população para conseguir isso em vez de as pessoas
entenderem como um castigo. Se isso tivesse ocorrido, das 100 mil
mortes, mais da metade teriam sido evitadas", diz Pasternak.
Erro nº 6: A propaganda da cloroquina fez muita gente se expor ao vírus
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Bolsonaro defende uso da cloroquina, mesmo sem evidências científicas dos seus efeitos contra a covid-19
A imunologista Bárbara Baptista, pós-doutoranda da
Fiocruz no Amazonas, avalia que a aposta do governo federal e de outras
autoridades na eficácia da cloroquina e da hidroxicloroquina para
prevenir ou tratar a covid-19 contribuiu para o país ter tantas mortes.
Desde
o início da pandemia, Bolsonaro defendeu publicamente estes supostos
efeitos destas drogas, usadas contra doenças como lúpus e malária.
O
Ministério da Saúde recomendou seu uso, associado com o antibiótico
azitromicina. O Exército produziu milhões de comprimidos, e muitas
cidades distribuíram gratuitamente o medicamento.
Mas, apesar de
alguns estudos iniciais indicarem que estas drogas poderiam inibir o
vírus, pesquisas mais robustas mostraram depois que não tinham esse
efeito.
"Em uma pandemia, o que um governo diz tem peso.
Infelizmente, governantes populistas falharam na orientação da população
em relação à hidroxicloroquina", diz Baptista.
A experiência da cientista em Manaus mostra que muitas pessoas acreditaram que poderiam prevenir a covid-19 com essa droga.
"A
partir do momento que pensaram estarem protegidas, elas se expuseram
mais. Mas, como não estavam, isso levou a um aumento do número de casos
e, consequentemente, a um maior número de óbitos."
Erro nº7: Os hospitais de campanha viraram um 'problema'
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Hospitais de campanha ficaram prontos tarde demais e são alvos de suspeitas de corrupção
Na opinião de Margareth Dalcomo, alguns Estados
também erraram ao investir muitos recursos nos hospitais de campanha,
porque, em muitos casos, havia leitos ociosos na rede pública que não
estavam sendo usados por falta de recursos humanos e que poderiam ter
sido reativados com a contratação de equipes temporárias.
Em
alguns locais, a construção destes hospitais foi concluída tarde demais,
quando a demanda já havia caído. Em outros, foram abertos mais leitos
do que o necessário, fazendo com que os hospitais de campanha fossem
subutilizados.
Há ainda os casos de possível corrupção, como no
Rio de Janeiro, onde o Ministério Público investiga se houve desvios de
recursos públicos.
"Em muitos casos, os hospitais de campanha acabaram sendo mais um problema do que uma solução", diz Dalcomo.
A
médica acredita que parte destes hospitais teria sido mais útil para
receber pacientes com formas mais leves de covid-19 que não tinham
condições de se isolar adequadamente em casa. "Eles poderiam ter sido
usados como centros de acolhimento para essas pessoas."
Erro nº8: Não conseguimos proteger os índios
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Ao menos 633 indígenas já morreram e 22.325 adoeceram nesta pandemia no Brasil
A epidemia no Brasil começou pelos grandes centros
urbanos, mas já se alertava desde o início que, quando chegasse às
tribos indígenas, poderia causar muitas mortes, por estes grupos serem
particularmente vulneráveis à covid-19.
Mas os avisos não
impediram que os índios fossem seriamente afetados pelo coronavírus:
pelo menos 633 já morreram e 22.325 adoeceram, segundo a Articulação dos
Povos Indígenas do Brasil (Apib).
A pandemia acentuou antigos
problemas enfrentados pelas tribos, como falta de equipes de saúde
suficientes ou especializadas, e escassez de alimentos e itens de
higiene. E, assim como no resto do país, houve falta de testes,
equipamentos de proteção e respiradores nas regiões onde vivem.
O
assunto chegou ao Supremo Tribunal Federal, que determinou por
unanimidade que o governo federal adote medidas para proteger os
indígenas.
