domingo, 29 de abril de 2018

A luta de brasileira até provar inocência após acusação de tráfico de drogas na Itália

A recifense Elaine Araújo SilvaDireito de imagemARQUIVO PESSOAL
Image captionElaine Araújo Silva ficou nove meses na prisão e outros três em prisão domiciliar na Itália
Acusada de tráfico internacional de drogas, a brasileira Elaine Araújo Silva esteve nove meses detida e outros três meses em prisão domiciliar na Itália, antes de conseguir comprovar a sua inocência.
Nove anos depois da sentença de absolvição, ela ainda sofre com crises de depressão e ataques de pânico, doenças que tiveram início durante o período de reclusão e que a obrigaram a deixar o emprego.
O caso voltou à tona recentemente, quando Elaine foi uma das entrevistadas do programa 'Sono Innocente' (Sou Inocente), transmitido pelo canal público Rai 3.
Elaine disse à BBC Brasil que só agora, depois de nove anos, consegue falar publicamente sobre a sua história.
"Depois da prisão passei a ter medo mesmo em situações normais de vida cotidiana. Até hoje preciso de acompanhamento farmacológico e psiquiátrico", diz em entrevista à BBC Brasil a recifense de 42 anos.
"Sempre trabalhei, mas tive que deixar o emprego por causa do trauma da prisão", diz.
A depressão a levou até mesmo a perder o prazo legal, de dois anos, para solicitar o ressarcimento previsto pelo Estado italiano em casos de prisão injusta.
"Elaine estava devastada psicologicamente. Mesmo tendo sido aconselhada a solicitar a reparação por detenção injusta, ela só queria esquecer toda aquela história. Não podíamos agir sem o seu consenso", conta à BBC Brasil o advogado da brasileira, Piero Venture.
O valor atual previsto pela lei italiana para esta indenização é de 235,82 euros (cerca de R$ 990) por cada dia de reclusão e 177,91 euros (cerca de R$ 747) para cada dia de prisão domiciliar consideradas injustas.
"Se tivesse feito a solicitação dentro do prazo de dois anos após o trânsito em julgado da sentença de absolvição, muito provavelmente ela teria recebido esta indenização", afirma Venture.

Tormento

Elaine Araújo SilvaDireito de imagemARQUIVO PESSOAL
Image caption'Depois da prisão passei a ter medo mesmo em situações normais de vida cotidiana', diz recifense presa e depois inocentada na Itália
O tormento de Elaine teve início em 7 de junho de 2008, após uma noite normal de trabalho como garçonete em uma discoteca na cidade de Rimini.
"Cheguei em casa por volta das 3h da manhã. Tentei abrir a porta, mas ela estava fechada por dentro. Antes que eu tocasse a campainha, um rapaz que eu nunca vira me abriu a porta. Entrei e fui diretamente ao quarto da mãe da amiga com a qual eu morava, para perguntar quem era aquele homem. Ela me respondeu que era um amigo da filha e então fui dormir."
No dia seguinte, Elaine foi acordada por policiais armados. Confusa, vestiu-se às pressas e foi acompanhada até a sala onde estavam a amiga, a mãe dela, e o rapaz que lhe abrira a porta, todos cidadãos dominicanos. A brasileira soube, então, que o jovem chegara da Espanha no dia anterior, trazendo cápsulas de cocaína no estômago. De acordo com os policiais, no momento da blitz a droga estava à vista, em cima da mesa.
Mesmo assustada, Elaine acreditava que conseguiria demonstrar a sua inocência rapidamente. Ela morava na Itália havia quase dez anos, trabalhava legalmente, tinha amigos e estava para se casar com um atleta turco, com o qual havia passado seis meses em Istambul e com quem iria viver nos Estados Unidos. Um dia antes da prisão, o namorado de Elaine, proprietário de uma rede de academia de artes marciais, viajara a trabalho para a Califórnia.

Prisão

Elaine foi levada para a delegacia junto com a mãe da amiga, uma senhora idosa que estava na Itália para passar uns dias com a filha, enquanto os outros dois acusados foram acompanhados em outra viatura.
"A pressão psicológica dos policiais era enorme. As acusações e os termos usados por eles me deixaram desesperada. Assinei papéis sem mesmo tê-los lido, confiando que isso me ajudaria a ir embora. Ao mesmo tempo, eu tentava consolar a mãe da minha amiga, dizendo que era tudo um mal entendido e que logo seríamos liberadas".
"Os policiais me deixaram fazer uma ligação, ma só tive tempo para dizer ao meu namorado que eu estava presa", conta Elaine.
No mesmo dia, Elaine e a idosa dominicana foram transferidas para o cárcere de Forli. "Não pude acreditar quando vi abrirem-se os portões da penitenciária."
"Disseram-nos que se tratava de uma investigação internacional e que não seríamos liberadas até prenderem todos os membros da quadrilha", conta.
"Quando nos trancaram numa cela com outras prisioneiras comecei a passar mal porque tenho dificuldades de estar em lugares fechados."
Os amigos de Elaine contrataram um advogado para defendê-la, mas durante a audiência de custódia o juiz confirmou a prisão preventiva da brasileira, que em casos de tráfico de entorpecentes - cuja pena prevista é de 6 a 20 anos de reclusão - pode durar até um ano.
Com o passar dos dias, além de ter suportado "na marra" a sua claustrofobia, Elaine pediu ajuda também ao Consulado brasileiro.
"Escrevi várias cartas contando a minha situação e explicando que eu não estava bem de saúde. Recebi uma única resposta, onde diziam que o Consulado não poderia intervir em questões da Justiça italiana e, para me ajudar, mandaram-me selos para que eu enviasse cartas ao Brasil. Seria menos humilhante não ter recebido resposta alguma", diz.
A recifense Elaine Araújo SilvaDireito de imagemARQUIVO PESSOAL
Image captionRecifense ainda hoje lida com danos psicológicos vividos na prisão
Na prisão, Elaine sentia-se constantemente ameaçada. "Durante todo aquele período fui torturada psicologicamente pelas detentas por declarar-me inocente. Quando eu passava pelo corredores elas gritavam, me ameaçavam, me chamavam de 'bellina'. E quando viam que eu era tratada com respeito pelas agentes penitenciárias tornavam-se ainda mais agressivas."
"Mas o pior era durante a noite, quando algumas detentas liberavam o gás de um pequeno botijão que tínhamos na cela para fazer café, para se entorpecerem. Todas as manhãs eu acordava com dores de cabeça e náuseas."
Outros momentos difíceis eram os dias de visita. "Todas as terças e sextas-feiras eu me arrumava, esperava, e não aparecia ninguém", diz emocionada.
Elaine não recebia visitas nem mesmo do seu advogado que, sucessivamente foi substituído. Ela conta tê-lo visto apenas duas vezes, a última delas seis meses depois de ter sido presa, quando fora transferida para o cárcere da cidade de Rovigo.
"Ele se apresentou sem ter lido o meu processo, não sabia nem o nome dos outros acusados. Disse-me apenas que eu deveria ser condenada a uma pena entre sete e 10 anos de reclusão. Provavelmente, ele esperava receber mais dinheiro dos meus amigos."
No mesmo dia do encontro com o advogado, Elaine recebeu uma carta do namorado rompendo a relação deles. "Ele não suportou aquela situação, porque era muito famoso no mundo esportivo e não queria ter o seu nome associado a mim."