"Estas populações podem ser contaminadas pelas
próprias equipes de saúde; na região amazônica, pela invasão do
território por madeireiros e grileiros; e, em aldeias próximas dos
centros urbanos, os próprios indígenas precisam ir até as cidades e
podem se infectar", diz Paulo Tupiniquim, coordenador da Apib.
Ele ressalta que, quando o vírus atinge essas comunidades, há um desafio maior de manter um distanciamento social.
"Os
indígenas vivem em coletividade. Entre os caiapós do Mato Grosso, por
exemplo, há cinco ou seis famílias em uma mesma maloca. Se uma pessoa
pega...", diz Tupiniquim.
Erro nº9: Não conseguimos proteger os mais pobres
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Coronavírus matou mais entre as comunidades pobres, aponta estudo da Fiocruz
A pandemia também atingiu primeiro os mais ricos,
por ter chegado ao país por meio de quem havia viajado ao exterior. Mas
já se sabia que o vírus se propagaria rapidamente quando atingisse as
comunidades mais pobres.
Mesmo assim, faltaram políticas públicas
para evitar as mortes justamente entre os mais socialmente vulneráveis,
diz a pesquisadora Roberta Gondim, da Escola Nacional de Saúde Pública
da Fiocruz e uma das coordenadoras da Sala de Situação Covid nas
Favelas.
Um levantamento da Fiocruz divulgado em julho confirmou
que, nas regiões onde a pobreza urbana é mais acentuada e faltam
serviços básicos, como saúde e saneamento, a doença avança mais
rapidamente.
E também mata mais. No Rio de Janeiro, a taxa de
letalidade foi de 19,47% nas áreas da cidade com alta concentração de
favelas, mais do que o dobro do registrado nas áreas sem favelas
(9,23%).
As condições precárias de vida impedem adoção de medidas
individuais de proteção recomendadas pela OMS, como o distanciamento
social ou a possibilidade de deixar de trabalhar para ficar em casa.
Além
disso, doenças pré-existentes que agravam a covid-19 são mais
frequentes em pessoas em estado de vulnerabilidade social. E há menor
oferta de leitos e acesso a medicamentos e outros recursos capazes de
evitar a morte do paciente.
Gondim diz que a situação só não foi
pior porque as próprias comunidades correram para se organizar, mesmo
sem o apoio do poder público em muitas regiões.
Os mais pobres
também tendem a ser os mais prejudicados com a reabertura econômica que
já ocorre em parte do país, prevê a pesquisadora. "As populações já
vulnerabilizadas é que serão mais atingidas, dada a impossibilidade de
acesso às ações protetivas."
E qual lição a pandemia deixa até agora?
O
coronavírus chegou ao país em um momento em que pesquisas científicas
eram postas em dúvida por governos e autoridades e quando investimentos
no setor eram suspensos ou cortados.
Mas a ciência, feita
principalmente em instituições públicas e com recursos públicos, foi
justamente um dos protagonistas no combate ao vírus no país, com estudos
que ajudaram a compreender melhor um vírus e uma doença até então
desconhecidos, pesquisas fundamentais para entender e prever o avanço da
epidemia e com o desenvolvimento de equipamentos mais baratos que são
essenciais para salvar vidas
"Espero que a gente tenha conseguido
mostrar nesta pandemia que a ciência é necessária e que as pessoas levem
isso em conta na hora de elegerem seus representantes", diz Ester
Sabino.
Natália Pasternak reforça a necessidade de investimentos
"contínuos e consistentes" nesta área. "Ou estaremos em situação
igualmente vulnerável em emergências futuras."
Margareth Dalcomo
avalia que a ciência brasileira sairá desta pandemia mais valorizada.
"Apesar da perda de cérebros preciosos, por falta de condições adequadas
para trabalhar, conseguimos produzir conhecimento, registrar patentes,
desenvolver equipamentos a um custo menor, participar de estudos
importantes. Acho que esse saber nacional nunca esteve tão próximo da
sociedade civil como agora."