Tocar o fundo

"Tive uma crise histérica fortíssima. Para conseguir me conter, as agentes penitenciárias tiveram que usar água fria. Depois de seis meses de sofrimento, eu chegara ao meu limite."
Após uma tentativa de suicídio, Elaine passou a ser medicada contra depressão. Além dos distúrbios psicológicos, a brasileira teve ainda outros problemas de saúde durante a sua detenção, como catapora, que a obrigou a um isolamento de dez dias, e o diagnóstico de um tumor uterino em fase inicial, com consequente impossibilidade de ter filhos.
"Foi quando eu toquei o fundo. Depois disso, decidi reagir. Pior não poderia ficar."
O único consolo eram as cartas que recebia da mãe, que aprendera a escrever especialmente para conseguir demonstrar o afeto pela filha, e a amizade com uma detenta. "Certo dia, uma agente penitenciária pediu que eu tomasse conta de uma nova prisioneira, uma jovem dependente de drogas. Ela sofria terríveis crises de abstinência e eu a ajudava a lavar-se, a vestir-se. Cuidar de outra pessoa foi a minha salvação, fez com que eu me sentisse útil."
"Nos tornamos ótimas amigas. Finalmente, alguém acreditava em mim."
A guinada positiva continuou quando Mario Cantafio, um militar da aeronáutica italiana e ex-namorado da amiga com a qual Elaine fora presa, contratou um novo advogado para defendê-la.
"Nos conhecíamos porque ele e minha amiga foram namorados por seis anos, bem antes que ela se envolvesse com más companhias", conta.
Elaine Araújo Silva, o marido e dois filhosDireito de imagemARQUIVO PESSOAL
Image captionHoje, Elaine Araújo Silva vive com o marido e dois filhos
O militar passou a escrever para Elaine na prisão e a amizade entre eles se reforçou. "No início éramos apenas amigos, mas naquele período passamos a nos conhecer melhor."
Graças ao novo advogado e com um imóvel disponibilizado por Mario, no dia 16 de março de 2010, nove meses depois de ter sido detida, Elaine obteve a prisão domiciliar. Poucos dias depois, conseguiu autorização para voltar a seu trabalho. '"Eu saia às seis da tarde e voltava às 2h da madrugada."
"Finalmente eu estava feliz, trabalhando com entusiasmo e namorando com o Mario. Mas eu tinha sempre em mente a data da audiência, temendo que o pesadelo pudesse recomeçar."
Ao contrário das previsões dos médicos da prisão, Elaine descobriu estar grávida. "Foi uma alegria, mas ao mesmo tempo eu estava aterrorizada com a hipótese de voltar para a penitenciária com meu bebê."
Durante a audiência, o casal de traficantes dominicanos confirmaram as afirmações das testemunhas de Elaine, dizendo que ela e a mãe da criminosa eram completamente alheias ao crime. Ambas foram absolvidas, enquanto a ex-amiga e seu companheiro foram condenados a 4 e 8 anos de prisão, respectivamente.
"O advogado foi um anjo na minha vida. Eu só queria sair logo dali, voltar pra casa e esquecer tudo aquilo."
Elaine hoje está casada com Mario, com quem tem dois filhos, um garoto de oito anos e uma menina de cinco.
"Não tenho vergonha, contarei para os meus filhos a história toda. Prefiro pensar que o destino quis assim. Para chegar onde estou hoje, foi preciso passar por aquilo."

Tópicos relacionados

O cientista que usou a história de um serial killer para colocar a astrologia à prova

Homem surpreso com anúncio no jornalDireito de imagemGETTY IMAGES | ARQUIVO
Image captionAnúncio que oferecia horóscopo e perfil de personalidade gratuito era experimento para pôr à prova as afirmações da astrologia
"Absolutamente grátis! Seu horóscopo pessoal. Um documento de dez páginas", dizia o anúncio publicado em um jornal francês no dia 16 de abril de 1968. Ele convidava os leitores a participar, sem saber, de um experimento inusitado.
Tudo o que os interessados tinham que fazer era enviar seu nome, endereço, data e local de nascimento pelo correio, e receberiam um horóscopo e um perfil de personalidade.
Muitas das mais de 150 pessoas que escreveram ficaram tão impressionadas pela precisão do perfil que receberam de volta, que responderam ao autor do anúncio para agradecê-lo.
No total, 94% das pessoas se declararam satisfeitas e 90% disseram que seus familiares e conhecidos os reconheciam no perfil.
No entanto, todos os que responderam o anúncio tinham recebido o mesmo documento: era o perfil de uma pessoa que tinha nascido na cidade francesa de Auxerre às 03h do dia 17 de janeiro de 1897.
Por trás de tudo isso, havia dois nomes que, por razões muito diferentes, entraram para a história. Um deles era o responsável pelo experimento, que encomendou de um astrólogo profissional o mapa astral e a interpretação psicológica enviada aos participantes.
O outro era a pessoa cujo mapa astral foi enviado. A descrição de sua personalidade dizia coisas como "seu calor humano instintivo se alia ao intelecto e à engenhosidade (...). Possui um sentimento moral que é reconfortante: o de um cidadão digno e de bom senso (...) (cuja) vida encontra expressão na total devoção pelos demais...".

O homem por trás do perfil

Esta pessoa com características com as quais tantos outros se identificaram, que havia nascido em Auxerre em janeiro de 1897, se tornou, na vida adulta, o médico Marcel Petiot, conhecido como um assassino em série na França, durante a Primeira Guerra Mundial.
O médico Marcel PetiotDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionMarcel Petiot foi acusado de crimes diversas vezes durante a vida e liberado por incapacidade mental, até que mais de 30 cadáveres foram encontrados em sua casa
Desde criança, Petiot era considerado como alguém de inteligência fora do comum, mas também com graves problemas de comportamento. Aos 17 anos ele foi preso por roubo, mas um juiz o libertou, após determinar que ele não tinha capacidade mental para enfrentar um julgamento.
Em 1917, quando servia ao exército francês durante a guerra, Petiot foi julgado por roubar mantas de outros soldados. Mais uma vez, ele foi inocentado sob a justificativa de sofrer de demência.
No entanto, apesar de seu estado mental, ele foi mandado novamente à frente de batalha, onde sofreu uma crise. Ao liberá-lo, alguns médicos insistiram que ele deveria ser mandado para uma instituição psiquiátrica.
Mesmo assim, Petiot conseguiu estudar e formar-se em Medicina em 1921. Ele abriu um consultório na cidade de Villaneuve, onde se tornou uma figura popular.
Na cidadezinha, ele chegou a se eleger prefeito em 1926, mas foi suspenso do cargo por quatro meses em 1930 após ser declarado culpado por fraude. Mais tarde, um de seus pacientes foi assassinado e outro paciente (que havia acusado Petiot de ter cometido o primeiro crime) também morreu misteriosamente.
O médico foi afastado definitivamente do cargo de prefeito, mas logo ganhou as eleições para vereador. Novamente, ele perdeu a cadeira na câmara de vereadores local depois de ser declarado culpado de roubar energia elétrica da cidade.
Julgamento do médico Marcel PetiotDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionAo ser finalmente preso, em 1944, Petiot admitiu ter cometido mais de 60 assassinatos
Em 1933, ele se mudou para Paris, onde continuou tendo uma boa reputação como médico, mas cometendo diversos delitos nas horas vagas.
Durante a Segunda Guerra Mundial, Petiot formulou um plano para acumular mais riqueza à custa dos judeus que tentavam escapar da França ocupada pelos nazistas: ele lhes oferecia ajuda, lhes injetava veneno, afirmando que era uma vacina para proteger-lhes de doenças e, depois de vê-los morrer lentamente, ficava com tudo o que eles tinham de valor e escondia seus corpos no sótão de sua casa.
Ironicamente, ele foi preso pela polícia secreta nazista, a Gestapo, em 1943, suspeito de estar ajudando os judeus e a resistência ao regime. Ele foi liberado meses depois, mas, em 1944, foi preso novamente. Trinta cadáveres haviam sido encontrados em sua casa.
Na época, ele recebeu o apelido de "Doutor Satã" nos jornais. Foi acusado de 27 homicídios e condenado por 26. Em seu julgamento, admitiu ter matado mais de 60 pessoas, mas afirmou que todas as vítimas eram alemãs.
Malas confiscadas na residência de Petiot e levadas à políciaDireito de imagemGETTY IMAGES
Image captionPolícia encontrou 47 malas no sótão da casa de Petiot em Villeneuve; algumas continham roupas que foram identificadas pelos familiares de suas vítimas
Petiot morreu na guilhotina em 1946. Seu horóscopo, que havia sido encomendado para o experimento científico, dizia que alguns anos depois disso ele teria "uma tendência a assumir compromissos na vida amorosa".

O autor do experimento

O homem que usou a data de nascimento de Petiot para encomendar um horóscopo que seria enviado aos interessados em seu anúncio de jornal também tinha um apelido. Era chamado de Nostradamus, por sua habilidade para elaborar mapas astrais.
No entanto, ele não era astrólogo - era um psicólogo e estatístico francês chamado Michel Gauquelin.
Juntamente com sua esposa, a psicóloga suíça Marie-Françoise Schneider, ele idealizou o experimento com o perfil de Petiot e outros para pôr à prova as afirmações da astrologia e saber se o estudo das posições dos astros no céu podia realmente revelar características e elementos do destino das pessoas.
Em outro experimento, o casal pediu a astrólogos que estudassem 40 mapas atrais e separassem os 20 que correspondiam a criminosos e os 20 que correspondiam a cidadãos responsáveis. Os resultados, segundo eles, foram os mesmos de uma separação feita aleatoriamente.
Michel e Françoise Gauquelin
Image captionO casal de psicólogos Michel e Françoise Gauquelin dedicou a carreira a contestar a ideia de que a posição dos astros no momento do nascimento tem impacto no destino das pessoas
Em diversos testes, o psicólogo parecia demonstrar que as afirmações dos astrólogos não correspondiam ao que realmente ocorria nas vidas das pessoas.
Em 1969, ele escreveu: "Os signos que presidiram nossos nascimentos no céu não têm nenhum poder para decidir nossos destinos ou para afetar nossas características hereditárias".
No entanto, para sua suspresa, um de seus estudos, feito ainda no final da década de 1950, parecia contradizer os outros resultados.
Examinando as datas de nascimento de mais de 2 mil franceses proeminentes, Gauquelin descobriu que certos planetas apareciam com mais destaque em profissões específicas
"No fim das contas, havia uma relação estatística cada vez mais sólida entre o momento do nascimento de grandes homens e seu sucesso profissional (...). Tendo coletado mais de 20 mil datas de nascimentos de celebridades profissionais de vários países europeus e dos Estados Unidos, tenho que chegar à conclusão inevitável de que a posição dos planetas no momento de nascer está ligada ao próprio destino. Que desafio para a mente racional!", escreveu.
Gauquelin chamou seu trabalho de "astrobiologia", e um resultado em particular que vinculava o planeta Marte a heróis esportivos ficou famoso como "o efeito de Marte".
Estes experimentos perseguiram Gauquelin pelo resto da sua vida. Durante os 30 anos seguintes, tanto seus defensores quanto seus opositores voltariam a repeti-los e avaliá-los, sem resultados conclusivos.
Depois de um ataque de nervos, Gauquelin mandou destruir todos os seus arquivos e cometeu suicídio em 1991, aos 60 anos de idade.

Como se explica o 'efeito de Marte'?

O estudo de Gauquelin parecia mostrar um vínculo entre a habilidade para o esporte e a posição do planeta Marte no momento do nascimento.
Descrição gráfica do "efeito de Marte" feita por Gauquelin
Image captionGráfico do "efeito de Marte" feito por Gauquelin mostra suposta incidência maior do planeta em posições específicas nos mapas astrais de celebridades do esporte
A imagem acima foi o diagrama que ele fez para ilustrar a descoberta. Ele mapeia a incidência da hora e da latitude do nascimento das pessoas em relação à posição de Marte e à eclíptica da Terra em rotação.
O diagrama mostra picos justo depois da ascenção diária de Marte no céu e de seu posicionalmento no meio do céu (o horizonte e o meio do céu estão marcados por linhas perpendiculares).
A órbita de Marte no céu está representada pelos 12 setores no círculo - seis acima do horizonte e seis abaixo. A linha mais escura desenhada mostra a suposta maior incidência de nascimentos de campeões esportivos nos setores chave 1 e 4 da órbita de Marte.
Muitas pessoas, incluindo alguns cientistas, pensaram que Gauquelin havia provado os conceitos da astrologia: que a posição dos planetas no momento do nosso nascimento de fato tem um impacto em nossas vidas.
Para os matemáticos, no entanto, o resultado não era tão revolucionário. É estatística. Se você atira uma moeda para o ar, há 50% de possibilidades de que ela caia na face "cara" e 50% de que caia na face "coroa".
Se você está apostando com alguém e a moeda cai como "cara" 10 vezes seguidas, é natural que você suspeite que há algo errado com a moeda.
Mas agora imagine que você tem mil moedas: é provável que ao jogá-las para o alto dez vezes, uma sempre caia do mesmo lado. É um resultado natural da aleatoriedade.
MoedasDireito de imagemISTOCK
Image captionSe você atirar mil moedas para o ar é provável que uma delas sempre caia com a mesma face para cima: é o efeito da casualidade
Na opinião dos matemáticos, isto é o que aconteceu com o experimento de Gauquelin.
Ele incluiu tantas correlações diferentes - milhares e milhares de datas de nascimentos com dez planetas e 10 posições no céu - que estava destinado a encontrar alguns padrões hipotéticos.
Como ele não ajustou o número de combinações que fez para diminuir o efeito da aleatoriedade, seu resultado "favorável à astrologia" seria a mais pura casualidade.
Você acredita?

Bebê centro de polêmica que envolveu até o papa morre 5 dias após ter aparelhos desligados

Alfie EvansDireito de imagemALFIE'S ARMY/FACEBOOK
Image captionO bebê Alfie Evans, de 1 ano e 11 meses, morreu dias depois de o hospital desligar os aparelhos que o mantinham vivo
O bebê britânico Alfie Evans, de quase 1 ano e 11 meses, que tinha uma doença degenerativa incurável e se tornou alvo de uma batalha judicial no Reino Unido, morreu na madrugada deste sábado, 28, em Liverpool, cinco dias após os aparelhos que o mantinham vivo terem sido desligados.
"Meu gladiador abaixou seu escudo e ganhou asas...(estou) absolutamente com o coração arrasado", escreveu o pai de Alfie, Tom Evans, no Facebook.
Alfie estava internado no Hospital Infantil Alder Hey, em Liverpool, desde dezembro, e havia mais de um ano seu estado era semivegetativo.
O bebê era portador de uma doença degenerativa incurável, e a disputa entre a família e os médicos sobre como proceder em seu tratamento gerou uma grande comoção no Reino Unido.
Os pais do menino tentavam reverter uma decisão da Justiça que os impedia de levá-lo a um hospital ligado ao Vaticano, em Roma, na Itália, que havia oferecido tratamento ao bebê. A oferta do hospital foi feita após uma campanha dos pais de Alfie que mobilizou até mesmo o papa Francisco, que manifestou apoio à família Evans pelo Twitter.
A direção do Alder Hey impediu a remoção do paciente, dizendo que a continuidade do tratamento não seria "o melhor para Alfie". A instituição alegava que levar à frente o tratamento seria não só "inútil", mas também "desumano", já que Alfie apresentava uma "degradação muito grave de tecido cerebral".
O juiz Anthony Hayden, que cuidava do caso, decidiu então que os médicos podiam interromper o tratamento, contrariando a vontade dos pais. Na decisão, o juiz acrescentou que o bebê merecia "paz, calma e privacidade".
Tom Evans beija a mão do papaDireito de imagemTOM EVANS
Image captionPai de Alfie foi a Roma para fazer um apelo ao papa Francisco pessoalmente
Em 18 de abril, o pai de Alfie foi a Roma para se encontrar com o papa Francisco, fazendo um apelo para que ele "salvasse seu filho". O papa manifestou pelo Twitter seu apoio à família dizendo: "Renovo meu apelo para que ouçam o sofrimento destes pais e que atendam seu desejo de buscar novas formas de tratamento".
O Ministério das Relações Exteriores da Itália havia conferido ao bebê cidadania italiana, a fim de que ele pudesse ser "transferido imediatamente para o país". Mas a Corte britânica havia desconsiderou esse último recurso, dizendo que Alfie era "um cidadão britânico" e que estava "sob a jurisdição da Alta Corte".
O caso de Alfie colocou novamente em debate se os médicos, e não os pais, seriam as pessoas mais indicadas para determinar o desligamento dos aparelhos de suporte a vida para uma criança em estado terminal.
Uma lei britânica de 1989 sobre os direitos infantis, o Children's Act, determina que, se a criança corre risco de sofrer algum dano, o Estado pode e deve intervir. Isso significa que o direito dos pais não é absoluto e que o Estado pode agir quando acredita que o melhor para a criança não está sendo perseguido.
Se um órgão público discorda da opinião dos responsáveis, como é o caso do hospital de Alfie, que faz parte da rede pública de saúde do Reino Unido, o NHS, eles podem procurar um tribunal.

Como foi o desenrolar do caso

A primeira decisão do juiz Anthony Hayden, da Alta Corte em Liverpool, saiu em 20 de fevereiro, três dias antes da data marcada para que os aparelhos fossem desligados. Os pais de Alfie não desistiram e recorreram a uma instância superior, a Corte de Apelações, em 6 de março, onde juízes confirmaram a decisão anterior.
Em 20 de março, o casal fez apelação à Corte Europeia de Direitos Humanos, mas três juízes disseram não ver no caso nenhuma violação de direitos humanos.
Em 11 de abril, o juiz Hayden endossou um plano para o "fim da vida" de Alfie, estabelecendo uma data para o desligamento dos aparelhos.
Os advogados da família fizeram em 16 de abril uma última tentativa na Justiça de assumir o controle do tratamento, dizendo que o bebê estava sendo "detido ilegalmente". A Corte de Apelações e a Suprema Corte rejeitaram ambas o pedido.
Um novo pedido urgente de intervenção à Corte Europeia de Direitos Humanos na segunda-feira fracassou, o que gerou protestos em frente ao hospital.

O que era o Exército de Alfie?

Laço colocado em poste pelo Exército de AlfieDireito de imagemREUTERS
Image captionCampanha criada nas redes sociais organizou protestos em apoio à família
Ao longo de todo o caso, os pais de Alfie, Tom Evans e Kate James, receberam o apoio do Exército de Alfie, uma campanha promovida por meio de redes sociais e que reuniu com frequência manifestantes do lado de fora do hospital. Mas depois que funcionários disseram estar sendo alvo de "agressões verbais", a polícia passou a investigar se os protestos podiam ser interpretados como atos de intimidação.
Antes de Alfie receber cidadania italiana, manifestantes chegaram a tentar invadir a entrada do hospital. Policiais formaram então um cordão de isolamento. Os pais do bebê pediram desculpas, dizendo que não pretendiam causar "danos ou conflitos".